Libertaria - Capítulo 01

A multidão aplaudia animada de pé, vendo o homem que vos falava estender a mão vigorosamente, abrindo um sorriso largo, com olhos brilhantes e espírito altivo, quando de repente, esse mesmo homem, em menos de um segundo, transformou-se em um boneco de carne e despencou da própria altura, enquanto seus cabelos se desgrenhavam e gotículas vermelhas voavam pelo ar. Vários homens de paletós e óculos escuros surgiram das frestas do palanque para segurá-lo. Eles sacavam de dentro dos smokes pistolas com canos longos. Um dos homens tocou, com a mão coberta por sua luva preta, a nuca do homem, e mostrou uma luva encharcada de vermelho. Outro agente tentava aferir o pulso do homem caído, e após cerca de meio minuto, fez um sinal negativo; os demais cercavam o homem em posição de guarda com as miras apontadas para um inimigo invisível. Um furo pequeno na testa do homem começou a jorrar sangue e ensopar a madeira do palanque, sendo levado pelas pegadas dos agentes junto com pedacinhos de ossos cranianos e massa encefálica. O público corria desesperado aos atropelos, pulando as cadeiras como cavalos de hipismo, desesperados para fugir de um predador implacável e invisível. Alguns corriam sem saber o motivo, e perguntavam aos gritos, enquanto outros respondiam. Pessoas acabavam caindo em meio à confusão e servindo de tapete para a fuga dos demais. Os policiais tentavam coordenar em vão o pânico, mas havia muitas pessoas machucadas pelo chão para prestar auxílio.

Em outro lugar, dentro de um quarto, um telefone tocava em cima do criado-mudo, atrapalhando o sono de um homem que ainda dormia em sua cama. Abriu os olhos após um longo bocejo e criou coragem para rolar na cama e pegar o aparelho que vibrava, fazendo um zumbido contra o móvel de madeira. Puxou o celular e viu que era uma ligação importante. Foi como se o homem tivesse acabado de cair em um tanque de água fria. Despertou como num salto e rapidamente atendeu.

- Bom dia, senhor Diretor Geral. – respondeu o homem sonolento.

- Bom dia! Precisamos de você urgente aqui!

- Eu estava de plantão ontem, senhor. A Jane está hoje.

- Olhe os jornais! – dizia a voz firme e idosa.

- Qual deles?

- Qualquer um. Está em todos eles. Não tenho tempo para esperar. Apenas venha! – e desligou.

Bruce Campbell correu descalço para a sala e ligou a televisão. Eram nove da manhã e o mundo inteiro parou para acompanhar o repentino atentado que tirou a vida do presidente dos Estados Unidos da América. Diversas filmagens de aparelhos celulares presentes no momento eram publicadas na internet e todos eram incapazes de responder: quem está por trás da morte do presidente Warren Johnson?

Bruce ficou boquiaberto e afundou o polegar no volume da televisão. Correu de volta para o seu quarto e jogou uma água no rosto. Correu para o guarda-roupa e puxou um terno para vestir enquanto acompanhava as notícias.

Pelo áudio da TV podia ouvir diversos chefes de estado se pronunciarem, lamentando a morte trágica do presidente e prometendo colaborar com as investigações, para que os responsáveis por esse atentado fossem trazidos à justiça.

Desceu até a garagem pelas escadas e se enfiou no carro. Saiu cantando pneu e deixando um cheiro de borracha queimada no ar e um rastro de pneu no calçamento. Parou em um café que havia perto de sua casa e gritou para uma moça que estava atendendo.

- Pode fazer para mim o de sempre? Já estou indo buscar. É que estou com um pouco de pressa.

A moça fez menção positiva com a cabeça e entrou.

Ao descer do carro viu nos televisores do café a mesma notícia. Todos assistiam com os olhos vitrificados, torcendo para ser alguma piada, mas era real, estava em todos os canais.

- Não se trata apenas de um atentado contra a vida de um homem, mas contra a soberania de uma nação, a nação mais importante do mundo! – foi dito pelo Vice-presidente dos Estados Unidos em transmissão – Nosso serviço de inteligência está totalmente empenhado e vamos descobrir em breve quem são os terroristas responsáveis pela morte do presidente.

As pessoas falavam e faziam as mais diversas suposições sobre o caso, mas sempre acabava no mesmo ponto, fazendo associações com o onze de setembro.

- Só pode ter sido o ISIS. Com certeza foram terroristas. – Diziam.

Por alguns instantes a transmissão começava a falhar e a tela ficou transmitindo estática.

- Ei! Algum funcionário pode mudar de canal? – gritava alguém.

Os canais foram sendo mudados, mas a imagem era a mesma.

- Caramba, tanta hora para essa televisão quebrar! – dizia outro.

- A televisão de dentro também está ruim. – Dizia outra pessoa.

Bruce olhou para todas as outras lojas e elas também estavam transmitindo estática. O que está acontecendo hoje? Pensava Bruce prendendo a respiração sem perceber.

Uma imagem de um quarto velho, pouco mobiliado com uma cortina encardida atrás cobrindo uma janela, surgia na tela. Uma imagem estranha, como daqueles vídeos da deepweb. Surgia uma poltrona suntuosa e com alguns sinais de uso e rasgos. Essa imagem se manteve por alguns segundo, as pessoas assistiam apavoradas com o mistério daquela cena, mas ao mesmo tempo eram incapazes de desviar o olhar, se perguntando por que motivo todas as emissoras transmitiam a mesma cena esquisita.

De repente um homem bem vestido, trajando terno totalmente preto, surge do lado direito da tela e senta-se na frente da câmera.

- Saudações, pessoas de todo mundo! – dizia uma voz macia.

O homem falava por trás de um pano branquíssimo que lhe cobria o rosto, semelhante a uma meia-calça, mas que não mostrava nenhum detalhe por trás do pano, apenas a noção da anatomia de uma face humana. O homem parecia um manequim de loja de roupas. Até mesmo suas mãos estavam enluvadas com o mesmo tecido branco.

– Como todos vocês sabem, o presidente Warren Johnson foi morto nessa manhã. Estamos a mais de uma década se preparando para esse momento, que vai mudar completamente os governos do mundo todo. Nossos governos cada vez mais estão controlando nossas vidas e nos vigiando constantemente. Nossos governos nos tratam como peças de xadrez para os seus interesses obscuros, institucionalizando a injustiça e a supressão das liberdades individuais. Estamos aqui para virar o tabuleiro, para lutar contra o imperialismo. – O homem dava pequenos socos no ar enquanto se ajeitava na cadeira, como se estivesse eufórico. – O sistema capitalista irá cair em breve! Eu sou o Porta-Voz, e nós somos, a Libertaria! – O homem estendeu a palma da mão esquerda com os dedos voltados para cima e a transmissão foi substituída por estática novamente. Uma sequência de números surgiu na tela:

10.214.51.90

Bruce percebeu algumas pessoas filmando com seus celulares a transmissão e puxou o seu também, fotografando a sequência. Tirou a foto e após salvar, voltou novamente os olhos para a televisão e ela estava normal.

Mas que porra que está acontecendo hoje?

As pessoas conversavam mais assombradas ainda. Podia ver em seus olhos expressões de desespero, falando e gritando desesperadas ao mesmo tempo. Bruce foi embora sem o café arrancando o carro mais rápido ainda.

- Quem era aquele homem?

- Será se é o ISIS de novo?

- O que eram aqueles números?

Muitos questionamentos, mas nenhuma resposta.

No local aonde o presidente foi alvejado, diversos órgãos de segurança se faziam presentes, retirando todas as pessoas civis da área. Bruce colhia informações com os policiais a respeito do caso, e lhe deu algumas ordens antes que esses saíssem. Ouviu o som de um helicóptero pousando no local e se apressou para ver: era o Diretor Geral de Segurança.

- Quem está sendo responsável pela investigação?

- Nesse momento sou eu, senhor. Bruce Campbell, investigador sênior, Departamento de Ciência e Tecnologia da CIA.

- Foi para você mesmo quem liguei pela manhã. Achei que estava de serviço hoje. De qualquer forma, precisamos de todos os homens aqui, e de todos você é o mais experiente da casa branca com terrorismo. O que já temos até agora?

- Senhor Diretor Geral, os legistas acabaram de nos enviar um relatório suscinto do projétil que atingiu o crânio do presidente. – Mostrou a ele um tablet com o modelo da arma e textos técnicos – Pelo formato do ferimento e outros vestígios encontrados, trata-se do rifle de precisão McMillan TAC-50, uma arma canadense. Os peritos em balísticas participaram da necrópsia do corpo do presidente. Eles afirmaram que, pela curvatura, o tiro partiu de uma distância de sete a dez quilômetros.

O Diretor Geral olhou incrédulo para o chefe como se ele estivesse delirando.

- Não existe nenhum sniper capaz de atingir um alvo tão distante com essa precisão, ainda mais utilizando essa arma!

- Sim senhor, mas todos os peritos que participaram da análise concordaram com esse parecer.

- Meu filho, eu servi meu país como fuzileiro naval antes de se tornar Diretor Geral de segurança. Até hoje o tiro mais longo que um sniper conseguiu abater um alvo foi de 3.540 metros em 2017 por um atirador das forças especiais do Canadá no Iraque, utilizando exatamente a mesma arma que você acabou de me descrever. Está me dizendo que um terrorista conseguiu um tiro perfeito com uma distância duas ou três vezes maior que o recorde mundial?

Bruce sabia que os terroristas eram bastante engenhosos, mas não dava para discutir com um homem antiquado e bitolado às próprias técnicas. Sendo assim, ficou sem saber o que dizer, mas prosseguiu.

- Senhor, não sou eu que estou dizendo isso, são os peritos e legistas. Sei que parece absurdo, mas eles foram bastante enfáticos em relação a isso.

- Diga para continuarem verificando.

- Já estão fazendo isso. Disseram que precisam de outros elementos para confirmar os detalhes do disparo.

- E o que está sendo feito para isso?

- Temos equipes buscando pelo projetil em solo e outras se dividindo pelos prédios de onde provavelmente partiu o disparo. – Apontou para uma parte onde eram possíveis ver dezenas de prédios.

- Vai ser como procurar uma agulha no palheiro. Um disparo tão longo abre um leque muito grande de possibilidades.

- Todo pessoal de folga já foi acionado para intensificar as buscas.

- Ótimo. Precisamos ser rápidos. Eles conseguiram matar um presidente de uma distância gigantesca, possuem acesso a armas de grosso calibre e conseguiram invadir todas as emissoras do mundo por um minuto. Não sabemos de quem se trata as pessoas que estão por trás desse atentado, nem o que pretendem fazer, mas com certeza não são amadores. Temos que ter bastante cuidado.

Algumas horas, a mídia americana noticiou mais tarde uma fala controversa do aiatolá do Irã, que durante um evento, comentou de forma indireta que a mão de Alá pesou sobre o que ele chamou que maior liderança dos infiéis do mundo, e que somente Alá poderia salvar a humanidade. A mídia mundial usou aquilo ao máximo e a opinião pública começou a questionar o envolvimento do Irã no atentado junto com o ISIS. A Casa Branca, na pessoa do Vice-Presidente, exigiu imediatamente uma retratação do aiatolá Armin Mazandarani, que nos últimos anos, teve alguns desentendimentos diplomáticos em razão do programa nuclear iraniano.

Armin não quis comentar o caso, no entanto o presidente da Rússia alegou que estavam transformando o Irã em um espantalho, que o comentário do aiatolá não era suficiente para incriminá-lo de algo tão grave, e que a mídia internacional agia de forma irresponsável e aproveitadora num momento tão crítico.

O telefone toca e Bruce atende.

- Oi Bruce, como está ai?

- Oi amor. Está uma loucura aqui. Pelo visto serão longos dias longe de casa.

- Você viu aquele homem na televisão? Sabe quem são essas pessoas?

- Até agora ninguém é capaz de afirmar nada, meu amor, nem mesmo quem são.

- Isso parece coisa do Estado Islâmico. Os jornais têm razão, o Irã tem algum envolvimento nisso com certeza.

Outra ligação apareceu no telefone de Bruce. Era o investigador encarregado das buscas nos prédios, o investigador Jeremy Stone.

- Amor, estão me ligando aqui.

- Tudo bem. Assim que tiver um tempo me liga.

Mudou para a chamada do colega.

- Fala Jeremy.

- Senhor Campbell, já está no local do evento?

- Sim, já tem alguns minutos.

- O senhor tem que vir aqui rápido no prédio Blue Tower. Achamos a arma.

- Vocês viram a sequência que apareceu no final do vídeo?

- Sim senhor, nossos hackers já estão investigando.

Bruce deu um salto e um soco no ar de comemoração.

- Boa, Jeremy! O Diretor Geral já está sabendo disso?

- Na verdade a peça foi encontrada nesse momento. Isso aqui é uma obra de arte incrível. Você vai ficar impressionado.

- Está bem, já estou indo.

Deslocou para o prédio, um hotel de luxo famoso por seus vidros azuis que se destacavam na paisagem. Todos os arredores estavam fechados com fitas zebradas e carros estacionados da polícia. As ruas estavam com bloqueios. Aproximou-se do policial que controlava entrada e saída e apresentou suas credenciais.

- Bruce Campbell, investigador sênior da CIA – mostrou sua carteira com identificação. – Foi nesse prédio que foi encontrada a arma?

- Sim, senhor Campbell. Eles estão no décimo segundo andar.

- Tudo bem, obrigado!

Desceram do carro e começaram a subir.

Bruce encontrou com uma colega do seu departamento, Jane.

- Esse prédio se não me engano, possui vinte e dois andares – comentou Jane.

- É isso mesmo, mas Jeremy me disse que a arma foi encontrada no decimo segundo. Escolheram um prédio não muito alto e nem utilizaram a cobertura para fazer o disparo.

- Essa arma pode ser só um disfarce também.

- Tipo, colocaram ela lá só para gente se ocupar e perder tempo?

Discutiam enquanto subiam o elevador. Quando a porta abriu no andar certo, Jeremy estava na porta com os olhos brilhando.

- Senhor Campbell, senhora Jane. Vamos? Vocês vão ficar impressionados com o que encontramos.

O que encontraram no local foi um rifle modificado e ligado a um computador com reguladores de angulação, dentro do forro de uma das salas do decimo segundo andar, onde funcionava uma academia de musculação para hóspedes. O forro estava quebrado e Bruce pode ver que havia também um silenciador na arma. Os flashes das máquinas fotográficas clareavam o local a cada segundo.

- Dê uma olhada pela janela, senhor. Acima.

Bruce obedeceu e pode ver que a parte de cima da janela alinhada com o cano e viu que tinha uma parte retangular cortada do vidro, para liberar a visão para o tiro.

- É tipo um alçapão no vidro. Esse negócio foi preparado a bastante tempo. A abertura no vidro tem uma articulação pra parte que falta retornar pro lugar como se nada tivesse acontecido.

- Isso explica por que ninguém ouviu o disparo. Um silenciador num ambiente barulhento. – observou Jane.

- E por que tem esse monte de colchões velhos ali no canto? – apontou para uma pilha de quatro colchões velhos que estavam no canto atrás da porta.

- Estavam cobrindo a arma. Imagino que seja para abafar o som.

Bruce chegou próximo e viu que os colchões pareciam querer se dobrar à posição em que estavam.

- Faz tempo que essa arma está aqui. Os colchões estão finos, velhos e deformados. Tente apurar mais ou menos quanto tempo esses colchões estavam aí, Jeremy.

- Sim senhor.

Ouviu um som agudo vindo dos colchões. Aproximou-se vagarosamente e virou um dos colchões com a ponta do sapato. Quando virou, viu alguns ratinhos novos, ainda com os olhos pregados e sem pelos.

- Está com medo de um ratinho, Bruce? – riu Jane.

- Poderia ser uma bomba.

Fez-se uma pausa.

- Qual a distância daqui para a local aonde o presidente estava?

- 9,4 quilômetros em linha terra, senhor. – disse Jeremy. – E essa arma sofreu algumas modificações na câmara de explosão, e pela cápsula encontrada, até mesmo a munição foi modificada. Isso explica o alcance tão estendido.

- Então por esses controladores de eixo de cano, supomos que o tiro foi disparado remotamente.

- Sim senhor.

- Então não foi um tiro comum, teve a ajudinha de um computador. Não foi um disparo limpo.

- Isso.

- Pelo menos isso o Diretor Geral de segurança vai gostar de saber.

- Vamos desparafusar o equipamento da laje e levar para o laboratório de balística.

- Senhores, encontramos mais uma coisa – disse um dos agentes interrompendo.

Todos foram para uma parede no lado oposto do cômodo o agente apontou um equipamento portátil de raios-x.

- Por essa parede passa um cabo de dados que se conecta ao computador do rifle. – disse passando o equipamento na parede e revelando o fio dentro da parede.

Dentro de um hangar com resto de aviões e coisas cobertas por lençóis amarelados, havia uma roda no meio, feita por algumas cadeiras de metal dobráveis. Pelas vidraças quebradas a luz passava empoeirada e insuficiente para iluminar totalmente o ambiente, que o deixava sinistro. As cadeiras foram preenchidas por vários homens com as mesmas vestimentas do porta-voz que interceptou todas as transmissões.

- Olá, senhores. Gostaria de agradecer a todos que se dispuseram a se sacrificar pela causa. Conseguimos dar o primeiro passo com êxito. – Dizia um boneco alto sentado com as pernas cruzadas.

Todos começaram a bater palmas abafadas pelas luvas de panos que todos usavam, ecoando um som mais grave que aplausos normais, no entanto as faces por baixo dos panos, permaneciam inexpressivas.

- Porta-voz, alguns hackers conseguiram entrar em contato conosco.

- Foram rápidos. De quais países?

- Russia, Coreia do Norte, China, Índia, Japão e Brasil.

- Que interessante... Vamos fazer a seleção de recrutamento. Vamos precisar de um exército

- No caso da Coreia do Norte, recebemos uma mensagem que eles dizem ser do próprio Líder Supremo deles.

- Sério? E que mensagem seria essa?

- Diz assim. – puxou um celular de dentro do terno e leu em voz alta. – “O grande líder supremo da República Popular Democrática da Coreia saúda a Libertaria por seu grande feito em prol da destruição do nosso grande inimigo, os Estados Unidos da América. Estamos dispostos a colaborar com sua nobre causa e na destruição do capitalismo no mundo. Conte conosco nessa luta!”

Os homens fizeram uma curta pausa e riram.

O Porta-voz acenou com os braços educadamente para que todos lhe dessem atenção.

- Certo, certo, certo... – as palmas foram cessando – Já que estão sendo tão generosos, por que iríamos recusar? Verifique de que tipo de ajuda eles estão falando, Corisco.

- Sim, senhor. – disse o rapaz que leu a mensagem. – Irei respondê-los.

- Quando será o segundo passo, Porta-voz?

- Em breve. Apenas vamos dar um tempo para as pessoas digerirem os fatos, mas não o suficiente para passar o susto. Vamos ficar monitorando as mídias e ver qual a reação das pessoas.

- Existem algumas hashtags em alta com relação a nós.

- Isso é bom. Pode citar algumas?

- Estamos em primeiro: #Libertaria, em segundo #RIPresident, em terceiro #Thankslibertaria, e assim mais algumas.

- Parece que estamos indo bem. Nossa imagem não está sendo menos negativa do que imaginei.

- Devemos agradecer ao senhor Warren Johnson por ter facilitado nosso trabalho com sua impopularidade.

- É, os políticos são mesmo bons nisso. Vamos ver como os demais chefes de estado irão se comportar.

No laboratório de balística da CIA, Bruce acompanhava o relatório de Clark sobre a arma. A peça estava sobre um balcão de concreto com diversos componente desmontados e alinhados.

- Foram feitas diversas modificações na arma e nas balas, Sr. Campbell. Mas a arma realmente é dos anos 80. Seus componentes novos foram remodelados artesanalmente, não foi uma coisa industrial. Não existe nenhuma arma no mundo igual a essa. Isso foi trabalho de um verdadeiro artista.

- Os papiloscopistas conseguiram alguma digital? Algum rastro de DNA?

- Nada, senhor. A arma está limpa. A única coisa incomum que foi encontrado foram alguns fios microscópicos de tecido presos em algumas partes da arma.

- Pode ser do colchão que estava envolvendo a arma no forro do prédio.

- Na verdade já analisamos e os fios dos colchões não batem com os fios pretos que encontramos. É um tecido bem fino e denso, parece um pouco com velame.

- Tecido de paraquedas?

- Quase, eu diria que se trata de um velame poroso.

- Senhor – chegava Jeremy com seu tablet preto novamente – Foi feita análise do cabo que estava conectado ao controlador do rifle. Parece que ele estava ligado a uma antena no lado externo, porem essa antena não foi encontrada, apenas um conector solto no lado de fora do prédio.

- Então a antena estava do lado oposto do prédio.

- Achamos que sim. Pois o local está limpo. Só detectamos indícios de que havia uma ventosa pregada no vidro próximo do cabo de dados.

- Ei, ei, ei! Vocês não viram a última? - Entrou Jane batendo uma regra em uma mesa de metal e pegando o controle da TV.

- Estamos ocupados, depois.

- Ah, acho que você vai querer ver isso sim.

Ligou a televisão e passavam cenas de uma mesquita rodeada de mulçumanos e um bloqueio policial que impedia as pessoas de entrarem. Uma urna funerária saia do local enquanto a apresentadora do jornal contava os detalhes.

- O aiatolá do Irã acaba de ter um mal súbito enquanto participava de um culto numa mesquita. No entanto a morte foi, segundo a mídia local, mencionada como tão rápida quanto um piscar de olhos. O corpo do aiatolá está sendo levado para a perícia, e até o momento tudo indica que se trata de um envenenamento.

- Puta que pariu, Jane... – dizia Bruce boquiaberto – O corpo do nosso presidente nem esfriou e já morreu outro.

- Pode ser só coincidência, mas devido a conjuntura atual, duvido muito.

- Conseguiram decifrar aquele código?

- Ainda não, mas tudo indica que se trata de um endereço eletrônico mesmo, provavelmente da deep web.

- Continuem tentando. Alguém no mundo já conseguiu descobrir como eles interceptaram todas as telecomunicações do mundo?

- Até agora continua um mistério. Mas com certeza a transmissão não foi feita do nosso território. Agora fora de nossas fronteiras devemos aguardar que os outros governos estejam também investigando.

- Esses desgraçados vão entrar em contato algum momento. A morte do aiatolá vai deixar os xiitas do mundo todo furiosos.

- De uma coisa sabemos: dificilmente o ISIS está por trás do Libertaria.

- Quem poderia ser inimigos dos EUA e do Irã?

- Isso foi um banho de água fria em todo o planeta.

- Senhor, o pessoal do monitoramento acabaram de me mandar um link do youtube. Olha isso.

Todos ficaram em volta do tablet de Jeremy e assistiram um vídeo no mesmo cenário da primeira transmissão, porém dessa vez, ao invés de uma cadeira de metal dobrável, havia uma mesa de madeira velha, com seu tampo coberto por uma grossa folha de vidro fumê. Havia uma maleta aberta sobre ela, porém o ângulo da câmera não permitia ver o que havia dentro. Então o homem-boneco de terno alto e magro surgiu pelo canto direito e se curvou levemente para fala com a câmera.

- Saudações, pessoas do mundo. Antes e tudo gostaria de agradecer a todos os hackers que conseguiram nos contactar e transmitir essa mensagem de primeira mão. Vocês serão o nosso elo que nos ligará as pessoas do mundo inteiro.

Eles decifraram a sequência numérica do último vídeo... pensou Bruce.

O home fez uma pausa e levou a mãos à maleta de metal aberta sobre a mesa, puxando de dentro dela uma pistola pequena de metal, mas não uma arma de fogo, e sim uma pistola para aplicar vacina em bovinos. Pegou a câmera que o filmava e a voltou para o lado direito, aonde ainda um alvo de papel na parede. O homem surgiu novamente de costas para ela e disparou a arma no alvo. Afastou-se da câmera e agora era possível agora ver um pequeno furo no alvo de papel no desenho que imitava a silhueta de um busto humano, como se o tiro tivesse atingido na região central do peito. O homem surgiu próximo do alvo e retirando ele para mostrar o pequeno furo em maiores detalhes provocado pelo disparo.

- Todos estão curiosos para saber como o aiatolá morreu, e a respostas, senhores, é essa: 100 miligramas de hemlock direto no coração.

- Jane, entre em contato com a embaixada para colher informações e oferecer apoio nas investigações.

- Certo, farei agora mesmo.

- Caramba... – disse Jeremy – eu já vi esse veneno, é de uma planta tóxica que existe apenas na Europa e África do Sul. Ela é usada desde a Grécia antiga para matar prisioneiros. Ela causa uma paralisia e parada respiratória. O aiatolá morreu asfixiado.

O porta-voz no vídeo tornou a falar.

- Gostaria aqui de agradecer a colaboração do ISIS na nossa empreitada, porém seus serviços agora não serão mais necessários. Até a próxima transmissão. – Mostrou a palma da mão esquerda.

O vídeo foi interrompido e começou a exibir estática, surgindo ao final, uma nova sequência no centro da tela.

1000.0.00.0.0111.00.10.110

- Parece que eles enganaram todo mundo, até mesmo o ISIS. E agora temos um novo endereço eletrônico. Provavelmente para a próxima transmissão – disse Bruce.

- Acho que não, Sr. Campbell. Isso não parece um endereço eletrônico. Me parece ser um código binário. – disse colocando o tablet sobre a mesa e abrindo um laptop. – Vamos fazer uma pequena pesquisa de resultados no compilador de códigos.

Todos ficaram atentos enquanto Jeremy digitava freneticamente no teclado. Apertou o enter do teclado e aguardou a barra de carregamento encher. Então surge um nome:

- Isso não é binário, é código Morse – disse apontando para a tradução da mensagem na tela do laptop: Beijing (ou Pequim, em português).

Bruce deu um passo para trás como se estivesse recuando do ataque de algum inimigo. Levou as mãos e percorreu os dedos pelos cabelos desgrenhados.

- Só pode ser o próximo ataque, Bruce. Temos que fazer algo logo.

- Avise a embaixada imediatamente. Precisamos avisar o secretário de segurança. Isso já está indo longe demais.

- Mas Bruce, por que eles deixariam uma mensagem tão óbvia para todo mundo?

- Como assim, Jeremy?

- Não é uma mensagem difícil de se decifrar. Você viu que eu consegui decifrar em pouquíssimo tempo.

- Você ou o computador? – cerrou os olhos ao falar.

- Sim, foi o computador. Mas não é uma suposição difícil de fazer. Todo mundo conhece código Morse ou tem acesso. Qualquer analista é capaz de descobrir isso.

- Eles estão literalmente brincando conosco. Esse vídeo vai se replicar como um vírus na internet em breve e todos saberão do próximo alvo. Vários hackers pelo mundo vão espalhar os vídeos do Libertaria.

- Senhor Campbell, a embaixada do Irã deu retorno sobre o aiatolá. Confirmaram que havia uma capsula de titânio no peito do embaixador. Uma capsula do tamanho de um grão de arroz.

- Uma capsula envenenada?

- Sim, uma capsula com microchip de acionamento remoto. O exame deu positivo para hemlock. Encontraram vestígios na cápsula e no corpo do aiatolá.

- Eles colocaram uma capsula minúscula dentro do peito do aiatolá e acionaram remotamente. Isso torna a investigação bem mais complexa agora. Não é como quando alguém oferece bebida envenenada.

- Esses caras possuem acesso a muitos recursos, pelo visto. Fizeram exatamente como no fuzil do prédio: adaptações. Primeiro temos uma arma dos anos 80 para investigar a origem, agora uma pistola de vacinação comum. – disse Jeremy. – Esses caras são bons.

- Falando nisso, Jeremy, conseguiram descobrir algo?

- Pouca coisa, senhor. Parece que arma esteve no Iraque. Foram encontradas amostras de areia incrustadas nas juntas da arma, que bate com a geologia da região, o que não ajuda muita coisa.

- Você disse nas juntas?

- Sim senhor.

- Então a última vez que ela foi desmontada e feita manutenção foi provavelmente nessa região.

- Faz sentido... – disse Jeremy impressionado como se não tivesse enxergado o óbvio.

- Informarei o Diretor Geral.

Bruce puxou o aparelho celular do bolso e repassou as informações para o Diretor Geral da CIA por meio de mensagens.

- Farei contato com as bases no Iraque para ficarem atentos. Continue investigando, Campbell. Mantenha-me informado a respeito da situação do Irã. Estarei com o presidente interino nas próximas horas. – Leu em seu pensamento.

- Sim senhor. – disse em voz alta.

Ele viu um monte de mensagens no seu celular sobre o Irã, algumas pessoas perguntando se o próximo atentado seria em Pequim. Jeremy tinha razão, não era um enigma, eles querem gerar pânico.

Marcos Paulo Silva
Enviado por Marcos Paulo Silva em 21/05/2020
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