Serpente
Ele queria ser apreciado. Não era uma escolha, era uma necessidade. E quanto mais ele tentava satisfazer a essa necessidade, pior a sua vida emocional que sempre fora destruída ia se tornando. Lutara muitos anos contra a tristeza e contra a solidão, e finalmente tinha algumas poucas pessoas ao seu redor que diziam que o amavam, que agiam com se isso fosse incomensurável. Mas tinha alguma coisa que faltava... ele conseguia fazer com que as pessoas o amassem, mas não que o compreendessem. Elas não entendiam esse eterno cansaço de viver, misturado a um estranho e controlador desejo de ser sempre desejado.
Ele tinha algo que fazia com que sentisse prazer mesmo nas coisas mais banais. Aprendera a gostar de sofrer para não acabar se matando. E com isso aprendera a gostar de seus inimigos tanto quanto das pessoas que gostavam dele reciprocamente. Aprendera a sentir prazer com a humilhação do dia-a-dia para conseguir sentir prazer em alguma coisa da vida. E de tanto relacionar seus amores às suas inimizades, seu coração já não sabia distinguir uns dos outros: ele daria tudo o que a pessoa precisasse, se pedisse. Mas se ela fizesse com que ele se esquecesse qual era o prazer de estar com ela, seria punida com a severidade que puniria um inimigo.
Se tratava meramente de um jogo de prazer, e talvez por isso ele fosse incapaz de manter relacionamentos sérios. Tudo bem se o batessem, o humilhassem, o xingassem, o ofendessem de qualquer forma... mas ele ensinaria da forma mais cruel a todos que ele era superior a isso. Ele fazia com que todos o desejassem de diferentes formas, e o admirassem. Seja por seu belo corpo, seja por seu belo rosto, seja por seu belo coração. Na verdade, acredito que por trás de toda essa bondade e submissão, havia um leão irrefreável, uma serpente armada para dar o bote e destruir todos os monstros de fora que haviam destruído com a vida dele e com o que ele tinha por dentro. Uma serpente cruel, disfarçada de uma bela vadia, torturando docemente cada partícula dos monstros de forma imperceptível. Esperando o momento certo para exterminá-los de forma que seus últimos segundos sejam de pura agonia e dor.