A delinquência de Próspero

Virgílio Próspero nem sempre foi frio e insensível perante a morte. Seu início na carreira policial foi marcado por uma migração natural da vida acadêmica no ambiente de pesquisa da medicina forense para o corpo de peritos científicos da polícia judiciária. Foi convidado pelo mentor, professor catedrático e juiz de direito, Doutor Boris, após perceber as qualidades raras do protegido. Nesta época, Virgílio era um audaz defensor da lei da justiça, mas antes de tudo, da preservação da vida das pessoas ligadas tanto ao bem, quanto ao mal.

Para ele, a vida, em si uma criação divina, predominava sobre a lei dos homens. O direito natural é preponderante sobre o direito positivo.

Tudo mudou quando a prática científica nos temas policialescos foram se encaixando na realidade. As teorias sucumbem aos fatos.

Há alguns dias, a Polícia Militar de São Paulo prendeu um homem e apreendeu três adolescentes suspeitos de arremessar celulares, usando uma balestra, um tipo de arco e flecha, para dentro da Penitenciária Dois de Presidente Venceslau. Na penitenciária de segurança máxima estiveram presos alguns dos principais criminosos de São Paulo, como o chefe da facção PCC, o Marcola. Agora estavam lá outros condenados do PCC, mais resignados e menos confidentes. Eles vazaram a forma de recebimento dos celulares. Presos os rapazes da execução do serviço, então estes confessaram à polícia terem sido pagos, cerca de três mil reais, desde que arremessassem as flechas com os aparelhos presos em fita adesiva para dentro da penitenciária, na hora do banho de sol, a cada data aleatória que alguém levasse os aparelhos até eles. Ninguém soube, mas ideia original do golpe partiu de Virgílio Próspero, preso lá em Rondônia. Trouxe a técnica para uso, após lembrar da série norte americana "Walking Dead", cujo personagem Daryl usa com maestria o armamento para diversas finalidades, a principal era de perfurar crânios apodrecidos de Zumbies, numa operação silenciosa. O silêncio então era o essencial. Qualquer alarde, o canal se fecha. A importância das sutilezas é exatamente isso: o silêncio. Por si só o silêncio já é a maior das sutilezas. No silêncio dos bons, os péssimos se sobressaem. Martin Luther King foi magnífico ao cunhar a frase " “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”. Temos outras boas ideias nesta linha, como a do pastor alemão (não é a raça do cão) o luterano Martin Niemoller, inicialmente um defensor pró-Nazismo, que depois abriu os olhos e, numa chance de entrevista pessoal com o "Fuhrer" Adolf Hitler, que queria eximir a Igreja de toda responsabilidade pelas questões "terrenas" do povo alemão, relatou à posteridade: "Ele me estendeu a mão e eu aproveitei a oportunidade. Segurei a sua mão fortemente e disse: 'Sr. Chanceler, o senhor disse que devemos deixar em suas mãos o povo alemão, mas a responsabilidade pelo nosso povo foi posta na nossa consciência por alguém inteiramente diferente'. Então, ele puxou a sua mão, dirigindo-se ao próximo e não disse mais nenhuma palavra."

Depois disso mudou de rumos e é verdadeiramente dele a declaração: "“Primeiro, os nazistas vieram buscar os comunistas, mas, como eu não era comunista, eu me calei. Depois, vieram buscar os judeus, mas, como eu não era judeu, eu não protestei. Então, vieram buscar os sindicalistas, mas, como eu não era sindicalista, eu me calei. Então, eles vieram buscar os católicos e, como eu era protestante, eu me calei. Então, quando vieram me buscar.... Já não restava ninguém para protestar. ” A frase é tão boa que a roubaram para a autoria do dramaturgo alemão Bertold Brecht.

Pensando nisso tudo, Virgílio Próspero reconsiderou se ainda havia tempo para se retratar sobre seus atos. Não, pensou em seguida: - Não existe espaço nem mim para arrependimentos!