Belle

Júlia era uma menina solitária e sem amigos. Fora criada apenas com seus pais em uma mansão solitária no interior, e não tinha irmãos nem ninguém para brincar.

Um dia achou uma velha boneca de pano, dentro de uma caixa empoeirada de papelão, no do porão. Estava um pouco suja, mas Júlia a adorou assim que colocou seus olhos nela.

Os olhos da boneca eram dois botões e seu corpo era costurado com linhas vermelhas, que bizarramente lembravam sangue. O corpo, ela percebeu, era preenchido com arroz. Seu vestido rosa já estava muito empoeirado.

Júlia deu então um banho na boneca e a tratou como sua melhor amiga. Nomeou-a Belle.

A garota se apegou com Belle e sentia que o sentimento era recíproco. Um belo dia então, propôs que brincassem de esconde-esconde.

Júlia colocou sua amada boneca dentro de um baú e ordenou que ela se escondesse em 20 segundos. Claro que ela sabia que a boneca estaria no baú, mas mesmo assim, achava divertido. Contou então até 20 e saiu em busca da boneca, quando para a sua surpresa, não a encontrou no lugar que a havia deixado.

Andou pela casa e a encontrou escondida embaixo do sofá. Não gostando de vê-la jogada no meio da poeira, foi até a cozinha reclamar com sua mãe:

- "Por que a senhora jogou a Belle embaixo do sofá? Eu havia acabado de lavá-la".

A mãe olhou-a assustada e perguntou:

- "Quem é Belle?"

- "A senhora sabe, a boneca de pano que encontrei no porão".

A mãe deixou então cair a bandeja de café, e pisando entre os cacos de xícaras, sacodiu a filha aos berros:

- "Vocês brincaram? Me responda, do que vocês brincaram?"

Júlia então chorando, respondeu com medo:

- "De esconde-esconde!"

A mãe a olhou seriamente, talvez de uma maneira piedosa. Respirou fundo e com uma voz amarga e triste, respondeu:

- "Então é melhor você se esconder. Você já a encontrou. Agora é a vez dela".