Condenado
No quadro de cem anos atrás meu retrato fitava o vazio, estava preso na moldura como eu estava preso aquela casa. Morri e não ousei sair, nunca, agora era assombração, espectro de uma vida passada, sem passado e sem futuro, apenas um eterno presente, eterna condenação.
Em meus pés invisíveis de fantasma correntes pesadas estavam atadas, as arrastava pelas escadas, pelos corredores. Assustava os vivos, acordava os mortos. Vida desgraçada, morte mil vezes desgraçada.
O que fiz para merecer tal fim? Mas quem disse que era o fim, se a vida era efêmera a morte era eterna, eterna condenação.
Arrastar correntes, assustar os vivos, sofrer em solidão, implorar por perdão. Até quando meu Deus? Até quando?
Deus não responde. Onde está Deus? Pensei que ao morrer o encontraria, nem o Diabo eu encontrei, e onde estão eu não sei.
Nem eu sei onde estou. Não é céu, não é inferno, é tempo fechado, prisão inescapável. Nem sei mesmo quem sou, sei somente o que fui, aquele do retrato na parede.