Ervas Medicinais

Eles dizem que não tenho condições de cuidar da minha própria filha. Que tenho problemas mentais, que sou esquizofrênica, que não possuo estruturas financeiras, muito menos psicológicas. Todos uns filhos da puta, estes médicos, assistentes sociais e psicólogos. Odeio eles, seus métodos e suas conversas fiadas.

Não tenho problema nenhum. Vivo sozinha e isolada numa chácara que pertenceu a minha mãe, que pertenceu a mãe dela antes disso. Na chácara eu cultivo ervas medicinais que uso para curar as pessoas. De todos os lugares elas veem para que eu as examine e lhes cure usando apenas os poderes da natureza. Não sou curandeira, muito menos charlatã, mas este dom me foi passado pela minha mãe, que aprendeu com a mãe dela, e assim por diante. Pois bem, tenho um amplo conhecimento sobre o assunto.

Quando o telefone tocou, era Ulisses, o pai da minha filha com quem fui casada por longos e terríveis treze anos. A pior época da minha vida, mas vou poupar a leitora desta lamúria.

— Albertina está morrendo, Beth — disse ele ao telefone desesperado. — A menina está ruim. Faça alguma coisa. Você não é curandeira?

Falei:

— Não sou curandeira, seu idiota, apenas uso o poder da natureza para curar as pessoas. Mas o que ela tem?

— Tossindo muito. Ela saiu para brincar na chuva e no dia seguinte começou a tossir sem parar.

Que pai deixa uma criança brincar na chuva? Depois eu que tenho distúrbios mentais. Respirei fundo.

— Levou ao médico?

— Já. Mas sabe como é hospital público; examinaram a menina, prescreveram medicamentos e mandaram ela para casa. Entretanto, Albertina está tossindo tanto, que parece que vai pôr as entranhas para fora. Até sangue ela já tossiu.

— Nossa, ela tá ruim mesmo. Não vou demorar.

Peguei a velha Belina e dirigi o mais rápido que pude. Chegando lá, fiz uma infusão de alcaçuz para Albertina tomar. Em quinze minutos já estava pronto. Passei o dia ministrando as doses. De tarde, Albertina já tinha alcançado uma melhora significativa. Mas seriam necessárias mais infusões. Eu tinha que leva-la para a chácara.

Ulisses chegou de tardinha, muito apavorado e nervoso. Ele estava muito preocupado com a filha. Até brigar com o chefe brigou. Ulisses é hipertenso, não pode se estressar.

— Faz alguma coisa para eu me acalmar.

— Agora.

— Você é uma pessoa boa, Beth. — Disse ele acariciando meus longos cabelos. Deixei. Há muito tempo que ninguém me tocava. — É sempre bom ter você por aqui.

Ele piscou. Pisquei de volta.

Fui para a cozinha enquanto ele ficou com Albertina no quarto. Logo eu voltava com uma xícara de chá fumegante.

O idiota bebeu.

Bebeu e enfartou.

O “calmante” que fiz para ele era uma superdose da infusão que eu havia feito para Albertina. Alcaçuz em grandes quantidades faz elevar a pressão sanguínea.

Não gosto que tocam meus cabelos.

Coloquei Albertina na velha Belina e dirigi o mais rápido que pude de volta para a chácara. Albertina precisava de uma mãe. Albertina precisava de mim.

Conegunndes
Enviado por Conegunndes em 18/08/2019
Reeditado em 18/08/2019
Código do texto: T6723399
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