O ASSASSINO PIRAMIDAL

Um amigo meu disse que se visitasse aquela cidade teria de fazer aquela rota. Então, foi a conselho dele que paguei para entrar no museu e visitar a antiga casa e antigos percursos de um assassino em série. Garanto que não fazia a mais remota ideia do que se tratava. A única coisa que o meu tal amigo me tinha dito é que eu acharia o cenário interessante. Talvez ele tenha dito aquilo porque sabia que gostava de ler sobre assassinos em série, eu próprio aceitei apenas por esse motivo, porém, quando cheguei ao local senti que aquilo era mais bizarro do que alguma vez poderia prever.

O assassino que estamos a falar era muito famoso naquela localidade, pois tinha sido o único naquela região. Ele ficou conhecido por, há vinte anos atrás, ter morto dezenas de pessoas; porém desengane-se quem acha que foram apenas assassinatos. Antes de ir àquele museu já tinha lido sobre aquele homem, mas muito por alto, talvez visto um ou dois vídeos que resumiam o passado criminal do sujeito, mas foi apenas quando cheguei ao local que passei a conhecer totalmente a história.

Estamos a falar de um assassino que se estima ter matado cinquenta e nove pessoas, todas elas de uma forma peculiar, todas elas mortas de uma forma cruel e brutal: seja por machado, martelo ou catana. Mas o atrativo daquela exposição onde estava não se limitava às mortes em si. Além de mostrarem todas as caras das vítimas, também houve um teatro que reconstituia a cena de homicídio. Fiquei um tanto chocado com aquilo, mas segui em frente na excursão. Seguidamente fui levado para um corredor estreito com uma maca no meio, o nosso guia disse-nos que a maca era representativa do que acontecia a seguir aos corpos estarem mortos. O assassino em série e psicopata a seguir a matar as pessoas, fazia trabalhos profanos com os cadáveres. Ele retirava cada órgão maior como por exemplo, fígado, pâncreas e coração, e utilizava-os para comer ou então para personalizar o ambiente. O guia também referiu que quando as instalações criminosas foram encontradas pela polícia, estavam cobertas de tecido de órgãos expandidos por todas as paredes e teto.

Um pouco mais á frente, a meio do tour, estava uma loja de conveniência, onde se podia comprar desde canecas a camisolas com a cara do psicopata estampada em cada lembrança. Era uma fotografia tirada há vinte anos aquando a sua detenção; era uma figura bem aparecida, loiro com caracóis, olhos azuis e algumas sardas na face. Face essa que agora alguém usava para lucrar. Aquilo era sinistro, e o mais bizarro era o grupo de fãs que estava presente naquele local e que estava a fazer a visita guiada juntamente comigo. Parecia que estavam na Disney. Falei estupefato com algumas delas com o intuito de perceber o porquê daquele fascínio por um individuo que cometeu tantas crueldades. Apenas haviam mulheres no grupo em que estava.

Eu: Porquê apoiam tanto esta pessoa assassina?

Uma delas: Nós não o vemos como um assassino. Claro que sabemos que o que ele fez é errado, mas ele é apenas o fruto da sociedade onde cresceu.

Outra delas: Pois é… ele precisava de atenção, amor e carinho…

Eu: Estou a tentar perceber a vossa posição mas confesso que é difícil. Não consigo parar de pensar nas famílias que foram prejudicadas…

Uma delas: Lá está, talvez as vítimas dele não quisessem acarinha-lo e amá-lo como ele devia.

Outra delas: Tinhas de o conhecer como nós o conhecemos, ele não é nenhum monstro como todos o retratavam, ele só queria atenção…

Eu: Ah! Mas, vocês conviveram com ele? Vocês parecem muito novas para que isso tenha acontecido…

Outra delas: Nós lemos, analisámos e estamos convencidas que ele não é nenhum demónio como a impressa o apelidou. Estamos ansiosas que ele saia da prisão!

Não disse mais nada àquele bando de miúdas vestidas a rigor como se fossem um clube de fãs daquele psicopata. Continuei a ouvi-las falar e percebi que sabiam tudo sobre ele; desde o que fez em cada ano, as vítimas, como as matou até ao pormenor que ele nunca tinha conseguido alcançar o seu sonho das sessenta vítimas. Parecia uma seita ou um culto ao homem. Foi algo extremamente estranho. Elas veneravam aquele sujeito como se tivesse salvo as famílias delas ou fosse vítima de uma conspiração…. Estamos a falar de um psicopata que matou centenas de pessoas, certo? Estarei louco ou tenho a razão neste aspeto? Nada disto para mim era normal, mas para esta gente tudo aquilo era normal. O mundo é mesmo muito estranho…

A próxima fase da visita foi na rua, onde começámos a reviver como é que ele atraía as pessoas e as levava até à sua casa. Fiquei surpreendido por perceber que o percurso ainda era longo, fiquei a pensar como é que nunca ninguém tinha notado nada de estranho. Enquanto ouvia sobre as ações macabras que o psicopata fazia às suas vítimas, vejo claro e distinto, o rosto daquele homem atrás de uma árvore perto a uma casa abandonada. Naquele momento tive um calafrio e a minha tensão baixou. Comecei a sentir-me muito mal. Caí para trás e aterrei na relva. Algumas pessoas do grupo vieram auxiliar-me enquanto eu estava a mentalizar-me que era apenas uma ilusão. Eu tinha sido diagnosticado com delírio persecutório, ou seja, em palavras correntes: tinha mania da perseguição, por isso comecei a pensar que aquilo era apenas mais uma falha na minha perceção e da minha mente. Nem ousei a comentar àquelas pessoas que tinha visto o rosto do homem ali. Aleguei que tinha sido apenas uma quebra de tensão e que já estava bem. Eis que uma das raparigas presentes no grupo disse num tom macio e sonolento:

- A história dele é tão profunda que deixa qualquer um com a tensão baixa.

Limitei-me a olhar no rosto daquela mulher louca e a pensar para mim “serei eu o louco?”. Enfim, continuámos o tour. Mais à frente o guia explicou aquilo que eu ouvira antes no grupo das miúdas: o psicopata estava a fazer uma árvore piramidal com os crânios das vítimas, mas nunca tinha acabado porque tinha faltado uma vítima que encaixaria no seu topo. Foi então, ao ouvir essa explicação, que aparece de novo aquele homem, desta vez o seu corpo apareceu e ele segurava um martelo na mão. Apesar ser fim de tarde com o por-do-sol à vista, aquela pessoa era tão nítida como o sol do meio dia! Eram visíveis os cabelos loiros encaracolados, os olhos azuis e as sardas. Automaticamente fechei os olhos e tentei convencer-me repetidas vezes que ele estava na prisão e que a pessoa que via tinha o mesmo aspeto que há vinte anos atrás, por isso, era uma miragem, ele teria de ter envelhecido! Estava a tentar pensar racionalmente. Eu sei que nisto sou louco e vejo coisas, eu sei disso… mas estava a entrar em paranoia, o meu medo ultrapassava o normativo. Eu sabia que teria de ter de ir até àquela árvore para mostrar aos meus olhos que não havia nada lá; assim, provaria à minha mente que era apenas uma mania. Então, abrandei um pouco o meu passo, e quando estava a uns metros de distância do grupo, desviei a rota e caminhei até àquela árvore.

Na caminhada até lá o meu coração batia como as pernas de um tigre correndo. Estava nervoso e suava por todos os poros corporais. Ao chegar mais perto, inspirei pela última vez, fechei os olhos e andei mais dois passos, depois abri os olhos e olhei – nada, o vazio. Nenhum vestígio humano, nenhuma pegada humana nem nenhum cheiro característico. Sorri ligeiramente, respirei de alívio e voltei-me para trás para voltar junto ao meu grupo. Foi nesse exato momento que o psicopata aparece nitidamente à minha frente, era ele! O verdadeiro! Não podia estar errado! Ele tinha fugido da prisão e agora estava ali! A minha cara virou pavor e antes que pudesse gritar por ajuda ele bateu-me com o martelo no crânio. E foi dessa maneira que eu fui a sexagésima vítima dele. Assim, graças ao meu crânio ele pôde completar a sua árvore piramidal!

** Este foi o relato transcrito do diário que o psicopata escrevia na cela da prisão; pelos vistos até hoje fantasia com a sua obra inacabada.

Fim

Lord Jáo
Enviado por Lord Jáo em 20/07/2020
Reeditado em 21/07/2020
Código do texto: T7011100
Classificação de conteúdo: seguro
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