Coisas que andam no meio da noite

Zak olhou pela janela do carona e balançou a cabeça, em desgosto.

- Esse lugar é depressivo - declarou.

De um lado e de outro da estrada, os milharais estendiam-se, altos e escuros sob a luz da lua. A caminhonete estremeceu, ao cruzar uma depressão da pista.

- E pela quantidade de buracos que já passamos, manutenção aqui passa longe - comentou, cotovelo direito apoiado na janela aberta.

- Você está enganado - replicou Brennan, mãos no volante, olhos fixos no caminho à frente. - Eles vêm aqui pelo menos uma vez por mês, tapando buracos e consertando coisas.

Desviou cuidadosamente de um buraco maior na pista; nunca dirigia a mais de 40 km naquela estrada, principalmente à noite, quando o risco de furar um pneu era maior.

- Estão enchendo os buracos com o quê? Areia? - Gracejou Zak, olhando para o motorista.

- Asfalto - Brennan acelerou um pouco mais, pois seguiam agora por um trecho em linha reta de cerca de 10 km e a visibilidade era boa. - Essa estrada não gosta de ser consertada.

- O que ela faz com o asfalto que colocam nos buracos? - Questionou em tom irônico.

Brennan deu de ombros.

- A manutenção de vias diz que o solo daqui é muito abrasivo; come o asfalto, provavelmente. Pneus também se desgastam mais depressa...

- O milharal parece estar se dando bem - avaliou Zak, voltando-se para a massa verde à sua direita.

- O milho já estava aqui antes dos homens - replicou Brennan. - A terra não lhe é hostil; quanto a nós, temos que tomar cuidado...

Alguma coisa escura, maior do que um cão de porte médio, atravessou a estrada correndo sobre quatro pés. Brennan voltou a desacelerar.

- O que foi aquilo? - Indagou Zak surpreso, retirando o cotovelo da janela.

- Talvez um coiote - avaliou Brennan. - Não vou parar para saber.

- Francamente, não gostaria de ter que parar aqui - aprovou Zak.

- E, se parar, melhor ficar dentro do carro - comentou Brennan. - Há coisas andando dentro do milharal... melhor não vê-las, acredite.

- Que espécie de coisas? - Questionou Zak, encarando Brennan.

- Coisas - repetiu cripticamente Brennan. - Até prefiro estar passando por dentro do milharal; se fosse uma plantação de soja, provavelmente poderíamos vê-los.

A lua banhava a paisagem escura. Além do motor da caminhonete, nada mais se ouvia.

- Aquilo lá atrás... não era um coiote, era? - Indagou finalmente Zak.

- Provavelmente, não - acedeu Brennan. - Coisas, você sabe; coisas que andam no meio da noite...

E no fundo da mente de Zak, a visão dos buracos abertos da estrada começou a tomar forma; contudo não eram mais meras depressões no asfalto, eram bocas abertas querendo ser preenchidas com carne...

- [15-05-2021]