No embalo da rede
Naquele distante e esquecido vilarejo da Onça - que os mais antigos insistiam em chamar de Jaguaruna - a menina Tininha balançava e balançava a rede, embalando o sono da irmanzinha menor, Constância, na dormência inocente de seus quatro anos.
Tarde como as outras, onde qualquer forasteiro que trotasse na rua, ou mesmo cão que ladrasse à sua passagem quebraria a habitual monotonia. Inhana, a jovem mãe das meninas já havia esquentado o café no fogão de lenha à espera do marido Velusiano que a qualquer hora voltava de algum serviço de seleiro.
Pitava sempre com o café e sem o café quente seria um pito só.
E Tininha, sem deixar que a rede parasse, ia cantando, cantando, as cantigas de ninar que aprendera com o pai: "Calai meu menino, calai meu senhor, que a faca que corta, dá talho sem dor...", ou "Batata roxa, amarga que nem timbó...".
Até que a intuição experta de Inhana fê-la aproximar-se da rede, de onde Tininha já fizera notar o sono profundo em que mergulhara a Tança. E ao tocar a menor, pôde a mãe constatar, antes que a dominasse o choque da pesarosa realidade, o corpinho frio - e inerte - de Tança, ela que andara tão doentinha e fraquinha nos últimos dias, sem um que se lhes alcançasse, na esquálida pobreza, um remédio, um farmacêutico ou mesmo um padre.
"Nossa Senhora, esta menina tá morta". E a encomendou à Mãe do Céu.