O Conto Sem Nome
“O que dizer sobre o que posso ou não ser?”. Foi o que disse Gustavo antes de pular para o vazio que seria sua vida. Não um vazio afetivo, pelo contrário: Gustavo sempre fora famoso por suas grandes paixões. Também não pela falta de vida, pois ele viveu intensamente todos os momentos que pode. Todas as paixões que conseguiu. Viveu um eterno vazio, pois entre aquilo que queria ter sido e aquilo que era existe um vácuo que deixa, para longe, o vácuo que circunda o Universo.
Ele era um garoto normal, nada de espetacular, nada de chamativo. Ele era apenas mais um cara sentado nos corredores de uma livraria lendo o resumo de um livro que ele espertamente fingia comprar.
Nada de especial. Então, porque narrar uma história assim? Antes de contar o porquê, você, que me lê, já teve algum sonho? Já fez algum pedido, mesmo sem saber onde estaria o próximo ato de bondade do Universo, onde estaria o próximo desejo feito realidade? Então, mas mesmo assim você acreditou nele, não? Mesmo sabendo que é impossível prever onde será o próximo desejo feito real... Mas mesmo assim. Você sabe que o mundo está cheio de mágica, então, por isso, você fez um pedido. Então, muitas pessoas pedem por amores, muitas por dinheiros, muitas por sexo, mas ele só me pediu para contar.
Então, como nunca sabemos onde o próximo desejo vai ser feito realidade, onde o próximo sonho será sonhado, cá estou.
Mas, por que alguém quer ter sua história contada? Por que alguém pensaria em algo tão invasivo? Meu caro, a pergunta, como ele me disse, não é essa, mas sim: por que alguém leria uma história contada? Por que alguém leria algo tão invasivo?
Talvez pelo simples fato do vazio que todos sentem. Ou quem sabe por esse ter sido um dos desejos feitos reais. Quem vai saber? O que interessa, é contar.
Depois de ele pular para a vida, ele nasceu. Nasceu de um nascimento nascido. Se assim posso dizer dos que nascem de nascimentos nascidos, assim como os que morrem de morte morrida. Há também os que vivem de vida vivida. Esses são tipos raros. Mas existem.
Ele, apenas nasceu. Não sei ao certo se viveu. Isso ele nunca me contou, creio também que nunca irá contar, pois o tempo sempre nos fora curto para tantos detalhes. E o que seria mais alguns minutos na vida, para os tais detalhes? Como eu disse: são meros detalhes dentro da sorte que é viver.
É direito seu saber que todas as metáforas, salvo a que eu mesmo fizer, são de autoria de meu querido amigo. Não que eu me orgulhe de dizer isso, mas não tenho o direito de roubar o que não é meu, pois sendo meu. Não seria necessário roubar, concorda?
Voltando? Depois de seu nascimento nascido, nossa querida personagem fora batizada. Aqui cabe um conselho: nunca gastem seus tempos em batizados. São festas chatas, sem álcool e com poucas oportunidades de sexo. Era assim que ele se referia a nossas primeiras festas. Não sei ao certo quem está certo, ele ou o avesso do que ele era, mas sei que achava interessante o modo como ele predizia o futuro de nosso mundo.
Não que ele tivesse poderes paranormais, pelo contrário. Como disse: ele era normal. O comum dentro do comum. Mas, destacava-se dos demais comuns pelo fato de sua comunização não ser algo quebrado. Entende? Não? Explicar-te-ei: ele era assim, um pouco natural e um pouco artificial. Natural no que diz respeito à essência material ou física, que é aquela que flui do homem. Artificial no que lhe toca a falta de humanidade. E, afinal, o que é ser humano…? Não entremos no âmbito de algo que não nos cabe.
É mais interessante ainda que ele definisse como a falta de uma essência mista, ou seja, uma essência que o fizesse voar e não dormir, como grande parte das mulheres, ou melhor, como grande parte das pessoas com quem ele havia dormido.
Mas isso também foge do que eu sei. Ele nunca me disse com quem dormiu. Se foram homens, mulheres ou animais, eu nunca soube e nunca saberei. Apenas sei que ele iria. E foi.
Assim, posso dizer que acabou o que sei de Gustavo. Quem sabe outro dia, algum outro que o conheça tão bem como eu, conte-nos mais, diga-nos mais. Até lá, que sejamos todos como ele… Perdidos… Vazios… Humanos… Palavra bonita: H-U-M-A-N-O-S. Seres na condição de livres. Ser livre é a condição de ter liberdade. Liberdade é um palavra que o sonho humano persiste por ter, mas que ninguém nunca viveu para sentir…
"Leiam minha apresentação: http://www.recantodasletras.com.br/cartas/2394709"