Os anjos morrem de overdose

"Meus heróis morreram de overdose..."

Cazuza

Através de um "espirro" divino, chegou em um ventre acolhedor, de entrada barata: "A hora é R$15,00!" Alguém disse para abortar mas, por se tratar de um "espirro" divino, a dona do ventre o “acolheu”.

Nasceu e cresceu no meio do caos. Nem mesmo seus olhos azuis foram capazes de trazer alento a sua mãe que o deixava em casa, com a irmã mais velha, para ganhar a noite. Cresceu como um estranho no ninho. O mundo era um ninho gigante e perigoso. Falava a língua dos anjos que o deixava mais deslocado. Encontrou entendimento através da arte. Por outros anjos guiados, deixou o lar explorando a fundo cada palmo deste ninho hostil.

Música e poesia. Transformou a língua indecifrável em melodias e poesias que tocavam a alma de todos que paravam para ouvi-lo. No bar, quando começava a tocar, suas asas ganhavam vida, chamando a atenção até do bêbado sentado no fundo do bar. E de bar em bar foi fazendo a sua história passando sua mensagem. Contudo, suas dores, continuavam nas entrelinhas de todas a canções. E isso ninguém conseguiu notar.

O vazio no peito era curado com altas doses de destilados e heroína na veia. Era como estar novamente nos céus ou naquele ventre acolhedor. Um instante de paz que era transformado em poesias e acordes. O anjo decifrava sua língua para homens e mulheres voláteis. Logo encanto não iria durar.

Sentiu suas asas arderem quando o encanto, transformou-se em entretenimento. Enquanto cantava, havia pessoas no meio do bar, falando sobre seus problemas pessoais, arrotando, procurando um corpo para afogar suas dores. Aquele anjo, com o violão em punho, era um mero suvenir da noite. Estava paralelamente, seguindo os passos da mãe. Sentiu que já não estava sendo compreendido. A busca por doses e gramas aumentaram. O anjo sentiu a mesma decadência do lar em que foi criado. Era hora de partir.

Em uma noite de pouco brilho, o anjo cantou algo, muito longe de ser uma epifania, um presságio cheio de acordes e melodias. Com as veias cheias de heroína, encontrou a paz definitiva, com um tiro que arrancou-lhe as asas!

Quixote Souza
Enviado por Quixote Souza em 02/09/2018
Código do texto: T6437038
Classificação de conteúdo: seguro