O obituário
O obituário dizia que morrera ainda jovem, sem nem mesmo completar trinta e cinco anos. Foi de uma hora pra outra rapaz! Dizia o seu colega de repartição, a quem se aproximava da esquife em que descansava eternamente o homem. Todo mundo sabe que estas coisas são assim. Quando chega a hora, não adianta se esconder. Mas, ainda assim era triste a notícia de que falecera de repente. O que teria ocorrido? O coração estava batendo em dia, segundo o último exame geral. De tristeza certamente não podia ser! O homem andava sorrindo à todos que cruzavam seu caminho, preferia sorrir à desagradá-los. O mesmo colega de repartição que no velório dizia que a morte ocorrera de uma hora para outra, se lembrou de que o homem reclamou certa vez, numa das raras vezes em que trocaram palavras, que lhe incomodava faltar cada vez mais a memória, pois esquecia coisas de dez minutos atrás, e que talvez precisasse de ajuda, ele tomava insulina, aplicava nele mesmo uma agulhada certeira bem no bucho. Poderia ou não ter alguma relação entre seu esquecimento e as aplicações de insulina, uma vez que poderia muito bem ter se matado com uma superdose; são apenas suposições sem pé nem cabeça de minha parte. O obituário não era claro quanto a verdadeira causa do passamento do homem, também parecia que ninguém mais se importava em saber, afinal, já havia um novo morto na repartição, pronto a ser velado no cemitério conveniado com a empresa, o obituário, no entanto, era bem claro quanto às qualificações profissionais do homem, era um “especialista na função de SDR (Sales Development Representative)”. Se me perguntarem o que esse nome enjoado significa, direi que não sei, é isso.