OS CAÇADORES DE LOBISOMENS
Sul da Escandinávia. Idade do Bronze Nórdica (ano 1127 a.C.).
Era uma noite fria no povoado de Asgard, o velho bárbaro Hagnar sentado em torno da fogueira, contava histórias de bravura e conquistas para as pequenas crianças saxãs quando foi interrompido subitamente por gritos desesperados seguidos de rugidos ferozes. Hagnar levantou-se de espada em punho apenas para vê-la voar pelos ares junto com seu braço direito arrancado pela mandíbula do colossal monstro negro que havia investido velozmente contra ele. Ao cair gravemente ferido ao lado do fogo, antes de perder a consciência, ele ainda pôde ver a matilha dizimando os guerreiros e arrastando as mulheres para dentro da mata escura.
Os dez caçadores chegaram à aldeia junto com os primeiros raios de sol montados em seus vigorosos garanhões brancos, em um reconhecimento rápido do terreno logo constataram que se tratava de um ataque dos filhos de Fenris, o Deus Lobo.
Os guerreiros eram imponentes e vestiam túnicas de couro adornadas em bronze, usavam grossas peles de ursos como se fossem capas, dos cinturões pendiam duas grandes espadas de aço, uma em cada lado do corpo. Sobre seus peitos descansavam enormes arcos e em suas costas, acondicionadas dentro de alforjes se projetavam estranhas flechas cujas pontas eram revestidas com buchas de trapos embebidas em óleo.
Andando pelo meio dos cadáveres mutilados, Telder, um dos guerreiros se espantou ao notar que um velho bárbaro ainda respirava. Isso era algo que em sua vasta experiência ele nunca tinha visto: um sobrevivente.
Minutos depois, Hagnar semi desfalecido era levado até a presença de Godar, o comandante dos Guerreiros de Bronze. Godar era um gigante entre gigantes, loiro e com gélidos olhos azuis, tinha mais de dois metros e meio de altura e sua envergadura era impressionante, seus músculos davam a impressão de terem sido talhados em rocha pura e seu olhar era de uma calma e segurança que somente poucos guerreiros podem ostentar.
- Qual o seu nome, velho saxão? – perguntou Godar.
- Me chamo Hagnar, filho de Hott do clã Holtin. E você?
- Godar, filho de Gumm, do clã Wulff.
- O clã Wulff? Achei que eram uma lenda. Que não existiam realmente.
- Pois saiba que enquanto existir algum Homem-Lobo sobre a terra haverá um Guerreiro de Bronze para caçá-lo. E por Odin, jurei exterminá-los. Agora me diga velho, como conseguiu sobreviver?
- Nem mesmo eu sei Godar, gostaria de dizer que lutei bravamente e os afugentei, mas a verdade é que o ataque foi tão rápido que assim que levantei minha espada perdi o braço direito, tudo que me lembro é de ter caído perto do fogo e pouco antes de desfalecer queimei o pouco do membro que me restou para estancar o sangramento.
- És um homem de coragem velho e vejo que não és um bravateiro. Pois saiba que o que lhe salvou foi ter ficado próximo ao fogo, que é uma das poucas coisas que estas criaturas temem.
- Godar, eles mataram todos os homens e crianças e raptaram as mulheres, não me resta mais nada aqui, quero ir com vocês.
- Somos guerreiros, apesar de respeitar sua coragem não posso levar um velho inválido conosco.
- Também sou um guerreiro e ainda me resta um braço bom, não sou inválido e tudo que peço é poder morrer com honra como meus ancestrais.
- Esta bem velho, que assim seja, mas você tem muito que aprender para combater estas criaturas. – E enquanto Hagnar fazia uma reverência em agradecimento, Godar já gritava para seus homens montarem.
À medida que os dias passavam, ironicamente os papéis se inverteram, agora era Hagnar que ouvia calado em torno da fogueira enquanto o jovem guerreiro lhe contava histórias sangrentas dos Homens-Lobos e ensinava como combatê-los:
“Os Filhos de Fenris são homens amaldiçoados, eles são meio homens e meio lobos, se transformam sempre que querem ou quando se sentem ameaçados. Viram bestas quase invencíveis de mais de três metros de altura, sua ferocidade só é comparável a sua capacidade de atacarem em bando. São nômades e vivem pouco tempo no mesmo lugar, não matam só para se alimentar e sentem prazer em dizimar aldeias inteiras. De tempos em tempos, seqüestram as mulheres e levam para seu covil, lá elas tem um destino pior que a morte, pois são usadas para reprodução ou verdadeiras orgias sexuais. Uma vez atacamos um covil e a cena de horror que vi era inimaginável, mulheres sendo sodomizadas por eles, alguns com aparência humana, outros semi-humanos, enquanto que vários faziam o ato completamente transformados nas vis criaturas que você viu. A grande maioria das mulheres eram dizimadas quando eles atingiam o clímax e as extirpavam com presas e garras, em meio a um horrendo espetáculo de sexo e selvageria.
Apesar de fortes, eles não são invencíveis. O fogo é a melhor arma, mas também é possível matá-los decepando suas cabeças ou trespassando seu coração. O golpe tem que ser certeiro, pois mesmo com membros decepados eles ainda continuam lutando. Esteja certo de uma coisa, você não irá lutar com animais e sim com demônios”.
Quanto mais tempo passavam juntos, mais o respeito mútuo crescia, Hagnar admirava a coragem do jovem guerreiro, enquanto Godar via que apesar de velho, Hagnar ainda possuía uma alma bárbara e indomável. Godar achava que iria morrer jovem em alguma batalha, mas se envelhecesse seria como Hagnar.
Borr, o melhor rastreador dos Guerreiros de Bronze que caminhava a frente dos cavaleiros, agachou-se e ficou vários minutos em silêncio observando o solo e a mata ao redor deles, fazia duas luas que eles seguiam os homens-lobos através da Floresta de Tilgrem. Subitamente Borr levantou-se e com um sorriso no rosto informou a Godar que a matilha estava a menos de uma hora de distância.
- A hora se aproxima meus irmãos, deixem os cavalos pois a partir de agora seguimos a pé – falou Godar enquanto tirava uma enorme lança que estava acondicionada na lateral da sela de sua montaria, gesto que foi automaticamente repetido por todos os guerreiros.
Depois de caminharem algum tempo, atingiram uma enorme clareira na mata, Godar fez sinal para os homens se aproximarem e rapidamente começaram os preparativos para o enfrentamento com os homens-lobos. Hagnar ficou impressionado com a organização e disciplina militar dos Guerreiros de Bronze, em absoluto silêncio, cada um parecia saber exatamente o que precisava fazer, viu eles se dividirem em grupos, alguns com as lanças, outros com grandes quantidades de óleo se afastavam e despejavam o material pelo chão formando um grande círculo. Quando as tarefas pareciam ter acabado se reuniram ao redor de uma pequena fogueira no centro da clareira.
Godar olhou para cada um dos guerreiros e disse que Hagnar, Telder e Borr ficariam com ele próximo a fogueira, os demais deviam tomar suas posições conforme haviam planejado. Após um breve silêncio, orientou Hagnar sobre os cuidados em sua primeira batalha com os Filhos de Fenris:
- Sei que você é um grande guerreiro Hagnar, por isso não vou lhe falar sobre honra e coragem, mas sim sobre o que você vai enfrentar. Eles irão atacar em seguida, ao cair da noite, virão em bando e tentarão nos cercar e atacar pelos flancos. Eles usam sua velocidade para surpreender, portanto não tente usar a espada de imediato, use a lança que vai estar ao seus pés. Lutaremos em dupla, eu e você, um de costas para o outro protegendo nossa retaguarda. Telder e Borr farão o mesmo. Não estaremos sozinhos, os outros guerreiros nos darão proteção.
Levantando sua espada, Godar gritou para os companheiros:
- Mais um dia feliz meus irmãos, pois só coisas boas nos esperam: a glória da vitória ou a honra de morrer em batalha com uma espada nas mãos. Que as Valquírias levem os que tombarem. – depois de também levantarem suas espadas entre gestos e gritos de alegria os homens tomaram seus lugares.
A noite chegou poucos momentos depois, trazendo consigo uma neblina densa. Sentados em torno da fogueira, os homens conversavam sentindo a tensão no ar. Os sons vindos da floresta foram diminuindo gradativamente até restar somente um silêncio mórbido e agourento. Godar murmurou uma praga ininteligível e pôs-se de pé enquanto dizia: é agora. E o inferno desceu sobre a terra.
Vindo de todas as direções, as feras surgiram entre as árvores correndo em uma velocidade impressionante de encontro a eles. Godar permaneceu imóvel por alguns segundos e subitamente levantou a mão direita, automaticamente flechas incandescentes cruzaram a noite encontrando o solo previamente coberto de óleo. As bestas foram engolfadas por um mar de fogo e flechas não paravam de ser lançadas pelos guerreiros posicionados estrategicamente nas árvores que contornavam a grande clareira. Os homens-lobos que haviam conseguido cruzar a armadilha a tempo uivavam ensandecidos ao ver que mais da metade de sua matilha havia sido dizimada. Os oito demônios que restavam estavam encurralados por uma muralha de fogo e direcionaram sua ferocidade para os quatro homens que os encaravam. Hagnar pensou que estavam condenados, mas rapidamente, o restante dos Guerreiros de Bronze, valendo-se de cordas, desceram rapidamente e se alinharam ao seu lado enquanto as feras aturdidas se agrupavam para iniciar o ataque. Segundos depois as bestas atacaram, duas foram empaladas pelas lanças, mas vários guerreiros não foram rápidos o suficiente e tombaram esquartejados ou até mesmo mortalmente feridos simplesmente pelo impacto daquelas grandes massas corporais. Mais uma investida aconteceu e Hagnar fez sua parte ao empalar um dos monstros, mas o ataque acarretou severas baixas para ambos os lados, Telder estava morto e Borr gravemente ferido. O último combate foi o mais sangrento, e quando tudo parecia perdido Godar fez a diferença. Empunhando suas duas espadas com uma habilidade inacreditável acabou sozinho com os dois últimos oponentes.
Após a sangrenta batalha, restaram somente Godar, Borr e Hagnar. Fizerem uma breve prece pelos guerreiros que morreram e seguiram em direção ao covil de Fenris.
- Temos que pegá-lo enquanto esta desprotegido, não podemos lhe dar a chance de criar outra matilha – disse Godar ao chegaram na entrada de uma caverna úmida e fétida.
Seguiram com cuidado, usando tochas para iluminar o caminho enquanto prosseguiam devagar. Fenris estava esperando, cercado por mulheres acorrentadas e que tinham no rosto a face da loucura e do desespero.
- Até que enfim Godar, hoje o destino vai decidir se o bem ou o mal irá triunfar. Esta noite será o fim para um de nossos clãs. – falou Fenris para surpresa e terror de Hagnar.
- Seu reinado de terror termina aqui demônio, fiz este juramento sobre o túmulo de meu pai.
- Seu pai falou palavras parecidas alguns anos atrás, pouco antes de eu experimentar sua carne e tirar sua vida. Não se esqueça que sou um deus, pobre homem tolo.
Os guerreiros atacaram, Hagnar decepou uma das mãos da fera antes de ser atirado longe. Borr, já enfraquecido pela perda de sangue mal conseguia segurar a espada e foi mortalmente ferido. Restaram Fenris e Godar lutando ferozmente, por mais de uma vez somente a incrível habilidade de Godar impediu que fosse destroçado e gradativamente Fenris foi sendo ferido, mas quanto mais durava a luta, mais cansado Godar ia ficando, suas forças estavam se esvaindo e num movimento rápido, Fenris agarrou Godar pelo pescoço e arrancou grande parte do seu ombro esquerdo com suas presas. Quando estava prestes a sucumbir, Borr, com as últimas forças que lhe restavam, veio em seu auxílio e cravou sua lança nas costas de Fenris, com o braço direito Godar atravessou o coração do demônio com sua espada e o viu cair a seus pés com surpresa no olhar.
- Me restam poucos momentos de vida Fenris, não sairei desta caverna mas minha missão esta cumprida. Hagnar vai matar todas as mulheres que levam suas sementes. – disse Godar enquanto agonizava.
Também agonizante, mas entre sorrisos diabólicos Fenris respondeu:
- Pobre Godar, tão tolo, também estou morrendo mas minha semente vai continuar e ainda mais forte, serão diferentes mas nunca deixarão de existir porque a decisão sobre o futuro dos Filhos de Fenris caberá aos homens. – disse Fenris enquanto fechava os olhos pela última vez.
- Hagnar, estou morrendo, jure que vai matar todas estas pobres mulheres e acabar com este mal sobre a terra. – falou Godar enquanto suas poucas forças se esvaiam.
- Eu juro Godar, este inferno acaba aqui. Pode acompanhar as Valquirias em paz. – falou Hagnar enquanto Godar dava seu último suspiro com sua espada na mão.
Hagnar matou todas as mulheres na caverna... Com exceção de uma que tentou mas não conseguiu. Mas como culpá-lo por esta fraqueza? Afinal, quantos pais teriam coragem de matar a própria filha?
E assim morreram os Filhos de Fenris... E assim nasceram os Lobisomens...
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Sul da Escandinávia. Idade do Bronze Nórdica (ano 1127 a.C.).
Era uma noite fria no povoado de Asgard, o velho bárbaro Hagnar sentado em torno da fogueira, contava histórias de bravura e conquistas para as pequenas crianças saxãs quando foi interrompido subitamente por gritos desesperados seguidos de rugidos ferozes. Hagnar levantou-se de espada em punho apenas para vê-la voar pelos ares junto com seu braço direito arrancado pela mandíbula do colossal monstro negro que havia investido velozmente contra ele. Ao cair gravemente ferido ao lado do fogo, antes de perder a consciência, ele ainda pôde ver a matilha dizimando os guerreiros e arrastando as mulheres para dentro da mata escura.
Os dez caçadores chegaram à aldeia junto com os primeiros raios de sol montados em seus vigorosos garanhões brancos, em um reconhecimento rápido do terreno logo constataram que se tratava de um ataque dos filhos de Fenris, o Deus Lobo.
Os guerreiros eram imponentes e vestiam túnicas de couro adornadas em bronze, usavam grossas peles de ursos como se fossem capas, dos cinturões pendiam duas grandes espadas de aço, uma em cada lado do corpo. Sobre seus peitos descansavam enormes arcos e em suas costas, acondicionadas dentro de alforjes se projetavam estranhas flechas cujas pontas eram revestidas com buchas de trapos embebidas em óleo.
Andando pelo meio dos cadáveres mutilados, Telder, um dos guerreiros se espantou ao notar que um velho bárbaro ainda respirava. Isso era algo que em sua vasta experiência ele nunca tinha visto: um sobrevivente.
Minutos depois, Hagnar semi desfalecido era levado até a presença de Godar, o comandante dos Guerreiros de Bronze. Godar era um gigante entre gigantes, loiro e com gélidos olhos azuis, tinha mais de dois metros e meio de altura e sua envergadura era impressionante, seus músculos davam a impressão de terem sido talhados em rocha pura e seu olhar era de uma calma e segurança que somente poucos guerreiros podem ostentar.
- Qual o seu nome, velho saxão? – perguntou Godar.
- Me chamo Hagnar, filho de Hott do clã Holtin. E você?
- Godar, filho de Gumm, do clã Wulff.
- O clã Wulff? Achei que eram uma lenda. Que não existiam realmente.
- Pois saiba que enquanto existir algum Homem-Lobo sobre a terra haverá um Guerreiro de Bronze para caçá-lo. E por Odin, jurei exterminá-los. Agora me diga velho, como conseguiu sobreviver?
- Nem mesmo eu sei Godar, gostaria de dizer que lutei bravamente e os afugentei, mas a verdade é que o ataque foi tão rápido que assim que levantei minha espada perdi o braço direito, tudo que me lembro é de ter caído perto do fogo e pouco antes de desfalecer queimei o pouco do membro que me restou para estancar o sangramento.
- És um homem de coragem velho e vejo que não és um bravateiro. Pois saiba que o que lhe salvou foi ter ficado próximo ao fogo, que é uma das poucas coisas que estas criaturas temem.
- Godar, eles mataram todos os homens e crianças e raptaram as mulheres, não me resta mais nada aqui, quero ir com vocês.
- Somos guerreiros, apesar de respeitar sua coragem não posso levar um velho inválido conosco.
- Também sou um guerreiro e ainda me resta um braço bom, não sou inválido e tudo que peço é poder morrer com honra como meus ancestrais.
- Esta bem velho, que assim seja, mas você tem muito que aprender para combater estas criaturas. – E enquanto Hagnar fazia uma reverência em agradecimento, Godar já gritava para seus homens montarem.
À medida que os dias passavam, ironicamente os papéis se inverteram, agora era Hagnar que ouvia calado em torno da fogueira enquanto o jovem guerreiro lhe contava histórias sangrentas dos Homens-Lobos e ensinava como combatê-los:
“Os Filhos de Fenris são homens amaldiçoados, eles são meio homens e meio lobos, se transformam sempre que querem ou quando se sentem ameaçados. Viram bestas quase invencíveis de mais de três metros de altura, sua ferocidade só é comparável a sua capacidade de atacarem em bando. São nômades e vivem pouco tempo no mesmo lugar, não matam só para se alimentar e sentem prazer em dizimar aldeias inteiras. De tempos em tempos, seqüestram as mulheres e levam para seu covil, lá elas tem um destino pior que a morte, pois são usadas para reprodução ou verdadeiras orgias sexuais. Uma vez atacamos um covil e a cena de horror que vi era inimaginável, mulheres sendo sodomizadas por eles, alguns com aparência humana, outros semi-humanos, enquanto que vários faziam o ato completamente transformados nas vis criaturas que você viu. A grande maioria das mulheres eram dizimadas quando eles atingiam o clímax e as extirpavam com presas e garras, em meio a um horrendo espetáculo de sexo e selvageria.
Apesar de fortes, eles não são invencíveis. O fogo é a melhor arma, mas também é possível matá-los decepando suas cabeças ou trespassando seu coração. O golpe tem que ser certeiro, pois mesmo com membros decepados eles ainda continuam lutando. Esteja certo de uma coisa, você não irá lutar com animais e sim com demônios”.
Quanto mais tempo passavam juntos, mais o respeito mútuo crescia, Hagnar admirava a coragem do jovem guerreiro, enquanto Godar via que apesar de velho, Hagnar ainda possuía uma alma bárbara e indomável. Godar achava que iria morrer jovem em alguma batalha, mas se envelhecesse seria como Hagnar.
Borr, o melhor rastreador dos Guerreiros de Bronze que caminhava a frente dos cavaleiros, agachou-se e ficou vários minutos em silêncio observando o solo e a mata ao redor deles, fazia duas luas que eles seguiam os homens-lobos através da Floresta de Tilgrem. Subitamente Borr levantou-se e com um sorriso no rosto informou a Godar que a matilha estava a menos de uma hora de distância.
- A hora se aproxima meus irmãos, deixem os cavalos pois a partir de agora seguimos a pé – falou Godar enquanto tirava uma enorme lança que estava acondicionada na lateral da sela de sua montaria, gesto que foi automaticamente repetido por todos os guerreiros.
Depois de caminharem algum tempo, atingiram uma enorme clareira na mata, Godar fez sinal para os homens se aproximarem e rapidamente começaram os preparativos para o enfrentamento com os homens-lobos. Hagnar ficou impressionado com a organização e disciplina militar dos Guerreiros de Bronze, em absoluto silêncio, cada um parecia saber exatamente o que precisava fazer, viu eles se dividirem em grupos, alguns com as lanças, outros com grandes quantidades de óleo se afastavam e despejavam o material pelo chão formando um grande círculo. Quando as tarefas pareciam ter acabado se reuniram ao redor de uma pequena fogueira no centro da clareira.
Godar olhou para cada um dos guerreiros e disse que Hagnar, Telder e Borr ficariam com ele próximo a fogueira, os demais deviam tomar suas posições conforme haviam planejado. Após um breve silêncio, orientou Hagnar sobre os cuidados em sua primeira batalha com os Filhos de Fenris:
- Sei que você é um grande guerreiro Hagnar, por isso não vou lhe falar sobre honra e coragem, mas sim sobre o que você vai enfrentar. Eles irão atacar em seguida, ao cair da noite, virão em bando e tentarão nos cercar e atacar pelos flancos. Eles usam sua velocidade para surpreender, portanto não tente usar a espada de imediato, use a lança que vai estar ao seus pés. Lutaremos em dupla, eu e você, um de costas para o outro protegendo nossa retaguarda. Telder e Borr farão o mesmo. Não estaremos sozinhos, os outros guerreiros nos darão proteção.
Levantando sua espada, Godar gritou para os companheiros:
- Mais um dia feliz meus irmãos, pois só coisas boas nos esperam: a glória da vitória ou a honra de morrer em batalha com uma espada nas mãos. Que as Valquírias levem os que tombarem. – depois de também levantarem suas espadas entre gestos e gritos de alegria os homens tomaram seus lugares.
A noite chegou poucos momentos depois, trazendo consigo uma neblina densa. Sentados em torno da fogueira, os homens conversavam sentindo a tensão no ar. Os sons vindos da floresta foram diminuindo gradativamente até restar somente um silêncio mórbido e agourento. Godar murmurou uma praga ininteligível e pôs-se de pé enquanto dizia: é agora. E o inferno desceu sobre a terra.
Vindo de todas as direções, as feras surgiram entre as árvores correndo em uma velocidade impressionante de encontro a eles. Godar permaneceu imóvel por alguns segundos e subitamente levantou a mão direita, automaticamente flechas incandescentes cruzaram a noite encontrando o solo previamente coberto de óleo. As bestas foram engolfadas por um mar de fogo e flechas não paravam de ser lançadas pelos guerreiros posicionados estrategicamente nas árvores que contornavam a grande clareira. Os homens-lobos que haviam conseguido cruzar a armadilha a tempo uivavam ensandecidos ao ver que mais da metade de sua matilha havia sido dizimada. Os oito demônios que restavam estavam encurralados por uma muralha de fogo e direcionaram sua ferocidade para os quatro homens que os encaravam. Hagnar pensou que estavam condenados, mas rapidamente, o restante dos Guerreiros de Bronze, valendo-se de cordas, desceram rapidamente e se alinharam ao seu lado enquanto as feras aturdidas se agrupavam para iniciar o ataque. Segundos depois as bestas atacaram, duas foram empaladas pelas lanças, mas vários guerreiros não foram rápidos o suficiente e tombaram esquartejados ou até mesmo mortalmente feridos simplesmente pelo impacto daquelas grandes massas corporais. Mais uma investida aconteceu e Hagnar fez sua parte ao empalar um dos monstros, mas o ataque acarretou severas baixas para ambos os lados, Telder estava morto e Borr gravemente ferido. O último combate foi o mais sangrento, e quando tudo parecia perdido Godar fez a diferença. Empunhando suas duas espadas com uma habilidade inacreditável acabou sozinho com os dois últimos oponentes.
Após a sangrenta batalha, restaram somente Godar, Borr e Hagnar. Fizerem uma breve prece pelos guerreiros que morreram e seguiram em direção ao covil de Fenris.
- Temos que pegá-lo enquanto esta desprotegido, não podemos lhe dar a chance de criar outra matilha – disse Godar ao chegaram na entrada de uma caverna úmida e fétida.
Seguiram com cuidado, usando tochas para iluminar o caminho enquanto prosseguiam devagar. Fenris estava esperando, cercado por mulheres acorrentadas e que tinham no rosto a face da loucura e do desespero.
- Até que enfim Godar, hoje o destino vai decidir se o bem ou o mal irá triunfar. Esta noite será o fim para um de nossos clãs. – falou Fenris para surpresa e terror de Hagnar.
- Seu reinado de terror termina aqui demônio, fiz este juramento sobre o túmulo de meu pai.
- Seu pai falou palavras parecidas alguns anos atrás, pouco antes de eu experimentar sua carne e tirar sua vida. Não se esqueça que sou um deus, pobre homem tolo.
Os guerreiros atacaram, Hagnar decepou uma das mãos da fera antes de ser atirado longe. Borr, já enfraquecido pela perda de sangue mal conseguia segurar a espada e foi mortalmente ferido. Restaram Fenris e Godar lutando ferozmente, por mais de uma vez somente a incrível habilidade de Godar impediu que fosse destroçado e gradativamente Fenris foi sendo ferido, mas quanto mais durava a luta, mais cansado Godar ia ficando, suas forças estavam se esvaindo e num movimento rápido, Fenris agarrou Godar pelo pescoço e arrancou grande parte do seu ombro esquerdo com suas presas. Quando estava prestes a sucumbir, Borr, com as últimas forças que lhe restavam, veio em seu auxílio e cravou sua lança nas costas de Fenris, com o braço direito Godar atravessou o coração do demônio com sua espada e o viu cair a seus pés com surpresa no olhar.
- Me restam poucos momentos de vida Fenris, não sairei desta caverna mas minha missão esta cumprida. Hagnar vai matar todas as mulheres que levam suas sementes. – disse Godar enquanto agonizava.
Também agonizante, mas entre sorrisos diabólicos Fenris respondeu:
- Pobre Godar, tão tolo, também estou morrendo mas minha semente vai continuar e ainda mais forte, serão diferentes mas nunca deixarão de existir porque a decisão sobre o futuro dos Filhos de Fenris caberá aos homens. – disse Fenris enquanto fechava os olhos pela última vez.
- Hagnar, estou morrendo, jure que vai matar todas estas pobres mulheres e acabar com este mal sobre a terra. – falou Godar enquanto suas poucas forças se esvaiam.
- Eu juro Godar, este inferno acaba aqui. Pode acompanhar as Valquirias em paz. – falou Hagnar enquanto Godar dava seu último suspiro com sua espada na mão.
Hagnar matou todas as mulheres na caverna... Com exceção de uma que tentou mas não conseguiu. Mas como culpá-lo por esta fraqueza? Afinal, quantos pais teriam coragem de matar a própria filha?
E assim morreram os Filhos de Fenris... E assim nasceram os Lobisomens...
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