NÃO LEIA APÓS A MEIA NOITE.
O mau cheiro alertou os vizinhos. -"Vem do apartamento 560!" Disse Walter ao investigador de polícia. As equipes especiais, com armas, as luvas e máscaras, arrombaram a porta. A tropa de choque entrou na frente. Os feixes de laser por todas as direções. -"Aqui." Gritou Jackson, o policial negro de Daytona e há quinze anos na força. A equipe se reuniu. -"Vou acender a luz." Anunciou a tenente Samantha. O cadáver do velho Sebastian apodrecia no sofá vinho. O agente Stanley virou o rosto, com asco e quase vomitando. Dois policiais reviraram a residência. -"Nenhum sinal de arrombamento, furto, drogas ou violência. O velho estava só. Hora da morte, meia noite e vinte." Os investigadores tirando fotos da cena pavorosa pra nós , mas pra eles tão comum e rotineira. -"Um livro. " O detetive Morpheu pegou um pequeno livro de bolso no chão, perto do sofá. -"Estranho. Parece egípcio, grego." Ele colocou o livreto num saquinho e o lacrou. -"Vai pra perícia análisar." O detetive mostrou o livreto ao investigador Claus. -"Esse olho em relevo, na capa, parece nos investigar. É hipnotizante." Morpheu guardou o livro. Os vizinhos assistiam, horrorizados e surpresos, a polícia técnica levar o bom Sebastian para o necrotério. Há quatro dias ele não saía, não caminhava ao redor do condomínio nem ia ao Rancho Star Red, onde pedia, há décadas, o mesmo hambúrguer de carne de búfalo com gorgonzola, regado a copos gigantescos de cerveja. O escritor viúvo era um contumaz fã do rock das antigas e costumava presentear os vizinhos com discos de vinil de bandas clássicas. -"Que fim triste para o velho Seba." Repetiam os vizinhos. -"Olhos saltados, pupilas dilatadas. Parece que envenenaram o homem." Foi o laudo conclusivo de Brutus, chefe da perícia técnica. O delegado Oliver fechou um caderno, nervoso. -"Será difícil esse caso. Não havia sinais de arrombamento ou furto. O homem estava só." Ele entregou o caso aos investigadores novatos, Stanley e Claus. Seis dias de diligências e interrogatórios com parentes e amigos do escritor Sebastian não deram em nada. Stanley e Claus entregaram o dossiê ao delegado. Caso encerrado. -"Bom trabalho, garotos. Vamos deixar o bom escritor descansar em paz. Ele empacotou sozinho, sem motivo nenhum. Simples assim." Três semanas depois, o juiz Scherzinger bateu o martelo. -"O senhor Sebastian Davids Davidson, de setenta e nove anos, faleceu de causas desconhecidas. Deixou um testamento aos herdeiros e o mesmo deverá ser respeitado. Obrigado." O juiz ajeitou os óculos e sorriu com o canto da boca. O delegado, Stanley e Claus saíram satisfeitos do fórum. -"Uma cerveja e alguns donuts pra fechar o dia?" O delegado entrava no seu carro quando um carro quase o atropela. -"Delegado Oliver. Morpheu está morto." Gritou o policial Jackson, sem sair do veículo. Stanley e Claus se olharam. Eles seguiram o carro de Jackson até o Bronx, onde o investigador Morpheu morava provisoriamente. A tenente Samantha abriu a porta da kitnet. -"Olá. A coisa está feia. Coragem." Os policiais encontraram a polícia técnica trabalhando. O cadáver estava na sala, no chão. As fotos dos peritos. A rua cheia de curiosos. Stanley conhecia bem o policial morto. Ele abriu o saco e olhou bem para o rosto do morto. -"Ele ficou abalado com a morte do escritor, até me pediu pra ter acesso as provas." O delegado pôs as luvas e colheu um livreto do chão, ao lado do copo de whisky. -"Como essa prova, Stan? O mesmo livro que estava com o escritor? Esse caderno de Morpheu prova que ele estava traduzindo esse livro." O delegado olhou fixamente para o olho em relevo na capa. -"Vou juntar às provas. Esse livro não sairá mais da delegacia, espero." O celular de Morpheu estava com a câmera ligada, filmando o dedetive lendo o livro, calmamente. Em certo ponto, o investigador se levanta e parece falar com alguém, nervoso. Ele cai no sofá várias vezes, como se alguém o socasse. Em seguida, Morpheu estava no chão, sem vida. A necropsia, de uma semana depois, nada concluiu, o investigador Morpheu morreu após a meia noite, de causas desconhecidas. -"Nenhum inimigo, nem sinais de arrombamento ou furto. Morpheu era gente boa. Certamente o coração não aguentou seus descontroles alimentares." Disse o juiz Scherzinger ao delegado, encerrando o caso. Stanley e Claus foram chamados. O delegado jogou o pacote na mesa. -"Missão impossível a vocês, garotos. Levem esse livro ao museu, procurem alguém que o traduza." Stanley exultou. -"Era o único ítem nas cenas das mortes, do escritor e do pobre Morpheu. Bravo, delegado." Tempo depois, no museu de arqueologia de Nova York, o professor Desmond abria o pacote. Os dois investigadores sentados. A mesa do escritório cheia de livros e anotações. -"O livreto da maldição, ele existe." O professor riu alto, assustando os policiais. -"Desculpa. Bem, é um livro antigo, talvez de 800 depois de Cristo. Está em sumério e poucos conseguem traduzir. Seu amigo Morpheu deve ter conseguido pois está morto." Stanley e Claus deram um pulo. -"Quer dizer que aquele que ler esse livreto morre?!?" O professor suou frio e fechou o livro. -"Exato, senhor Claus. Morpheu deve ter lido após as badaladas da meia noite, quando as palavras rituais de magia, entre as frases do texto, liberam a maldição o espírito preso no livro. Ele sai por esse olho." Stanley se benzeu. -"Não tenha medo, agora são duas da tarde. Eu não sei a língua suméria. O espírito maligno sai do livro após a meia noite, quando a pessoa ler as palavras rituais antigas." O professor enrolou o livreto. -"A doutora Miriam sabe sumério. Se quiserem, ela traduz o livro e devolve a vocês." Stanley estendeu a mão. -"Melhor levar ao delegado, professor. Esse livro é um perigo em mãos erradas. O delegado saberá o que fazer." O professor sorriu. -"Desculpa a minha falta de hospitalidade. Café e donuts? Minha sobrinha Jay é masterchefe." A travessa cheia de donuts coloridos saltava aos olhos. Stanley pegou dois. O professor deu a garrafa de café a Claus. -"Voltaremos outras vezes, foi uma conversa agradável culturalmente, professor." Stanley estava satisfeito. -"O livreto da maldição. Não vão esquecer." O professor deu o pacote a Stanley. -"Obrigado, professor. Tenha uma ótima tarde." Tempo depois, os dois investigadores contavam tudo ao delegado. -"Vou já queimar esse negócio. Vamos ao forno do restaurante do Jack." Os três policiais entraram no restaurante da esquina da delegacia. -"Jack. Queremos ter acesso a cozinha." O homem ficou preocupado. -"Não repare nos ratos e não me multe. Estou usando as sobras da semana passada, já não uso mais as de um mês atrás." Stanley adorava o sensor de humor do velho Jack. -"Prepare três cervejas e pindure." O delegado pediu ao ajudante que abrisse o forno. O delegado atirou o pacote com o livreto nas chamas. -"Pronto. Não vai matar mais ninguém. A maldição acabou." O delegado abraçou os dois investigadores. Três semanas depois, a morte da doutora Miriam, diretora geral do museu, passou despercebida da polícia. O professor Desmond assumiu o cargo vago, numa cerimônia luxuosa. -"Quero mais champanhe, garçom. Sou o chefe, agora." O funcionário sorriu. -"De fato, professor Desmond. Não se esqueça que o ajudei, tirando o livro das mãos da doutora, antes da chegada da funerária." O professor sorriu. -"Não esquecerei, meu amigo. " O delegado chegou em sua sala. Trancou a porta e abriu a gaveta. -"Sou fanático por antiguidades e mistérios. Esse livro é muito especial e intrigante. Sou o melhor." O pacote nas mãos. -"Stanley e Claus nem desconfiaram que queimei o pacote com outro livro dentro. Será mesmo que esse livro é mesmo enfeitiçado e matou o escritor e o trouxa do Morpheu?" O delegado desenrolou o pacote. -"Agatha Christie? Fui enganado. Aquele livrinho continuará a matar por aí.. quem quer que o encontre, não leia após a meia noite." FIM