VIZINHOS MACABROS.
Tudo corria bem, na pequena e pacata Lemmonville. O trânsito calmo, sábado modorrento de inverno. Um caminhão, da empresa de mudançasGalaxy, estacionou em frente a casa de número 690, da alameda Frank Sinatra. -"Mãe, temos novos vizinhos." Gritou o sardento William, do alto de seus treze anos. O controle remoto do vídeo game foi deixado no sofá. A curiosidade falou mais alto e William correu para a janela. -"Que ótimo. Aquela casa velha está vazia há anos." Disse a mãe do garoto. O irmão Henry veio do sótão. -"O que é, Will?" O outro apontou os homens carregando caixas. -"São nossos novos vizinhos. A mamãe sempre faz uma torta de maçã quando temos novos vizinhos na rua." William bocejou, após assistir aquela agitação por quase uma hora. Um casal de idosos, com um gato a tiracolo, pareciam ser os novos vizinhos. O homem de boné dos Yankees apontou para o garoto na janela. O gato miou forte e pulou do colo do homem. William se assustou. Escondido atrás da cortina, tremeu de medo. Ele fechou a janela, a ponto de ver o casal entrar na casa. Minutos depois, uma bola saiu da casa e ganhou os jardins. Um garoto de sua idade correu e pegou a bola. Ele acenou para William. O garoto sorriu e acenou. -"Eles têm um garoto. Parece ter treze anos, como eu!" Disse William, mais tarde, a mesa do jantar. -"Não precisa comer todo o purê, Will. Seu irmão ainda não chegou da escola." Disse Jennifer, a matriarca. -"Bem, vou a palestra do professor Oliver. Fico feliz que após sete anos alugaram a casa ao lado. Nunca mais matagal e bichos passando pro nosso quintal. Tchau, Will. Se comporte." Bernard beijou a esposa e saiu. Henry chegou da escola. -"Seu prato está no microondas. Por pouco Will o deixa sem purê." Henry avançou sobre o irmão. -"Eu o mato se me deixar sem purê, fedelho." O garfo na garganta do irmão mais novo. William espirrou catchup no pescoço. -"Estou morrendo, Henry. Me solte." A mulher interrompeu o teatro. -"Parem com isso. Will, limpe sua sujeira. Vocês são péssimos atores." No dia seguinte, William debruçou sobre a cerca. Ficou espionando o outro quintal. Um funcionário terceirizado cortava a grama do jardim. O novo vizinho saiu e conversava com o rapaz. O homem encarou o garoto na cerca. -"Olá, vizinho. A máquina de cortar grama vai cortar suas orelhas." William correu pra dentro de casa. Jennifer tirou a torta de maçã do forno. -"E aqui está minha torta maravilhosa de boas vindas aos nossos vizinhos. Nem o chefe Claude faria melhor." William colocou os braços para trás. -"Aquele homem me dá medo. A esposa dele nunca sai, assim como o garoto da bola." A mulher tirou o dedo indicador de William da torta. -"Coisa feia. Vai se acostumar, William. Há pessoas boas no mundo. Quando seu pai chegar, levaremos a torta de boas vindas aos nossos queridos novos vizinhos." William estava no quarto quando ouviu gritos. Ele correu até a janela. -"É o garoto." A porta se abriu. A bola colorida rolou até o jardim. O garoto saiu e pegou a bola. Ele acenou para William e sorriu. -"Vamos brincar?" O garoto não respondeu e entrou em casa. Mais tarde, Henry se incomodou. -"Vestir minha melhor roupa só pra dar as boas vindas a esses caipiras do Kentucky? Se ao menos tivessem uma filha bonitinha!?" A família Smith saiu até o jardim. Bernard apreciou o luar. -"É uma dádiva ter bons vizinhos. São iguais parafusos, um dia precisaremos deles. Assim diz o pastor Wallace." Ele abraçou Henry. Jenifer tocou a campainha. A torta numa das mãos. Um homem abriu a porta. -"Boa noite. Não gostamos de Testemunhas de Jeová. Vão embora." Jenifer, sorrindo, estendeu a torta. Bernard olhou para dentro da casa. A mulher no sofá. A tevê ligada. -"Somos os Smiths. Sou o Bernard. Essa é minha esposa, a linda Jenifer. Esses são meus filhos, Henry e William. Essa é nossa torta de boas vindas, senhor?" Bernard ficou esperando. -"Senhor??" O homem colocou os óculos. -" Hum. Sou Brandon. São os Smiths, como aquela péssima banda dos 80! Aquele Morrissey, era o cantor, péssimo por sinal. O garoto bisbilhoteiro é o William? Sou Brandon, já falei. Obrigado pela torta. Se estiver ruim darei ao meu gato, Melquíades." O homem ia fechar a porta mas Bernard o impediu. -"Senhor Bernard, minha esposa toma remédios, tem que dormir às 20 horas. Não espera que o convide pra entrar e jogar cartas? Outra hora conversaremos." Brandon fechou a porta. Bernard se afastou. -"Boa noite, então. Seja bem vindo." Já em sua casa, Henry desatou a gravata. -"Podia ter dormido sem essa, papai. Um ogro que perde em educação para o Shrek e ainda desdenha da torta da mamãe." Jenifer estava furiosa. -"Dar minha torta ao gato, onde já se viu?" Uma semana depois, Bernard chegava do trabalho. Viu Brandon sair no quintal, com um saco preto nas costas. Ele arregalou os olhos e entrou em casa. -"Estranho. O novo vizinho parece que vai enterrar algo no quintal." Um carro funerário estacionou em frente a casa de Brandon, na manhã seguinte. Brandon cumprimentou o motorista da funerária e entrou. Bernard olhava da janela. -"Muito estranho. Esse Brandon é esquisito demais. O que um carro funerário fazia na casa dele?" " No dia seguinte, outro carro funerário estava na frente da casa dos vizinhos novos. Bernard estranhou a fumaça, no quintal de Brandon, no domingo de manhã. Brandon estava fazendo um churrasco. -"Olá, vizinho. Bom dia." Bernard estranhou o sorriso do outro. O rádio no volume máximo. -"Bom dia. Feliz, Brandon? Gosta de Nirvana, einh?! Não é tão ruim." O outro ajeitou as salsichas na grelha. -"Feliz sim. Marrietty partiu." Bernard engoliu em seco. -"Partiu?!? Bateu as botas, abotoou o paletó, partiu dessa pra melhor? Me desculpa. Bem, vou dispensar as salsichas. Uma cerveja mais tarde, talvez. Sem álcool. Tem cerveja sem álcool nesse seu cooler? Vou entrar. Tenho que ir a feira com Jenifer." Brandon acenou. -" Que cara estranho. Vou reservar sua cerveja embora você não mereça, aquela torta de maçã estava horrível." Bernard sorriu e entrou. Jenifer pegava a bolsa -"Ele estava com um saco, querida. Havia um monte de terra no jardim, como uma sepultura.
A esposa partiu, ele disse. Acho que ele a matou. O carro funerário, a alegria repentina, tudo macabro e estranho demais. O velho matou a esposa e tentou enterrar a coitada no quintal. Chamou a funerária para levar o corpo. Até parece aqueles casos de Law and Ordern ou CSI." Disse Bernard, na feira. Henry sorriu. -"Está viajando, papai. Vou jogar basquete na escola." Jenifer estava assustada quando a noite caiu. Henry não tinha voltado para o jantar. -"Vou ligar para o Stephen. Henry costumava passar noites na casa do melhor amigo." Disse Jenifer ao esposo. William subiu para seu quarto. A tevê ligada. Assistia a série A Casa de Papel. O pacote de salgadinhos escondido atrás dos livros na estante. -"Oi, Will." O garoto se arrepiou todo. Um garoto de pé, no canto do quarto. -"Quê? Como entrou aqui?" William trancou a porta. -"Posso me sentar?" William mostrou a bicama. O garoto sorriu. -"Posso sair só quando o velho não está em casa. Minha bola sempre vai pra rua." William mostrou o saco de salgadinhos. O garoto recusou. -"Venho sempre aqui. Pode me chamar de Tom." William foi ao banheiro e quando retornou não viu mais o outro garoto. Tempo depois, Bernard entrou no quarto. William dormia. Cobriu o filho com o cobertor e saiu. -"Henry não está na casa de Stephen, querido. Ele sempre liga." Bernard pegou as chaves do carro. O revólver na cintura. -"Vou procurar Henry. Vou até a quadra de basquete." A esposa se desesperou. -"Não vai fazer bobeira, Bernard. Melhor ligar para a polícia." O homem se virou. -"Faça isso. Chame a polícia. Vou dar uma volta." Bernard percorreu a cidadezinha. A escola fechada. O ginásio de basquete idem. As ruas desertas. O vento frio. As horas passando. Bernard freou bruscamente. -"Garoto maldito. Quer morrer?" O garoto pegou a bola e entrou na casa de Brandon. -"Nunca vi esse garoto! Porquê entrou na casa do caipira?" Uma tira da camiseta de Henry na cerca. A bola de basquete no gramado. -"Henry? Ele usava camiseta verde!" Bernard chutou a porta de entrada da casa de Brandon. A arma em punho. A lanterna. -"Brandon? Devolva meu filho ou vai se arrepender." A casa escura e vazia. Bernard acendeu a luz de um quarto. Havia dezenas de caixões de defunto e alguns crânios. Ele se benzeu. -"Aaaiii.... vizinhos macabros! Brandon faz magia negra. Deve ter matado a esposa e agora, Henry." Uma tábua podre se quebrou e Bernard caiu num porão. Ele abriu os olhos. -"Está machucado, moço?" Bernard esfregou os olhos. O garoto a sua frente. A voz não saiu. A campainha tocou na casa de Bernard. Jenifer abriu a porta. Era a polícia. Ela explicou sobre o sumiço de Henry. -"Estou preocupada, policial." O carro de Bernard estava na rua. -"Estranho. Bernard voltou mas não entrou em casa." Disse a mulher. O policial notou a porta aberta na casa vizinha. O outro policial sacou o revólver. Eles vasculharam o quintal. Jenifer reconheceu a bola de basquete do filho. -"Tem sangue na cerca. Uma tira de tecido." Jenifer chorou. -"É do meu filho. Henry esteve aqui. Agora Bernard desapareceu." O policial Klinger chamou reforços. Klinger e Roland entraram na casa de Brandon. -"Cuidado." O quarto com caixões. -"A casa está vazia." Um tiro ecoou. Os policiais foram até o porão. Acharam Bernard caído. -" Atirou para nos chamar. Está ferido." Disse o policial. O reforço chegou. Os paramédicos tiraram Bernard do porão. Na maca, ele voltou a si e reconheceu a esposa. -" Caí e bati a cabeça. Há um garoto lá dentro." Bernard não quis ser levado ao hospital. -"Ligaram do pronto socorro. Um garoto está lá, machucado. O nome é Henry Davidson Smith." Disse um dos policiais. Bernard e Jenifer se abraçaram. Brandon estacionou o carro. Estranhou carros de polícia e ambulância em frente a sua casa. -"É ele! É um psicopata. Prendam esse canalha." Gritou Bernard ao ver o vizinho. -"No chão, homem. No chão!" Gritou o policial Klinger. Brandon obedeceu. Algemado, não ofereceu resistência. O banco do carro do homem estava sujo de sangue. -"Onde está meu filho, Henry?" Gritou Jenifer. -"No pronto socorro. Eu o levei." Jenifer estava irada. -"Deve ter atirado nele e se arrependido." Brandon sorriu. -"Maluca essa mulher. Aquele fedelho pulou a cerca, tentando pegar a bola de basquete e rasgou a perna nas lanças. Um corte feio. Peguei o moleque e corri para o hospital. Não podia perder tempo avisando vocês. O celular dele estava sem bateria e ele não queria preocupar a nada normal família Smith." O policial Klinger retirou as algemas do homem. -"Eu devo desculpas, vizinho. E aqueles caixões? Eu vi o saco preto nas suas costas e a cova no quintal. Estava feliz no outro dia. Sua esposa, onde está? Enterrada no quintal?" Brandon sorriu. -" Policial, o maluco aqui é ele. Eu faço entalhes e cruzes para caixões. Sou famoso decorador e as funerárias daqui me procuraram. Minha esposa foi visitar a tia doente, em Miami. Nosso gato morreu de velhice e enterrei o bichano no quintal. Estava feliz pois os Lakers venceram a conferência, só isso." Jenifer e Bernard foram visitar Henry no hospital. O garoto tinha treze pontos na perna mas estava bem. Rasgava elogios a Brandon. -"Fui um idiota pulando a cerca. Brandon é legal, papai." No dia seguinte, um caminhão de madeira estava em frente a casa de Brandon. Bernard o cumprimentou. -"Bom dia, Smith. Vou trocar o piso da casa, antes da volta de minha esposa." William abraçou Bernard. -"Desculpa por quebrar sua porta e invadir sua casa." Brandon deu de ombros. -"Sua imaginação é de assustar, Smith. Já pensou em escrever contos de terror?" Bernard olhou para o filho. -"Falando nisso, quase atropelei um garoto que saiu correndo de sua casa! Ele perseguia uma bola colorida." Brandon coçou a barba branca. -"Que garoto, vizinho. Está delirando. Não tem nenhum garoto na minha casa!" Bernard continuou. -"O garoto saiu atrás da bola. Depois o vi no porão da sua casa, Brandon. Juro pelo que há de mais sagrado." William puxou o braço do pai. -"Eu o vejo todos os dias. Ele sai quando Brandon não está. Ele foi ao meu quarto." Bernard se arrepiou ao contar a história a Jenifer e a Henry. A polícia chegou. Os policiais Klinger e Roland estavam com os detetives do FBI. William foi chamado pela policial Mary até o notebook. As fotos de antigos moradores da casa de Brandon. -"Esse garoto, Thomas, desapareceu há vinte e três anos. Morava aqui ao lado. Seus pais eram Olivia e Jack Gutierrez. O caso foi arquivado. O garoto nunca foi encontrado." William se arrepiou. -"É ele. É o Tom." Bernard e Jenifer estavam aterrorizados. As escavações começaram, no outro dia, no porão da casa de Brandon. Um esqueleto de criança foi achado. Uma semana depois, as análises e comparações com radiografias dentárias da escola, onde Thomas estudou, provaram que o esqueleto era do garoto. Dias depois, Olivia e Jack foram localizados e presos no Canadá. Eles confessaram que mataram o filho, que insistia em jogar futebol na rua. Dias depois, William jogava videogame quando pressentiu a chegada de alguém no quarto. -"Tom? É você? Tudo foi resolvido." Um garoto estava de pé, no canto do quarto, com a bola colorida nas mãos. Ele sorriu e desapareceu. FIM