A Maçã e o louco
dedicado à Sandra Regina
A maçã e o louco
Se não o tivesse conhecido,certamente,minha vida estaria faltando um pedaço...
Era um final de tarde de Primavera e o sabiá laranjeira terminava seu canto triste,uma espécie de lamento repetitivo como que quisesse dizer que aquele dia,jamais, retornaria e as horas santas da noite,lentamente,se arrastavam.
Caminhava,absorta com meus fantasmas de longa data e a conversa tinha sempre a mesma reflexão.
O grande pensador Jean Jaques Rousseau,uma vez disse:”A Natureza fez o Homem feliz e bom,porém,a Sociedade deprava-o e torna-o miserável!”
Como sempre,levava um saco com duas maçãs graúdas,vermelhas rutilantes e ansiava falar para alguém que as trazia para alguma emergência como alimentar uma ave migratória e dizer o quanto eu era feliz... Entretanto,os transeuntes passavam com fechadas garatujas,atitudes casmurras que me desanimavam à qualquer intento.U’a mulher atormentada dirigiu à mim toda a sorte de vitupérios agressivos.
Sentado sob uma frondosa figueira,um homem magro,protegido com farrapos de antigo vestuário me cumprimentou com um sorriso de lua e através de seus olhos percebi algo estranho,inquisidor,mas,ao mesmo tempo,afável.”Bom dia senhora!” Respondi,um tanto surpresa:”Bom dia”.
Chamam-me de o “Cultura”,porém,sei que nada sei!
Aquelas palavras me fizeram pensar que estava diante de alguém especial e transcendi a periferia daquele renunciante e auscultei sua alma.
Súbito,o Cultura tornara-se diáfano,espectral e podia ver através de sua transparência ,as raízes grossas da grande arvore.
O mendigo que era tido como um louco desde a adolescência,oriundo de família abastada,falou uma verdade que tanto queria ouvir e debatia com meus amigos de viajem ,os pensamentos intrusos...
Disse,em tom sóbrio e tácito:”A espécie de felicidade que eu preciso é não fazer o que quero,mas,não fazer o que não quero!”
Aquelas palavras soaram como trovão em minha mente,pois,agia exatamente,daquela forma.
Repito,pois,se não tivesse me deparado com o Cultura,a minha existência ficaria sem um bom pedaço.
Movida por impulso de gratidão,retirei u’a maçã rubra e dei para aquele louco de tanta sabedoria.Ao receber o delicioso e perfumado fruto,ele num leve movimento que demonstrava a fraqueza de seu organismo,levantou-se e se aproximou de outro mendigo que se protegia sob uma marquise,dando aquela maçã.Este,por sua vez,não comeu e entregou o precioso fruto à outro desconhecido.
Atônita fiquei,quando,após alguns minutos de silêncio,surgiu um pobre menino de rua e entregou a mesma maçã!
Disse,calmamente,o Cultura;”Amiga querida esta maçã que retorna neste momento,não é a mesma que saiu de suas mãos...Ela seguiu um caminho de devoção,cada um que a recebeu depositou um pouco de sua energia.
“Sente à meu lado e sirvamos deste divino repasto”
Ao sentir o sumo doce descer pela garganta,uma onda de ventura se me apoderou.Meus ouvidos ouviram todos os sons de minha vida,uma florzinha do beiral do caminho desabrochou,lentamente,servindo de porto seguro ao colibri azul.Falei ao meu querido e louco amigo;”Eu,realmente,sou feliz!”
Quando voltei de minhas divagações repletas de quimera,percebi que a noite havia chegado e o Cultura partira para destino incerto...
foto de Ramana Maharishi
pensamentos ligados a Prasadam o alimento cósmico,inspirado em Lobsang Rampa