A outra (face de mim)

Maria Valentina descobre que seu eu, mais que profundo, retorna e se apodera do seu corpo, só que esse eu - mais que profundo - na verdade é a outra. A outra, é a que morreu afogada. Ela é espúria, lasciva, sinuosa, raflésia, açucena e mandrágora. E como todos estes adjetivos não lhe bastam, ela deseja desesperadamente tomar o seu lugar, lugar que ela dedicou à outra pessoa, que não é mais dela.

Mas, a outra – a que morreu – deseja intensamente voltar, apossá-la e possuí-la por completo, inteiramente, com todo fôlego, como se soubesse o que Maria Valentina realmente deseja, e na verdade, sabe o que está criminalmente oculto nela.

A outra é cruel, indômita, pagã, intensa, diabólica, ardil. E quando se apodera do corpo de Maria Valentina, sai em busca do que ela renega, e se afirma como dona dela. O prazer mais refinado e profundo de Maria Valentina, não é ela que sente, é a outra, que lhe dá mastigados restos desprezíveis a sua fome absoluta.

Maria Valentina sabe que precisa afastar-se dela, por ignorá-la, mas, não tem jeito, quando a outra volta, vem com toda força e peso de sua luxúria poluída, sobrepujando sua vontade, vontade que ela sabe que precisa renegar para sempre, pois a devasta e a aprisiona.

Maria Valentina deseja romper com a outra, por enfrentá-la, e abolir sua essência, mas, a outra, se quer escuta sua vontade e sai pelo rumo oposto. Mas, ela prometeu, fez a promessa com toda sua energia e disposição mental, prometeu que a afogará de novo na morte, antes que ela volte ,e faça com que ela esqueça sua mente e entre num transe irreversível de identidade.

Maria Valentina a atacará, a ferirá e a condenará por crimes a que a fez cometer. Assim a outra adormecerá de novo na penúria do esquecimento.