Na pontinha do céu
Não havia essa coisa de menino ficar beirando meninas. Mas pros mais pequenos, fazia-se exceção. E essa atitude não chegava a ser deferência, era no máximo tolerância. Desde que os pimpolhos se comportassem.
E foi assim na barra das saias das manas Totóia e Bebel, que eu pude ouvir embasbacado - e comportado - aquele relato fabuloso das meninas novas que haviam vindo parar na nossa rua. Nossa rua era até bem plana e, por ser a última no topo do povoado, acabava dando numa porteira, que era o limite de um pasto, atrás do qual vinham várzeas e um horizonte delineado pelo costado de uma serra.
Pois essas novas meninas vieram dizendo, cheias de convicção, que costumavam catar lenha bem pra lá do pasto, e que um dia, quando tinham mais tempo, foram subindo aquela serra - para a qual apontavam - e que subiram tanto que chegaram ao ponto em que a terra e o céu quase se encontravam.
Gesticulando duas delas pelo menos, as maiorezinhas, elevaram os braços e disseram que, na pontinha dos pés, haviam apalpado a pontinha do céu. E que era tudo tão macio e bonito, mas que tiveram muito cuidado para não cair no despenhadeiro - diziam pirambeira - do outro lado da serra.
E eu em tudo que ouvi, cri. Mas hesitei em certificar com as manas a procedência do relato. Achei que elas podiam estragar meus devaneios.