GALOPES DORIDOS - PARTE II 


2Q==


Continuando o relato...


'...olhos negros e Sombrio, fantasmas que carregarei para o túmulo, arrastando  meus cravos e cruzes, junto com o  que ainda resta, do meu ser vazio e alquebrado...'


'James apareceu outras vezes, conquistando a todos, com seu carisma e educação, Sombrio chegava com seus galopes e imperiosa aparição, parecia ser o dono de todo o solo onde batia seus cascos, impressionante animal. James realmente comprou a propriedade próxima à minha, o casarão era bem diferente do meu, mas também, um excelente investimento.

Os dias passaram e assim que James se mudou para lá, nos convidou para um lanche de inauguração, apenas como agradecimento pelas informações recebidas e também,  por parecer interessado em mim, que continuava enrubescendo, tal qual uma menininha apaixonada. Data marcada, convite aceito,  lá fomos nós. A recepção foi elegante, mas, fria, Sombrio batia os cascos furiosamente sobre o passadiço  pedregoso. Seu dono estava cortês e de modos duros, apenas educados, sem deixar por um instante sequer, de olhar fundo dentro de meus olhos, me senti despida e o desejo por tanto tempo contido, ardia. Abigail e Estevão pareciam estranhamente retraídos, como que temerosos, estranhas sensações flutuavam no ar.

Quando nos despedimos de James, à saída passamos por uma sala de decoração quase espartana, o que contrastava demais com o luxo do hall de entrada e da suntuosa sala de jantar, mas, não deve estar totalmente pronta, mudança recente. Despedidas feitas montamos em nossos cavalos e voltamos para casa, sob um silêncio sepulcral, cada um com suas impressões sobre o anfitrião e seu cavalo de muita personalidade.

Na semana seguinte, com desculpa de trazer umas mudas de plantas exóticas para mim, James apareceu, todo elegante e menos formal, me comendo com os negros olhos penetrantes. Só Sombrio é que decidamente não gostava de Estevão, ficava tranquilo em sua postura até que o caseiro aparecesse, aí era um bater de cascos, um relinchar, que realmente assustava. Um chá aqui, um sorriso acolá, um convite para um passeio pela campina com direito a piquenique e enfim, um beijo aconteceu. Quase desmaiei. Numca em minha vida havia me sentido tão frágil, entregue, dele...

Uma semana depois de muitas visitas, Abigail estranhou a demora de Estevão, saíra tão cedo para a cidade e o Sol já estava se pondo e ele não retornava. Noite alta e a preocupação ultrapassou os limites. Peguei a caminhonete junto com Abigail e partimos à procura dele. Foi um dos piores momentos de minha vida. Estevão estava ao lado da estrada, pela posição, nem mesmo chegara ao seu primeiro destino, o corpo estava destroçado, várias marcas de coices pelo corpo e o sangue atraíra muitas formigas, visão horrorosa. Abigail gritava em desespero, as lágrimas e o  horror travaram meus movimentos. Nossos cavalos sentindo a tensão no ar, nos abandonaram e retornaram galopando velozmente  para o casarão. Ficamos ali a Deus dará, até que do nada, James, seu Sombrio e o caseiro dele apareceram e nos socorreram.

Sombrio estava calmo até demais, estranho animal. O delegado da cidade, fez várias buscas, mas, não apurou nada, concluiu que, talvez o próprio cavalo de Estevão, assustado com alguma coisa, o tenha derrubado e pisoteado, pobre homem. Também não encontraram mais o cavalo. Certas coisas não podem ser mudadas, velório não fiz, o enterro foi só de muita dor, com uma Abigail tão desacorçoada, que dava dó de ver. Eu me sentia anestesiada.

Durante vários dias, James foi impecável, amigo, prestativo, administrou a propriedade como se sua fosse e o cuidado comigo e Abigail foi generoso e agradável, mas, a vida precisava seguir seu curso. Todos voltamos a rotina, arrumei um capataz para auxiliar na lida. Duas semanas passaram tranquilas, James veio várias vezes passear comigo, até me pedir em noivado, o que fez meu coração disparar, selamos o compromisso com um beijo ardente,  tão envolvente, que se ele me derrubasse na relva naquele instante, eu me entregaria pelo avesso, completamente apaixonada. Abigail ficou radiante com a notícia, prezava minha felicidade. Para o casamento foi um pulo, convidados poucos, cerimônia  simples e elegante, James e eu não tínhamos parentes tão próximos, nos bastávamos com nosso amor.  A primeira noite passamos na casa de James. Tão alegrinha pelo champangne, acreditei ter visto a entrada principal diferente, sem suntuosidade, vazia...De manhã, comentando com James e respondeu que achara um foco de cupins, ouvi e descartei a informação, meu único foco agora era o colo dele.

Após uma deliciosa lua de mel de dois meses na Itália, da qual já voltei grávida, tudo mudou em minha vida. Num passeio casual à cavalo com James, Sombrio surtou e pulando sobre meu próprio cavalo, me derrubou, cai de barriga no chão e uma dor fulminante apagou minha visão. Despertei dos dias depois no hospital, perdi meu bebê e não sentia minhas pernas, Abigail estava desolada, muito sofrimento em tão pouco tempo, primeiro Estevão e agora eu. O médico disse que eu não estava paraplégica, apenas o trauma deixara minhas pernas sem forças, com muita fisioterapia iria resolver, mas, iria demorar. Mesmo sentindo uma profunda tristeza não me permitiria esmorecer, até o desaparecimento de Abigail...

Continua...
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 28/11/2017
Reeditado em 29/11/2017
Código do texto: T6184148
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