A Fortaleza de Felipe
Quando sentia dores, saudades e tensões, Felipe matava-as no seu esconderijo, num abrigo que há muito se escondia, se protegia e ganhava força. Numa floresta bastante abandonada, onde ninguém tinha tempo, vida e disposição para contempla-la, o garotinho, no período do fim da tarde, evoluía o seu astral, a sua autoestima, para equilibrar, pôr em ordem os seus demônios diários. Chegava ao seu cantinho, de baixo da árvore, tirava seus óculos, esticava os braços, querendo, talvez, encontrar um abraço, um afago gostoso, compreensivo e refinado, o melhor que pudesse receber naquele momento. Nessa espera ansiosa, ele vai de encontro com o vento, em busca daquele que lhe massageie por cada detalhe do seu corpo. Apesar de estar com vestes compridas, conseguia sentir, de forma espiritual, a intenção e a paz da brisa.
Felipe parece esperar por isso, vive semanas de diversos desprazeres, para, como redenção, se purificar e renovar com esse contato direto, vislumbrando, assim, a natureza. Lá, esquecia-se de tudo: mentiras, corrupção, interesse, obsessão, energias más... Ganhava uma nova carga, uma nova coragem, para encarar terríveis dias. Sentia toda aquela movimentação, adquiria muita sabedoria, vivia a humanidade, crescia consideravelmente, mesmo tendo certeza que era uma minúscula peça, um ser imperfeito no mundo, mas pronto para se estruturar, aprimorar, sair da mesmice e de tudo que pode ser rotula, aliena e escravizador.
À noite o abraça e Felipe tenta voltar em si, encarar o mundo, agora, com mais poder. Deixa o seu bem precioso, se despede daquela fortaleza com mais vigor e bravura, nem parecendo ser aquele garoto frágil, abalado, uma porcelana pronta para ser desfigurada em tantos pedaços. Felipe dá uma ultima olhada, pisca para o ambiente, como se tivesse demonstrando intimidade sobre o local, que, naquela expressão, quisesse, humildemente, agradecer pela força recebida com fervor, e, ao mesmo tempo, acertando o próximo encontro, pois sabe que é difícil ter equilíbrio numa "civilização" desumana.
Com isso, Felipe sente-se importante ao perceber que tem o seu templo, o seu abrigo, onde pode recarregar e resgatar a sua pureza, sempre. Um menino com tudo pela frente, em que a imaturidade, ainda, o define, se transforma em um ser pleno, elegante e, quem sabe, um deus, pois tem a sensibilidade de transcender seus pensamentos e ações frente aos comportamentos e as arrecadações humanitárias. Felipe, por tão pouco, vive o seu mundo e se transforma em gênio.