Ecos (maldição) 4/4
Mais uma noite sem dormir, as manifestações dessa casa são quase que diárias, alem das visões, estas mais raras, têm também os rangidos, passos e todos os clichês de filmes de terror, mas agora entendo que devo contar estas historias, não posso deixar esta energia assim “solta”, tenho que canaliza-la, um exorcismo aqui seria inútil, mesmo que estes rituais tenham o poder de dispersar energia, esta aqui esta muito enraizada, o único meio de quebrar esta maldição é deixar que se cumpra a vontade dos mortos, neste caso é Angélica e o Rapaz da vila. Mas como? Certamente ela foi carbonizada no incêndio, e o rapaz só Deus sabe o fim que teve.
Bom talvez dentro desta porta, na construção fora da casa, talvez este lugar me de respostas mais concretas... Isso é loucura, diz minha consciência que teima em manter a racionalidade, mas contrariando minha racionalidade eu quero seguir com este meu intento. Desde a minha infância sempre tive este perfil, quero resolver tudo, acabo tomando problemas que não me pertencem como sendo meus. Lógico que essa atitude me trouxe grandes prejuízos, mas é minha natureza, não é exatamente ajudar os outros, é mais ligado ao prazer de resolver problemas, meu analista me disse certa vez que isso se da ao fato de que eu prefiro resolver os problemas dos outros que os meus próprios. Daí eu parei de freqüentá-lo.
Estou bem menos assustado do que seria normal em uma situação dessas, em minha mente agora somente circula os pensamentos de que isso certamente irá provar de maneira contundente a minha teoria dos Ecos e da maldição, então percebo que estou mais ansioso que amedrontado, ainda divagar rumo em direção a porta semi-aberta que me convida a descobrir seus segredos.
Um ranger assustador se faz quando abro a porta, percebe-se que esta não é aberta a muito tempo, dentro as trevas dominam o lugar me deixando cego, me questiono de o por que não trouxe minha lanterna, e amaldiçôo o fato de ser obrigado a voltar para meu quarto para busca-la. Faço o trajeto de volta a casa rapidamente e quando entro uma surpresa! Esta tudo mudado o lugar não mais esta decadente, a cozinha esta equipada com instrumentos domésticos que mesmo sendo de uma época muito antiga, apenas o fogão a lenha permanece. Caminho com certo receio de que haja alguém na casa, mas assim que atravesso a cozinha tudo volta ao normal, agora creio que estou delirando.
Já no meu quarto, enquanto pego a lanterna escuto um terrível grito de dor do lado de fora da janela, quando olho por ela, vejo uma grande fogueira acesa e um homem de aproximadamente 20 anos nela queimando vejo uma freira desesperada lutando com os homens de batina que a seguram, fico paralisado observando a cena, não consigo me mover, vejo que finalmente o homem para de se mover de dor, estava morto mas ainda sim queimando, seu corpo já estava todo desfigurado, uma velha freira retira uma grande vara de aço da fogueira, posso perceber que a ponta desta vara tem o símbolo da cruz de São Pedro, ou cruz do demônio, o que vocês preferirem, o importante é que é uma cruz normal só que de cabeça para baixo. Um dos padres, o mais forte, rasga a parte superior do hábito da freira que chorava compulsivamente, fechei os olhos quando a velha freira que certamente é a tal Ivani, com os olhos fechados pude apenas ouvir os gritos desesperados da jovem, mas de repente os que eram apenas seus gritos, se tornaram os gritos de todos, quando abri os olhos, todos estavam sendo consumidos em chamas e logo este fogo se espalha pela mansão.
Recordo-me vagamente de ter corrido para me salvar do fogo, depois nada mais, devo ter caído das escadas, pois despertei com horríveis dores nas costas, e no meio da sala, agora já é dia e está tudo quieto, nada do pânico da ultima noite, me deixei levar pelas ilusões, me recomponho e mesmo mancando muito vou ate a parte de traz da casa, esta tudo como deixei ontem, mas a porta daquela construção ainda esta aberta.
Entro auxiliado pelo sol que ilumina o lugar, dentro posso ver uma serie de cadeiras velhas e destruídas, algumas queimadas, mais adiante vejo uma espécie de confessionário, mas nada que me ajude ate que mais um pouco, percebo dois vasos, vasos funerários, e em um posso ler o nome de Angélica e em outro o nome Augusto, quase que instintivamente percebo ser os restos mortais daqueles dois. Pego os vasos e levo para dentro da casa.
Não sei o que fazer para acabar com a maldição, estava muito machucado pela possível queda da noite anterior, meu corpo todo dói, eu volto para o quarto e coloco os vasos perto da cama, acabo adormecendo olhando para eles.
Acordo assustado, tremendo e suando, não me lembro de se tive um sonho mas mesmo depois de acordar ainda escuto a voz da garota repetindo: “Nós só queríamos ficarmos juntos!”
Começara a chover quando olhando pela janela vendo a chuva e sentindo o vento no meu rosto, eu com os dois vasos na mão, já desprovidos das tampas, solto suas cinzas ao vento e a chuva, vejo-as dançando no ar, juntas finalmente.
Bom não sei se deu certo, não sei se a maldição foi quebrada, pois já não suportava mais aquele lugar, peguei minhas coisas e partir para casa aquela tarde mesmo, e nunca mais quis saber se mais alguém se machucou naquele lugar, é estranho mas eu realmente sinto que foi uma grande sorte eu ter sobrevivido, é como que o lugar quisesse que eu narrasse sua historia, e é por isso que fiz esta espécie de diário de quando estava la, que é para não me esquecer do que passei naquela casa antiga e fedendo a mofo, agora tenho que começar a escrever esta historia... Para nunca mais esquecer dela!
FIM