MOTÉL FERROVIÁRIO

Eu e Martinha voltávamos da aldeia de São Nicolau após cumprirmos a tarefa de devolver a caveira envolvida na aposta macabra do seu Amaro.(vide Uma aposta do outro mundo). O dia já quase amanhecia e Martinha estava exuberante em carícias e beijos que me tiravam o fôlego. Não havia no local um motel e mesmo que houvesse, aos meus 17 anos, dependia da mesada que recebia de meu pai, que obviamente não incluía despesas de tal natureza.

Pensei no porão da igreja, mas percebi que não iria surtir efeito. Depois do que havíamos feito naquela noite, abusar da boa vontade do dono da caveira poderia ser desastroso. Assim caminhamos lentamente apenas uns dois passos entre cada longo beijo. Quando nos demos conta estávamos diante de um vagão ferroviário cuja porta estava entreaberta. Martinha olhou-me com aquele olhar que deixava claro o que ela estava pensando.

– Não! Isso pode ser complicado.

Mas quando a Martinha metia alguma coisa na cabeça, não tinha como demove-la da idéia. Assim, subi ao vagão e tomando-a pelos braços, icei para dentro. Havia lá algumas pilhas de sacos de farinha de trigo. Ao perceber um espaço entre elas com apenas uma fileira ao solo, ela agarrou-me pelo pescoço e me puxou para cima da improvisada cama. Loucamente entre as mais lidibinosas carícias e inomináveis promessas de amor, mal nos desfizemos das roupas e nos entregamos ao mais puro sabor do prazer. Ela estava febril e eu podia sentir seu coração batendo acelerado. Os sacos de farinha facilitavam a variação de posições e estávamos embuidos de experimentá-las. Quando estávamos em pleno desempenho de nossas faculdades de amantes, um solavanco típico de uma locomotiva engatando em um dos vagões subseqüentes jogou-nos ao chão. O trem começou a mover-se e não dera tempo sequer de pensar em vestir-se. A composição aumentava a velocidade e só restava continuar o que estávamos fazendo e aproveitar o balanço do trem. E o balanço, tornava as coisas ainda mais excitantes. Rio Pardo fica a cerca de 3 km dali, mas como a velocidade era baixa, foi possível completarmos o nosso inusitado ato de amor a bordo do improvisado motel.. Felizmente ao chegar a estação o trem parou e saltamos já vestidos esgueirando-nos rente aos vagões para não chamar a atenção.Parecíamos dois fantasmas, com farinha nos cabelos na roupa e pelo corpo todo.

– E agora? Como vamos explicar isso?

– Calma, argumentei olhando para o Rio Pardinho de águas claras e tranqüilas.

Naquele local, era raso e como era verão a água estava agradável. Estávamos novamente nus e ela me enlaçou, me beijou novamente e murmurou no meu ouvido,

– Sabe? Eu nunca fiz dentro dágua. Claro, nem adiantaria argumentar nada e lá estávamos novamente experimentando as delícias do amor subaquático. Ao final, estávamos exaustos e nos jogamos no gramado sob algumas árvores e assim ficamos por um bom tempo curtindo o ar puro da manhã.

– Meu deus! Exclamou. E agora o que vamos dizer aos nossos pais?

Lembrei-me da minha tia. Não teria dificuldade em convencê-la a confirmar para a mãe da Martinha, que adoecera e nós havíamos passado a noite com ela.

Voltamos então, andando pelos trilhos e quando chegamos ao clube para falar com minha tia, quem nos recebeu a porta? Nada menos que a mãe da Martinha.

A velha de braços cruzados batia um pé no assoalho e devorava-nos com um olhar ameaçador.

– Espero que você me conte onde se meteu desde ontem à noite.

Desta vez a Martinha surpreendeu.

– Mãe! Não fizemos nada errado. Ficou tarde e eu dormi na casa da Claudinha.

Chegamos aqui juntos por acaso.

Ela sabia que sua mãe e a da Claudinha não se davam e, portanto não havia possibilidade de que a mentira fosse descoberta. Minha tia de trás do balcão piscou um olho dando-me a entender que não acreditara em nada.

A velha pareceu engolir a desculpa meio a contragosto e o resto do dia transcorreu finalmente de uma maneira normal.

Lauro Winck
Enviado por Lauro Winck em 10/04/2010
Código do texto: T2188697
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