Objeto do desejo
O objeto de meus desejos foi por um bom tempo aquela pecinha pouco distinta de uma argolinha, mas ali foi que se concentrou, por um bom tempo, toda a tara minha.
Infantil, esclareça-se e se encareça, e vai ver que porisso é que me faliu, sem me sair da cabeça: mais se parecia a um elo de corrente, feito um C mais apertadinho, com aquele fecho, que se deslizava quando forçado pra baixo, e que voltava ao normal, fechando o C, pelo efeito de uma mola. Molinha, é o que consola. Um chaveiro.
Ficava exposto na loja do Teco, o treco, numa das prateleiras do balcão envidraçado, a do meio, e disso tou certo em cheio. E era uma lojinha pequena, pro comércio fraco do povoado, cujo povo andava desendinheirado, mais vivendo do fiado. Cadernos "AVANTE", lápis, borrachas, artigos de higiene e até uns bonés com o bico espelhado
concorriam com o chaveiro pelo espaço apertado do balcão e pelo olhar cobiçoso da freguesia.
O que me chamava a atenção no chaveiro era a sobreposição de cores: o metálico da argola e um quase azulado do fecho deslizante. E só a sensação - prenunciada - de prender aquilo numa das alcinhas da cintura de minha calça - curta, é verdade - já me dava os comichões, ainda mais verdadeiros.
Acho que cheguei a sondar meu pai sobre uma posse - e pose - daquelas. Já me não lembra é se fui direto ao assunto, pra ver logo se esfumaçar a esperança, ou se não chegando a ser suficientemente explícito na manifestação falhei no convencimento da utilidade daquele objeto. Afinal, eu não tinha chave, nem canivete e mesmo se tivesse
um espelhinho daqueles redondinhos com o escudo de um time de futebol atrás - mulher nua ainda não andava disponível, ou ao menos visível -não teria como pendurá-lo no chaveirinho.
E o negócio contudo não me saiu da cabeça. O que saiu foi o Teco, e não só de lugar, pois se mandou prum espaço maior, e mudou de negócio no processo: um bar no maior sucesso, foi tocar.