PAULO ALVES - CAPÍTULO FINAL

Paulo Alves 7

Um efeito surpresa do lado inimigo. Por essa ninguém esperava. Romildo apareceu na porta do banheiro externo apontando e disparando contra os homens de Paulo. Um deles é atingido no ombro e o outro de raspão no braço.

- Ele está armado. – alertou o alvejado no ombro.

Por mais que a essa altura a operação já possua dois policiais feridos, ainda assim as coisas estão sob controle e Alves sabe disso. Não é hora para desespero e sim de mostrar quem manda no pedaço. Ao ver seus companheiros abrigados atrás do murinho da área de serviço houve um certo alívio.

- Onde ele está? – gritou Paulo.

- Lá dentro. – indicou o ferido no braço.

Romildo disparou mais uma vez e sem sucesso. Aborrecido por estar encurralado dentro daquele metro quadrado mal cheiroso, o matador de mulheres verificou a munição e depois olhou pela fresta e viu Paulo agachado mirando nele.

- Saiam todos daqui. – berrou.

- Não precisa ser dessa forma. Entregue-se e tudo será resolvido. – Alves se abrigou.

- Está tentando me ludibriar? Eu sei que serei jogado no fundo de uma cela fedida.

- Qual o seu nome?

- E isso importa? Sempre andei por aí e ninguém nunca perguntou a minha origem, meu passado e agora que estamos um contra o outro queremos saber como nos chamamos. Muito engraçado isso.

- Eu me importo. Veja. – colocou a arma no chão e olhou para os colegas.

- Isso é burrice, detetive. – falou outro agente.

Sim. Claro que é burrice, mas Paulo preferiu arriscar. Ele deixou a pistola de lado e se levantou com os braços para o alto. Incrível como situações extremas nos leva a fazer coisas que jamais em condições normais faríamos. Negociar com o bandido. Paulo deu lugar ao negociador adormecido dentro dele.

- Viu? Saia de onde estar e vamos conversar. – nenhuma movimentação. - Sou o investigador Paulo Alves, tenho 26 anos e amo o que faço. Você ama o que faz?

- Amo! – falou atrás da porta. – está usando colete, detetive?

- Não. – levantou a blusa. – vou pedir para que meus homens saiam, assim podemos conversar mais a vontade, o que acha?

- Fica a seu critério, investigador. – só a voz é ouvida.

Paulo gesticulou e sem hesitação os policiais saíram. O medo triplicou, mas agora é um pouco tarde para se voltar atrás. Ainda com os braços erguidos, Alves viu um sujeito esquisito saindo do banheiro, um homem que poderia ser seu pai. Romildo ainda segurava seu trinta e oito. O medo quadruplicou.

- Sou Romildo Silva, muito prazer. O que vocês querem?

- Você atacou uma jovem.

Silva riu e abriu a boca mostrando a língua ferida.

- Não foi bem eu quem a atacou.

Paulo engoliu seco. Ele é perigoso, pensou.

- Mais alguma coisa? – arqueou uma sobrancelha.

- Jasmim Soares, você a conheceu?

Romildo pareceu abalado ao ouvir tal nome. Ele abaixou a arma e sua expressão se tornou amigável. Olhou para o céu e em seguida para Paulo.

- Abaixe os braços, detetive, vamos conversar feito gente. – sua voz agora estava suave, mansa. – quer mesmo saber onde está Jasmim? Venha, ela está lá no quarto.

Agora o coração de Paulo se transformou numa britadeira. Na mesma hora ele viu que Romildo não se encontra com suas faculdades mentais em perfeito estado. Um homem louco é uma bomba relógio.

- Me acompanhe, por favor.

Caminhar lado a lado com alguém que a segundos atrás queria enfiar uma bala na sua cabeça parece ser coisa de outro mundo. Mais alto, mais forte e mais velho, Romildo anda em silêncio e não esboça qualquer gesto, qualquer menção de que vá atacar o policial a seu lado. Paulo por sua vez se mantém em alerta, Silva pode estar desarmado, mas ainda assim é uma ameaça. Sem contar que o agente não sabe para onde Romildo o está levando. Uma armadilha, ou simplesmente ele decidiu falar a verdade e se entregar? Paulo tomou uma decisão e ele precisa banca-la até o final.

O cheiro de carne apodrecida piorou assim que ambos chegaram perto da porta. Paulo Alves olhou para Romildo hesitante em deixar com que o policial faça seu trabalho.

- Esse é o quartinho aonde guardo todo o meu material e...

- E? – tocou na fechadura.

Romildo colocou sua mão em cima da mão do investigador. Paulo gelou até os ossos.

- Perdoe-me.

Romildo Silva abriu a porta e o ar pesado nocauteou o policial. Paulo sentiu seu estômago torcer e retorcer. Ele deu um passo curto para dentro do quarto e viu um show de carnificina, um tipo de açougue de carne humana. O inferno na terra. Romildo permaneceu parado na porta, com a cabeça baixa, parecia chorar em silêncio. Alves andou um pouco mais e viu um corpo, em decomposição em sua primeira fase. O corpo de uma mulher, nua. Jasmim?

- Essa é a Jasmim. – balbuciou Romildo. – e aquela outra é...

- A Ruiva. – emendou Alves.

- Augusta, esse era o nome dela. Me deu muito trabalho, me xingou, me humilhou, por isso resolvi mata-la. Eu a havia escolhido para ser a minha boneca principal, a senhora das meninas inanimadas, mas aí...

- Por que a decapitou? Por que deixou sua cabeça em qualquer canto?

- Augusta, como falei, me humilhou demais, me chamou de louco, desequilibrado e isso eu não admito.

- Mas, mas, você é louco. Veja isso. – abriu os braços.

A expressão de Romildo mudou do gatinho manso doméstico para o leão furioso.

- Do que me chamou? – fechou os punhos.

- Augusta estava certa, você é um louco, um desequilibrado. Precisa de ajuda psiquiátrica urgente.

- Eu estou contribuindo com o seu trabalho e é assim que você me retribui?

Paulo se preparou para o confronto. Será um Davi contra Golias dentro de um cenário sombrio. Algo possuiu Romildo, isso fica evidenciado em cada gesto, no olhar e na forma de falar. De repente ele voltou a ser aquele garoto violento e sem limites, destruidor de brinquedos. Com os braços estendidos ele partiu pra cima do policial rangendo os dentes.

- Fora daqui.

Paulo se esquivou e Romildo passou. Por mais que Silva seja um homem grande, isso não o impede de ser rápido. Sem esperar Alves foi atingido por um soco que o deixou desequilibrado. Outro forte golpe, dessa vez no peito tirando todo o ar o agente.

- Estou adorando brincar de boneco. Bem que meu me disse.

Um potente cruzado e Paulo caiu sobre uma pequena mesa.

- Vamos lá detetive, mostre do que é capaz. – outro soco e Alves desabou.

Mesmo tonto, sangrando e sentindo os fortes golpes, Paulo resolveu entrar de vez na briga. Se levantou, ergueu a guarda, posicionou a perna de apoio e foi para o combate. Silva se preparava para desferir mais um cruzado quando foi surpreendido por um gancho e depois um cruzado de esquerda.

- Nojento. – gritou dando vários socos aleatórios, todos sem direção certa.

Aproveitando o descontrole de seu oponente, Paulo o deixou sem ação socando seu nariz. Romildo grunhiu segurando o nariz quebrado. Alves o chutou na barriga. Tropeçando nas próprias pernas o louco caiu chorando.

- Não me bata mais, chega, chega. – se encolheu.

*

Mais do que pagar pelos seus crimes, Romildo Silva precisa ser tratado, exorcizado ou sei lá o que, essa foi o pensamento de Paulo ao sair daquela casa com o mesmo algemado. Ele já não oferece risco ou ameaça, apenas chora e diz palavra desconexas. Assim que foi colocado dentro da viatura os agentes comemoraram e rasgaram em elogios o detetive novato da corporação. A surpresa maior foi a chegada do chefe Damião Ramos acompanhado de outros oficiais. Ramos desceu da viatura e caminhou abotoando o paletó até Alves.

- Você está bem? – disse olhando os ferimentos no rosto do investidor.

- Sim, chefe, estou bem, um pouco dolorido, mas pronto para outra.

- Que situação complicada. Quer dizer que ele mantinha os corpos lá dentro, apodrecidos?

- Exatamente, senhor, o cara é louco de pedra. Por isso não encontrávamos o restante do corpo da ruiva, ele estava o tempo todo aqui. A Jasmim o mesmo caso. Um filme de terror na vida real.

Damião olhou para Romildo dentro do carro policial.

- Parabéns, Paulo, por tirar de circulação esse monstro. Agora chega de festa. Essa cidade está infestada de pessoas com ele, piores inclusive. Conto com vocês para protegermos os civis.

*

Matéria lançada no Cidade News escrita pela magnífica Janaína Lopes. Paulo terminou de lê-la em seu tablet e beijou sua namorada. Ambos estão na cama, cobertos apenas por um fino lençol.

- Caso encerrado? – disse ela.

- Esse.

- Romildo Silva. Esse sujeito tem um histórico tenebroso. Imagina, mulheres bonecas, onde já se viu?

- Ele ficará internado no hospício e depois encaminhado para o presídio. Trinta anos fará bem a ele. – brincou.

- Por falar em fazer bem. E a Mara? – o beijou no peito.

- O que tem a Mara?

- Ela te fazia bem? – outro beijo, agora na barriga.

- Depende do que. – riu.

- Por exemplo. – se cobriu com o lençol ficando entre as pernas do policial. – ela te deixava em pé depois da segunda trepada?

- Ah, isso ela nunca fez. Oh!

Fim.

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Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 07/08/2020
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