esperança
E S P E R A N Ç A
Da janela de sua casa, à tardinha, quando o sol já se punha e a noite teimava em entrar em sua humilde morada, ficava a olhar fixamente a estrada, poeirenta, vermelha, pôr onde ele, todos os dias chegava., era uma rotina, dia após dia, semana após semana e assim os meses se passavam. Quando o via chegando, seu coração palpitava de alegria, acontecia até das lágrimas pelo seu rosto correr...ela o amava, ele a protegia e a deixava feliz e segura. Era uma vida simplória, mas foi assim desde o início de sua convivência...era um para o outro e os dois se completavam., não tiveram filhos, acreditava ela que Deus não a criara para conceber e este assunto não era conversado entre eles, a incomodava e ele não gostava _ ficava cabisbaixo a coçar o queixo, mas não falava nada, olhos no chão e cabeça caída..
Naquele dia, a demora, já a estava deixando impaciente... já se fazia escuridão, quando ela ouviu passos trôpegos tentando abrir o portão, correu para ver, era ele !
Todo desgrenhado, e com aparência de ter se excedido na bebida, entrou porta a dentro, sem ao menos beijá-la e jogou-se na cama.
O que teria acontecido? Tentou falar alguma coisa, pedir explicações, mas de sua boca nada ouviu., logo estava a roncar, um sono desesperado e com estremecimentos pôr todo o corpo.
Permaneceu junto, sentada na beira da cama, pensativa, chorosa e ao mesmo tempo, chateada... o sono pegou-a de surpresa e ela também adormeceu.
Já de madrugada, percebeu que ele estava a levantar... continuo, fingindo que estava dormindo e com os olhos semicerrados, acompanhou o seu rumo... dirigiu-se ao banheiro para assear-se e logo retornou ao leito...e em seguida pegou no sono, desta vez pesado e suave_ ela continuou fingido dormida, mas a mente estava a mil, tentando solucionar este triste episódio.
De madrugada, chegando o raiar do dia, ele levantou-se e já ia arrumando-se para o trabalho, quando ela o inquiriu:_ O que aconteceu? Você nunca tomou este procedimento... O que foi?
Então ele respondeu-lhe, sem fitá-la, que ficara até mais tarde com amigos, conversando e excedeu-se na bebida., pediu perdão, saiu sem tomar o café, pois acordara praticamente encima da hora do trabalho e foi-se...
Ela, com aceno de cabeça, despediu-se dele... mas aquele dia correu como se o abismo fosse de uma profundeza tal, que ela teve a intuição que algo de mais sério iria acontecer com eles, entre eles.
Cuidou de sua humilde casa, mas o corpo doía, a cabeça rodava, sentia-se estressada e mais nervosa foi ficando, quanto a tardinha estava chegando e logo ele estaria ( estaria?) em casa., sentiu as pernas bambearem quando percebeu que apesarem de morarem juntos, já há um bom tempo, não eram casados!
Ela considerava aquele local com muito carinho apesar de ter sido trazida ainda bebe, com os pais, para morar lá, pois seu pai viera para trabalhar na construção da ferrovia.
Pensou – “ ... seu companheiro não lhe parecia mais familiar, desde aquela noite, tivera a impressão que ele ficara estranho, ele era um estranho...será? “
Não atinava as idéias, como ficar pensando desta maneira, só porque o marido chegara mais tarde em um momento de desequilíbrio, “ ... quantos homens tomam diariamente esta mesma atitude...” _ Fora pensamento ruim, fora...
Foi até o quarto e fitou-se no espelho... era nova, estava com 36 anos, alta, esbelta, morena, olhos esverdeados, cabelos encaracolados longos, mas fitando-se com maior detalhes, percebeu que esta um pouco gorduchinha... o que poderia fazer para impressioná-lo?
Mas impressioná-lo porque? Não era deste jeito que ele sempre a tinha e dizia que a amava?
Podemos escolher a nossa situação? Podemos escolher a hora para mudarmos tudo? _ assim pensava.,
Achava que compreender tudo isso iria diminuir bastante os seus medos...
Dirigiu-se à janela e fixando olhar na estradinha, percebendo então que lá longe vinha uma pessoa., sentiu apenas a paz. Estava consolada, ... ele enfim estava vindo... pelo modo do andar, parece que está trôpego... Meu Deus! Estaria alcoolizado novamente?
Mas não era ele, ainda bem...Mas onde ele andaria? Estava difícil esperar...
A medida que se esforçava, puxando pela memória, fragmentos isolados vieram à tona. Aos cinco anos mais ou menos, havia entrado em pânico quando alguém a empurrou ribanceira abaixo, caindo às margens da estrada férrea, quando neste exato momento, uma locomotiva estava trafegando.
Sua mãe também a tratava com um certo retraimento, pois a achava devagar em suas decisões, desta maneira, aos quinze anos, percebia-se já uma fase aguda de depressão. A mãe em constantes atritos com o pai, passou a fazer tratamentos com um médico psiquiatra e em conseqüência, terapia com eletrochoques.
O seu pai tinha um longo histórico de alcoolismo e às vezes o irmão de Sophia, este era o seu nome, tinha que ir buscá-lo no bar da esquina.
O consumo cada vez maior de bebidas alcóolicas tornava freqüente as brigas com sua mãe, que ficava triste, arredia e mais depressiva.
Mas Sophia considerava, em sua ingenuidade, este padrão familiar aceitável. Pensou, cá com seus botões:_ Será que Euclides, estaria indo para o mesmo caminho de seu pai? Será que ela, também, teria o mesmo fim de sua mãe?
A sua vida sempre fora simples, de uma rotina entendiante, era do ginásio para casa e vice versa., quando já mocinha, começou a namorar, teve vários namorados, namoricos sem maior conseqüências.
Achava difícil confiar nas pessoas, principalmente as que não faziam parte do seu minúsculo circulo de amizades.
Freqüentava a igreja católica, pois seus pais a criaram nesta religião, mas não era fanática, aos domingos , na parte da manhã, era sagrado o ritual de ir à missa., acreditava que sendo boa católica e vivendo corretamente na obediência da fé e dos rituais ganharia o céu, caso contrário iria para o purgatório ou para o inferno. Acreditava que existia um Deus com mãos de ferro que decidia a vida de todos e que juntamente com seu Filho, faziam com que a vida dos homens seguissem uma rotina dentro do especificado.
continua...