A MALDIÇÃO DO FANTASMA - Parte I - A Visita do Fantasma
A MALDIÇÃO DO FANTASMA
I. A VISITA DO FANTASMA
Ela chegava sempre à meia noite e entrava no meu quarto sibilando como cobra (ela sabia que eu tinha medo de cobras...). Pairava alucinada sobre minha cama e me olhava de suas órbitas sem olhos, mas de onde se percebia o saltar de um ódio cruel. Sua pele era muito branca, mas sua boca era vermelha, bem vermelha, cor de sangue... Era um contraste terrível! Ela chegava e ria... Ria um riso sarcástico, debochado, nervoso... Pequenas rugas marcavam-lhe o rosto, dando-lhe sempre a impressão de um rictus extremamente cruel. Depois, como sabendo sua posição privilegiada em relação a mim, sentava ao meu lado, em minha cama e me encarava: o que fora o rosto tremia de ódio...ela gesticulava, falava alto, sons pouco inteligíveis e apontava o dedo em riste, de sua mão muito branca para meu rosto e eu entendia que aí ela dizia: “Ele é meu! É meu!...” Seu cabelo desgrenhado, que eu conhecera em vida sempre muito bem arrumado, se mantinha louro, muito louro, louro claro... Por debaixo dos véus que a envolviam, podia-se ver a fina roupa que usava, impecável, como sempre a vira. Suas mãos chegavam muito perto, parecia que ela me bateria no rosto e se preparava para uma terrível luta corpo-a-corpo, mas então, seus dedos muito finos, se transformavam em pequenas cobras que se contorciam e se enrolavam, preparando-se para o bote mortal...eu a olhava muda e quieta... Não conseguia reagir. Nem ao menos tremia! Ficava imóvel, sentindo que a própria cama se acercava a mim, como tentando me proteger dela. Via-me envolvida pela cama como criança dentro de um berço acolchoado e aconchegante. Mas eu sentia frio. Muito frio. Apenas frio. O medo me paralisava... Ela era um misto de bruxa e de fantasma... E ela ria e ria e dizia rindo: “Te destruí! Te destruí!” E eu percebia que os dentes, ao seu riso sarcástico e cruel estavam manchados de vermelho. (Seria o vermelho do batom que ainda usava? Não!! Era sangue!!...) Neste momento transformava-se em uma enorme naja, linda, faiscante, colorida em tons de roxo, lilás e preto, e ao mesmo tempo nojenta, envolvida em véus esfarrapados... E eu sentia sua presença fria e pegajosa muito perto de mim... Podia sentir seu hálito: era como o hálito da morte... Enroscava-se, empinava a cabeça com sua língua bipartida e seus olhos faiscantes perecendo que já ia jogar-me seu veneno. Mas, quando ia lança-lo sobre mim, voltava à forma de mulher. E rindo, me perguntava:
-“Tiveste medo??...”
Eu não conseguia responder. Minha voz ficava muda e eu inerte...
Então ela dançava sobre mim, sem me tocar, mas eu sentia dores terríveis em meu corpo! Com palavras ditas em uma linguagem estranha, ela invocava espíritos imundos e putrefatos, que lhe traziam uma boneca de pano. Para meu terror, a boneca se parecia comigo!! Então suas mãos muito finas, transformadas em pequenas cobras picavam a boneca em vários pontos... enquanto ela ria!!... Em cada lugar picado na boneca, eu sentia uma dor lancinante no lugar correspondente ao que fora picado na boneca... E assim, nessa tortura sem descanso, toda a noite se passava... Quando raiava o dia ela dizia: “Eu vou, mas volto! Espera anoitecer...” e se desvanecia com sua boneca e seus espíritos imundos, sem deixar rastros... eu ficava gelada e com frio... muito frio!...
Então, olhava ao meu lado, e via o meu amor, dormindo tranqüilamente, como se nada tivesse acontecido... Amanhecia.
Não sei como eu passava o dia. Minha memória não conseguia gravar as coisas que eu fazia, porque o medo da noite que viria me deixava atordoada. Tudo me parecia mecânico, artificial. Lembrava-me dos olhos da naja, das órbitas sem olhos da mulher que me lançavam terríveis faíscas de ódio e parecia que estava hipnotizada por eles. O dia passava rápido demais e eu me sentia perdida. A noite chegava rápida demais e eu me sentia aterrorizada...
(continua)
[NOTA: Quaisquer semelhanças com fatos ou pessoas, mortas ou vivas, são mera coincidência.]