VENTANIA
Seus passos eram constantes, apresentavam-se em um ritmo único, não estava correndo, porém não estavam numa lentidão mórbida, demonstrava se tratar de uma pessoa assustada e retraída. O vento empurrava seu corpo para trás enquanto com os braços curvados sobre o rosto, o rapaz parecia brigar com o forte vento, seus olhos estavam fechados mostrando-o uma escuridão congelante. Após mais alguns passos, o estranho chegou a um pequeno beco próximo à calçada, entrou no novo ambiente no qual agora estava estático. Levou as mãos até o rosto e limpou os olhos que agora se encontravam abertos e lúcidos. Respirou fundo como um boxeador após um longo round, o ar frio entrou no seu corpo causando-o calafrios. O ambiente era escuro e sombrio, as paredes davam um ar de completo abandono ao local, o cheiro era algo irritante porém suportável.
Quando o rapaz olhou para fora do beco, pode observar um velho de bengala, aquela imagem era muito estranha, pois apesar de todo aquele vento, o velho andava normalmente sobre a calçada úmida. Usava um grande paletó preto e um cachecol avermelhado, sua bengala era de madeira e no local onde repousava a mão esquerda do idoso estava uma espécie de pedra amarela, não parecia possuir grande valor, mas era um pouco misteriosa. Sua longa barba descia sobre seu corpo como uma cachoeira em dia de cheia. O velho continuava sua caminhada como se nada tivesse acontecendo, até que de súbito virou seu olhar para a entrada do beco e diminuiu o ritmo dos passos. Uma grande claridade surgiu repentinamente do local onde estava o velho e uma espécie de pássaro negro surgiu cortando os ventos, voou rapidamente sumindo como um faixo de luz. Foi neste exato momento que a ventania acabou, o ar estava completamente parado, o ambiente também esta parado, a cidade parecia estar abandonada, não existia ninguém, nem mesmo um velho na calçada.
Em uma das paredes do beco tinha uma frase que parecia ter sido escrita recentemente, ou talvez naquele mesmo momento. “Existem caminhos mais curtos para a morte”, a frase era curta e breve, deixando o estranho ainda mais perturbado. No chão, logo abaixo da frase, tinha uma arma, era um revólver daqueles antigos. Pegou-o e observou lentamente cada detalhe, estava carregado. Uma grande tensão tomou conta de seu corpo, seus olhos tremiam e giravam loucamente. Projetou-se a arma mirando-a para seu rosto, não parecia ser ele que comandava aqueles movimentos. Abriu a boca e aproximou a arma até atingir seu interior. Sua última ação foi apertar o gatilho. A bala atravessou sua cabeça jorrando uma explosão de sangue e pedaços de cérebro sobre a parede.
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Cris acordou repentinamente com o barulho das persianas se debatendo, dançavam alegremente com o ritmo dos barulhos dos ventos. Seu corpo estava molhado de suor. Cris levantou-se ainda um pouco cambaleante e fechou as janelas, a música parecia ter terminado deixando as persianas imóveis, assim como tudo em seu quarto. Apenas um velho relógio de parede produzia um leve som constante.
Eram aproximadamente quatro e meia da manhã de um domingo frio e desanimado, daqueles dias que ninguém se arrisca a colocar os pés na rua. Cris caminhou de volta para cama e assentou-se na tentativa de sair de seu estado sonolento. Abaixou o rosto e lembrou-se da imagem que viu da janela no momento que fechara. Levantou-se novamente e guiou seus olhos para a estranha imagem de um pássaro preto que estava sobre uma caixa de lixo do outro lado da rua. Cris esfregou os olhos e tornou a olhar, porém não existia mais nenhum pássaro no local, o vento terminara, levando junto aquele ar frio.
Repentinamente o relógio ficou mudo, o tempo parecia ter parado, foi o momento em que Cris virou-se, assustando com a presença de um velho, este estava posto a frente da janela dos fundos, estava segurando uma bengala e vestia um grande paletó preto e um cachecol. Na parede, sobre a cabeceira da cama, podia-se ler uma frase escrita de sangue: “Existem caminhos mais curtos para a morte” , no qual um revólver estava repousado sobre seu travesseiro.