sinal de alerta
Mais uma vez eu ouvia aquele som medonho, aquele grito de alerta, mais enquanto todos fugiam para os abrigos, eu fazia o caminho inverso, eu sentia um estranho fascínio, pelo perigo, o ribombar dos canhões, o ronco infame dos motores, o matraquear da metralha, o cheiro pungente de pólvora, a fumaça, o fogo os gritos de terror.
As vezes eu me sentia culpado porque eu gostava de tudo aquilo, da emoção de presenciar, a morte que vinha do céu, como uma cascata de aço e fogo, dilacerando, matando, soterrando, queimando, mais eu não conseguia evitar eu corria como um desvairado, para cima do prédio. Eu queria ver o terrível espetáculo pirotécnico, as faixas de luz atravessando o véu da noite, as explosões da artilharia antiaérea, os vultos fantasmagóricos dos aviões, em meio a tudo isso, eu largava meu posto, e subia as escadas, quase ninguém percebia, em meio a o pânico geral, eu sabia que podia morrer se uma daquelas centenas de bombas atingisse o prédio, mais eu não me importava, eu queria sentir aquela estranha emoção, assistir o desenrola daquele drama, de fogo e sangue se eu morresse seria tão rápido que nem perceberia não que eu desejasse morrer mais aquela sensação louca de ver aquilo tudo, acontecer me embriagava, me fazia esquecer os riscos, inerentes. Eu devia trabalhar como repórter, para acompanhar o desenrolar dos acontecimentos, mais eu não queria repartir essas emoções com ninguém, era um egoísmo estranho que eu sentia, aqueles eram momentos só meus, e de mais ninguém.
As vezes, tudo acabava tão rápido, logo os aviões se afastavam de onde eu estava às vezes demorava, eu via o impacto das bombas nas ruas nas casas, quanta morte e destruição, (eu usava binóculos poderosos) mais para mim era tudo um teatro de horrores, eu sentia prazer com tudo isso, às vezes isso me atormentava “eu sou um monstro por gostar disso” pensava comigo mesmo.
Em algumas noites em meu posto de escuta, eu ouvia os informes dos pilotos, eu me imaginava no comando de um caça, como eu os invejava, se não fosse meu problema na perna, que me faz coxear talvez eu tivesse me tornado piloto, mais eu era apenas um operador de rádio, minha missão era monitorar as transmissões dos pilotos inimigos e dos nossos, e produzir informes para inteligência militar, a fim de tentar se antecipar aos atacantes, localizar onde eles iriam atacar, (numa ação complementar dos radares) meu domínio da língua do inimigo me deixava capacitado para isso, mais eu gostava era da ação durante os bombardeios, porem eu recebia ordens para abandonar o posto,(quando houvesse risco de ser atingido) e me abrigar.
Mais eu gostava de ver a ação, sendo assim eu sempre ia para o terraço que ficava no ultimo andar do prédio e ficava vendo tudo aquilo acontecer. Ninguém reparava em mim, eu era sempre o primeiro a voltar ao posto, meus colegas falavam nervosamente sobre oque havia acontecido, eu ficava em silencio, rindo do medo deles, de certa forma eu me sentia superior em meu mundo particular.
Sempre levei uma vida solitária talvez devido ao meu defeito na perna, sempre tive poucos amigos, sempre imaginava as pessoas caçoando de mim, na escola sofria com as zombarias, agora adulto eu me fechava em meu mundo eu morava numa pequena pensão num quarto com a guerra tive de abandonar a faculdade e entrei para a força aérea, em tempos normais jamais teriam me aceitado, mais naquelas circunstancias graves eu fui aceito para trabalhar como operador de radio, devido aminha educação superior, que me possibilitava lidar com os complexos problemas operacionais que eu tinha de resolver. Sempre fui fascinado com a aviação, especialmente a militar, minha família era de classe media, não havia uma tradição de vida militar, meu pai era um funcionário publico, minha mãe dona de casa eu era o filho único, o resto da família era meio distante, raras vezes nos encontrávamos, sendo assim sempre levei uma vida pacata e solitária, mais a guerra mudou, tudo, era como se meu pequeno mundo se tornasse de repente grande, eu me sentia ligado àquela crise mundial, acompanhava os noticiários nos cinemas e jornais, eu me sentia intimamente ligado aquele grandioso acontecimento mundial, como eu queria participar de alguma forma, foi a ai que surgiu à chance um oficial apareceu na universidade à procura de voluntários para trabalhar no sistema de monitoramento radiofônico, eu me ofereço, fui o único na turma, inteira, a maioria naõ queria se meter naquilo, mais eu aceite com entusiasmo, havia um pre requesito saber o alemão, por sorte eu tinham feito um curso de alemão sabia o básico era o suficiente. Depois de um período de dois meses de treinamento, comecei a trabalhar ficava assim em contato direto com acontecimentos das batalhas aéreas que se travavam sobre nosso país, a princípio, havia pouco para fazer, mais depois a coisa se intensificou ai ficou emocionante.
Antenas de rádio captavam ao longe o ruído dos aviões vindo, eu ouvia a principio sussurros dos pilotos mais à medida que se aproximavam de Londres, suas vozes nervosas ficavam mais claras, eu anotava as comunicações, depois eu fazia uma reciclagem, deixava as informações irrelevantes de lado e seleciona os diálogos mais promissores que deixavam escapar algum detalhe que pudesse ajudar mais isso era antes deles chegarem ao chegar à cidade tudo mudava o martelar do Deus da guerra, tornava tudo inaudível, eu deixava meu posto eu queria ver, os outros fugiam para os abrigos antiaéreos eu ia para o terraço do prédio, com meu binoculo eu avistava os aviões, eu acompanhava tudo, uma vez quase fui atingido por um fragmento de concreto que voou de algum lugar, outra vez o prédio onde estava foi alvejado me joguei no chão as balas passavam zunbindo, mais assim que passaram eu levantei e voltei a acompanhar o drama, observei numa rua próxima os bombeiros lutando contra o fogo que consumia um prédio, avistei gente pulando para morte em meio a o fogo e a fumaça, (confesso que não sentia nada pelas vitimas eu não as conhecia) ouvi o rondo dos motores dos aviões lá no alto numa luta mortal nossos pilotos contra os alemães, dava para ouvir os disparos, num duelo aéreo.
É difícil explicar oque me aconteceu, mais espero que me entendam, após um ataque aéreo noturno, voltei a meu posto, mais quando cheguei lá, não havia ninguém era estranho eu sempre encontrava meus colegas tagarelando sobre o ocorrido, me sentei coloquei meus fones de ouvido então escutei uma mensagem de radio, dizendo – atenção emergência, o abrigo antiaéreo foi destruído por uma bomba , estão todos mortos – eu tomei um susto meus colegas mortos seria o abrigo para onde eles costumavam ir? - larguei tudo desci as escadas o abrigo ficava nos fundos do prédio, aparentemente era impenetrável, eu não podia acreditar, quando cheguei encontre no lugar do abrigo um buraco enorme e fumegante sim de alguma forma uma bomba consegui destruir tudo, fiquei assustado, senti um misto de vergonha e medo, eu sobrevivi porque não foi pra o abrigo ao mesmo tempo todos iriam me interrogar por que não fui para o abrigo? Oque eu fazia? Eu podia alegar que preferi ficar no posto, mais e se não acreditassem em mim? E se suspeitasse de que eu sabia que o abrigo seria destruído? Eu podia ser acusado de traição? E se eu confessase que gostava de subir no terraço para ver a batalha? Seria mal interpretado? Visto como alguém cruel que gosta de ver o sofrimento dos outros? Vi-me em apuros, perturbado com esses pensamentos voltei para meu posto, tive uma surpresa eu vi todos nos seus lugares mais não podia estavam todos mortos, pareciam ocupados, mais o pior que eu vi a mim mesmo sentado em meu posto, mais não podia ser eu, andei ate onde supostamente eu estava, todos na sala pareciam me ignorar, ninguém notava minha presença, foi a que ouvi as sirenes, os barulhos da guerra, todos levantaram e fugiram o outro eu, se levantou também o segui, ele subiu as escadas pra cima enquanto meus colegas desciam, era tudo muito estranho, meu outro eu subiu para o terraço e ficou observando a batalha, nisso eu lembrei que o abrigo seria destruído, me deu uma vontade imensa de alertar meus colegas de impedir que eles fossem pra o abrigo, desci as escadas eu avistei eles entrando no abrigo que era subterrâneo, eu gritei tentei avisa-los mais me ignoravam corri ate um deles tentei pegar no braço dele mais ele nem me notou olhei para o negro firmamento agora iluminado pelo fogo da guerra, ouvi o zunbido de uma bomba corri para o prédio, eu vi a explosão terrível, e todos foram mortos um desespero tomou conta de mim eu queria ter salvado eles, cai de joelhos chorando, ai eu vi a mim mesmo sorrindo e dizendo – porque você chora? Você não gosta de ver a morte dos outros? E um lindo espetáculo – aquela aparição se transfigurou e virou uma horrenda caveira, que gargalhava, entendi que era a própria morte, meu perverso prazer de assistir a morte de tantos agora me confrontava, eu me vi como eu sou, ao mesmo tempo reencontrei minha humanidade quando me desesperei ao ver meus colegas indo para a destruição queria salva-los mais não podia, então tudo apagou, quando abri meus olhos estava em uma Cama de hospital , havia sido atingido por estilhaços, fui encontrado numa poça de sangue no terraço, passei vários dias em coma, mais agora estou de volta, quanto a minha experiência, não sei dizer se foi sonho, ou uma revelação, mais me mudou, hoje eu valorizo a vida, sou uma pessoa diferente, não me comprazo mais com a morte dos outros, pelo contrario, não trabalho mais na estação de monitoramento, tive a perda de audição em um dos meus ouvidos, assim que me recuperar pretendo trabalhar nas brigadas de bombeiros para salvar vidas, foi uma dura experiência, mais que me ensinou o valor da vida humana.