O Susto da Realidade
Tudo naquele mundo o impressionava.
O céu azul e eletrônico parecia pairar não muito mais do que 10 centímetros dele, e ele se via num extenso corredor. Apenas o alto era sua visão.
Frente, lados, trás... Tudo era enegrecido por algo que ele não sabia descrever.
Subitamente, aquele mundo o encantava. Era como estar no céu e inferno ao mesmo tempo. O medo e a sensação de conforto pareciam andar juntos, passo a passo com ele naquele misterioso corredor.
Eis que sem explicação o sonho acaba. Não: espere: não acabou.
Ele se vê caindo muito rápido. O corredor ainda está ali, e o céu também, mas parecia que o chão abaixo dele tinha deixado de existir.
Era só a queda sem fim, e junto com ele, tudo ao seu redor parecia estar desabando. Aquele mundo era seu. Pequeno, uniforme, e com um céu tão azul e escuro que ele não podia enxergar. Não podia tocar...
Enfim a queda cessou. O teto sob sua cabeça pareceu clarear e no meio dele surgiu uma luz. Algo branco, como um sol pálido e doentio.
Ele caminhava. Precisava sair dali. As paredes ao seu lado pareciam comprimir-se, tornando o espaço exíguo, claustrofóbico.
O ar que vinha do céu parecia ter cessado. Não havia nada. Absolutamente nada ali além dele. O vácuo. Era ali que ele estava. O pelo menos, achava que estava.
Ele já não respirava. Lutou subitamente buscando retirar algum oxigênio daquele espaço, quando notou uma sombra emergindo da escuridão.
-Olá... – dizia ela. O som de sua voz parecia embargado por água ou algo parecido. – Vamos comigo? Hora de sair.
-Não posso, - dizia o homem – gosto desse lugar.
-Eu sei, mas sua hora chegou. Não vê o pessoal te tirando daí? Eles chegaram.
- Eu morri, não foi?
-Sim, afogado a três dias. Mas acharam seu corpo. Não olhe agora, mas você está todo inchado e roxo...
-Engraçado, não percebo isso.
-Claro que não. Você dormiu, mas agora é hora de acordar. Sua família está na margem te esperando.
-Eles estão chorando?
-Desesperadamente...
-Não quero ver isso.
-Não se preocupe. Você não verá. Apenas olhe pra baixo.
-Pra baixo? Não estou vindo de lá? Até aonde eu sei, meu corpo está subindo agora...
-Você não entende não é mesmo? Pra baixo! Pro inferno!
-Não posso... Não, não posso olhar...
-Sente o calor? Você está caindo! O fogo está chegando...
-Não quero... não posso!!!
Subitamente, tudo aquilo deu lugar a um caldeirão. A água quente invadiu-o, fazendo seu corpo se contorcer de dor. Tudo era lancinante, em poucos minutos ele perderia os sentidos. Esforçava-se para sair dali, quando um vulto surgiu:
-Amor, você molhou a cama?
Sua esposa o contemplava irônica. Como aos 33 anos alguém ainda podia molhar as calças dormindo?
O homem, ainda assustado pelo pesadelo que tivera, levantou-se rápido, enxergando o lençol encharcado, e as pernas, ainda quente pela urina que insistia em escorrer.
Aliviado, correu até o banheiro, dando graças a Deus por tudo aquilo não ter passado de um sonho.