Cê né bobo, né...?
Um emprego na fábrica de tecidos em Pitangui, naqueles anos sessenta, era visto como uma bênção, empoderando centenas de operários que faziam daquela hoje extinta instituição o templo de sua salvação e de suas famílias.
Malgrado as duras condições do trabalho, onde imperava rígida disciplina, elas vinham conjugadas com o status de se ter uma referência como a garantia do salário regular, ainda que se atrasasse, um nome na praça, a fiúza dos negociantes, filhos estudando além do primário, e de cousas boas quase um rosário.
Manuel e Tonho que tinham chegado da roça, mocetões ladinos, sacudidos, saudáveis, com escassa escolaridade que mal dava para rabiscar suas assinaturas conseguiram a graça do emprego.
De seu primeiro salário, o Tonho correu na loja do Calisturco e das mãos de sua formosa e sedutora filha Nilza, comprou o seu Lanco, de pulso, com 17 rubis. Uma beleza gerada de outra. E totalmente sua.
No seu dia inaugural da nova peça, foi abordado pelo inseparável Manuel que após a elogiosa observação, lascou a indefectível pergunta:
- Reloj novo, sô...qui hora cê tem aí?
Ao que, pego de surpresa, Tonho não se embaraçou e virando aquela luminosidade para o companheiro não perdou:
- Ispia aí, cê né bobo, né...?
E a tréplica:
- Fica bobo aí...