Fim de Semana de Terror - FINAL
Sozinha naquela casa, Belga esperava ansiosa por uma notícia de seu filho. Algumas horas já haviam se passado e nada do marido chegar com alguma informação. Pensou em sair e ir atrás do menino, mas seria perigoso demais. Mais perigoso ainda era estar dentro daquele recinto. A única coisa que poderia fazer era rezar. E assim o fez.
Ajoelhada aos pés de uma imagem de um santo, Belga pedia que mãos juntas e coração aflito que seu filho voltasse para casa. Riscou um fósforo e acendeu uma vela.
Horas depois ninguém ainda havia retornado. Já era noite.
Um barulho surgiu do quarto onde Belga viu algo. Como estava na janela da sala, o som parecia um pouco distante e abafado. Mas mesmo assim era possível se ouvir. Então ela foi até lá. Em passos lentos e com uma faca na mão estava disposta a enfrentar o perigo. A cada passo dado, o ruído ganhava um tom mais alto e notável. O assoalho de madeira rangia ao ser tocado pelos sapatos. Agora já bem perto do quarto, um arrepio já tomava conta de Belga antes mesmo de que a porta daquele dormitório pudesse ser aberta. Com as mãos na maçaneta, girou vagarosamente e uma pequena fresta se abriu. O barulho tinha aumentando, crescia em ritmo acelerado. E então decidiu abrir a porta por completo.
- Você de novo. Eu já te pedi que deixasse a gente em paz – disse Belga.
No quarto havia uma máquina de costura antiga dos anos 50 e a frente dela uma cadeira de madeira. Ali estava.
Belga tomou coragem e foi se aproximando. A faca estava apontada para a direção certa. Certa para matar. Tudo aquilo era muito arriscado. Perigoso demais. Se Amadeu estivesse ali certamente repudiaria aquela atitude.
Agora, ela já estava atrás da cadeira. Parou ali. Ficou cara a cara com todos os seus medos. Suas mãos soavam frio. Soavam muito. O suor gelado escorria de suas mãos e umedecia o cabo de madeira da faca.
- Ah! – Belga gritou ao sentiu seu braço ser tocado por dedos frios e calejados.
A faca foi retirada de sua mão e jogada pela janela. De dentro do quarto ela ouviu o objeto bater em alguma coisa no jardim da casa. Desarmada e de frente para o perigo, ela se arrependeu em silêncio de ter tomado aquela decisão. Mas já era tarde. Tarde demais para se pensar em qualquer coisa que não fosse a sua sobrevivência e de seu bebê.
- Foi você que levou meu filho não é? Fala. Quem é você? Por que você esta fazendo isso? O que quer aqui? – questionou Belga com os lábios trêmulos.
Depois de ter o braço desprendido, a mulher foi se esquivando para trás a passos lentos. Algum tempo depois ela viu a coisa desaparecer novamente. Sumiu sem dar repostas. Nada falou. O mistério parecia não ser solucionado. Belga já não mais aguentava aquele horror infernal. Queria seu filho e seu marido de volta. Queria viver em paz novamente.
A noite avançava. Amadeu e Gabriel não apareceram.
Belga procurava em sua mente inquieta juntar as peças daquele quebra-cabeça. As peças sempre estiveram tão perto, mais próximas dela do que poderia se imaginar. O medo cegava os seus olhos, impedindo de ver a solução de todo o mistério.
No dia seguinte...
O sol quente escaldante batia no rosto de Belga que adormeceu no tapete da sala. A ansiosa espera por notícias a fizeram dormir ali sem que ela mesma pudesse notar.
- Amadeu? Gabriel? – chamou pela família a fim de que alguém respondesse.
Mas a única resposta que receberá foi o silêncio subversivo e consternado daquela moradia lôbrega.
Belga havia se esquecido de alimentar. Sua fome e sede foram roubadas por aquela situação abaladora e conflituosa. Agarrou uma xícara contendo um café bem forte e em pequenas goladas tentava engolir seu café da manha. Mesmo que todo o inferno pelo qual estava passando, pudesse ser o mais horrível possível, ela sabia que precisava comer. Não queria afetar a saúde de seu bebê. Após virar a última gota de café na boca, ela voltou àquele quarto. Caminhava devagar e segurava a barriga. Antes mesmo que chegasse lá, teve uma surpresa.
A porta estava aberta. Parecia ser um sinal. Algo que... Estivesse facilitando sua entrada. E realmente estava. Dessa vez não levou nenhuma arma para defender.
- O que é isso? – disse Belga surpresa ao ver algo.
- Mãe, chegamos – gritou Gabriel da porta de entrada principal.
A emoção em ver o filho e o marido novamente fizeram Belga pensar em correr para abraça-los. Mas ao lembrar que não podia, se conteve.
- Meu filho, você esta bem? Onde você esteve o que aconteceu?
- Eu estou bem mãe – disse o menino.
- E você Amadeu?
- Eu... Estou bem. Só um pouco cansado e machucado, alguns arranhões e... Enfim, esta tudo bem.
- Graças a Deus. Eu rezei tanto, pensei até que...
- Ei, para de pensar besteira. Eu te prometi que ia trazer nosso filho vivo pra casa, e ai esta.
- Verdade, mas me fala o que aconteceu. Onde você encontrou o Gabriel, como ela estava? Me fala Amadeu, estou aflita.
- Calma amor. É uma história e tanto viu. Mas depois eu te explico tudo.
- Amadeu mas... E aquele sangue no lençol do nosso filho?
- Então... Tem a ver com que eu vou te contar. Mais eu preciso tomar um banho, comer alguma coisa. O Gabriel também.
- Claro, claro. Eu também tenho que te contar o que aconteceu aqui.
Depois de se fartarem de comida na mesa, a família se sentou na sala. Belga ainda estava com os pensamentos inquietos com o que viu. Novamente foi até o quarto.
Em cima da cama um pedaço de papel dobrado ao meio. Era um bilhete. Belga pegou o papel e leu o que ali estava escrito. A cada palavra lida em silêncio por seus olhos, uma lágrima escorria de seus olhos.
- Amor, o que foi?
- Olha isso Amadeu – disse Belga entregando aquele bilhete ao marido.
- Inacreditável! – disse Amadeu surpreso.
- O tempo todo era isso e a gente não se deu conta de nada.
- Mas... Isso era impossível de se imaginar. Mais eu ainda tenho uma dúvida.
- O que?
- Será mesmo que isso aqui é verdade? Pode ser um truque pra desviar nossa atenção, querer acreditar em algo que não existe, sei lá.
- Amadeu... Eu tenho certeza que essas palavras aqui explicam tudo. Agora tudo faz sentido.
Belga parecia ter compreendido os mistérios que rondam aquela casa.
Amadeu ainda estava desconfiado.
O feriado de carnaval já estava quase chegando ao fim. A família agora já poderia voltar para a casa.
- Agora que isso já ta resolvido, o nosso filho esta bem e a gente já ta junto de novo, eu acho que nós podemos voltar para a casa. Não faz mais sentido ficar aqui.
- Não Amadeu. Ainda não, eu tenho uma coisa a fazer antes. Eu não me perdoaria se partisse sem realizar esse gesto. É muito importante pra mim.
- O que você ta falando amor? Vamos embora pelo amor de Deus. Você já teve provas suficientes que ficar aqui é perigoso.
- Confia em mim Amadeu, eu sei o que estou fazendo.
O bilhete que apareceu naquele quarto deixou Belga emocionada. Fez ver as coisas que aconteceu por um ângulo diferente. Diferente de tudo o que poderia imaginar.
- Pai quando vamos embora?
- Hãm... Só depende de sua mãe filho. Por mim já estaríamos bem longe daqui.
- Eu não quero ficar aqui mais.
- Ninguém quer filho. Ninguém quer.
Em frente á casa havia um belíssimo jardim. Havia uma variedade de flores e plantas exuberantes. O perfume delas invadia todo o arredor. Ali Belga ajoelhou-se e delicadamente colheu algumas rosas.
- O que ela ta fazendo pai? – perguntou Gabriel que junto ao pai assistia aquela cena da varanda da casa.
- Sinceramente... Eu não sei Gabriel – respondeu Amadeu.
Algum tempo depois...
- Eu vou ler em voz alta essa carta, esse bilhete, para que você tenha certeza que eu li – disse Belga.
- Para com isso amor, é uma loucura – disse Amadeu.
- Calma Amadeu.
Então ela pegou a carta, abriu e novamente leu. Assim dizia:
“Eu nunca quis machucar ninguém. Não quero tirar a paz de sua família. Tenho uma missão a cumprir aqui. Missão essa que não pude terminar a tempo. Deixe-me terminar o meu trabalho. Preciso terminar a costura deste vestido de casamento de minha filha. Antes de morrer, eu prometi a ela que iria fazer esse vestido para ela usar no momento mais feliz e especial de sua vida. Tudo pode parecer estranho e assustador para vocês, mas é essa a verdade. Eu preciso de ajuda e... Só assim poderei ficar em paz.”
Depois de ler, Belga deixou as rosas em cima da máquina de costura.