O Combatente

Tenho dor... Terrível dor e agonia de morte! O sangue escorre por minhas feridas e em minhas roupas nota-se (mesmo para o pior observador) a vermelhidão do meu sangue. E em meio a tanto sangue consigo ver com perfeição o estrago causado pela bala que me levou a tal estado. E em meus olhos pode-se notar a tristeza e a aflição que sinto em estar aqui.

Acredite, sinto a morte me sondar a cada momento que se passa, ouço as batidas do meu coração cada vez mais fraco. Os passos da morte estão vindo ao meu encontro... Ela está cada vez mais perto. Na minha frente está tudo cinza, a poeira paira no ar, não consigo mais ver meus companheiros. Oh meu Deus, quanta aflição! Quantas mortes! Quanta dor! O mundo está em guerra... Os aviões voam lançando armas de destruição em massa, mais parecidas com trovões que caem do céu, armas estas que são capazes de destruir cidades, até mesmo países, armas que conseguem levar o corpo humano ao nada em míseros milésimos de segundos.

E as colunas de fumaças estendem-se onipotentes no horizonte. São tão altas... Gigantescos obeliscos escuros. Já consigo ver o que nunca desejara ter visto antes, corpos estendidos no chão, muitos em pedaços, com seus órgãos internos expostos. Não sei mais o que sinto, meu corpo treme ao me deparar com essa situação. O céu entrou em desastroso breu e as trincheiras são despedaçadas por várias explosões de granadas. Vejo rios de sangue de meus companheiros a escorrer por entre meu corpo. Não consigo me mover, me esforço ao máximo, mas os meus membros não respondem. Sinto o rifle que carrego pesando cada vez mais sobre o meu peito, impedindo assim que o ar paire por meus pulmões... O suor frio começa a descer sobre o meu rosto.

E o sangue que escorre começa a coagular. O cheiro está forte, um cheiro forte de ferro. E a podridão dos corpos em putrefação invade completamente minhas narinas. E o calor da areia se sobrepõe a tudo que sinto. Um calor ardente e mortal. E tudo se tornou em um silêncio obscuro e tenebroso. E nem mais os tiros, as explosões, os gritos... Nada mais ouço... E as moscas sobrevoam os corpos e a mim mesmo. E o soar de suas asas ecoam por meus ouvidos, solenes e sublimes. Larvas são depositadas por elas. E as sombras dos abutres – oh enormes e famintos abutres – pairam sobre minha visão. E muitos deles pousam e colocam-se a comer os corpos.

Vejo vultos... São ágeis. Tão rápido quanto o bote de uma serpente. Ouço algo que mais se parece carne sendo rasgada, despedaçada, retalhada. Algo se aproxima... Sinto a respiração ofegante de uma fera se aproximando... Um hálito quente e horrendo. Ouço risadas... Seria o deboche da própria morte? Sinto medo... Não consigo olhar na direção da fera. Minha respiração fica ofegante, um goto seco desce por minha garganta. Uma terrível hiena se posiciona à frente sorrindo.

E mais a minha frente outra fera se aproxima de maneira sutil e cautelosa. E a aflição invade meu corpo. Aflição por não me defender do ataque iminente... Desato um grito horrendo tentando afugentar os monstros. Eles recuam... Parecem terem se assustado com o grito. Mas minha tentativa deu errado, pois chamou a atenção das outras que estavam dilacerando os corpos dos outros combatentes. E elas surgiram como mensageiras da morte, com um olhar demoníaco e sorriso escarnecido. Os pelos em pé salpicados de sangue. E as garras afiadas como lâminas de aço.

De repente d’um salto súbito as bestas iniciam seu ataque. Sinto a cada instante as presas destroçarem meu corpo. Como facas perfurando-me. E meus gritos de horror e dor de nada mais servem. Chicotes de sangue saltam do meu corpo. E o frio intenso percorre cada centímetro de carne que ainda me resta. E a dor diabólica se alastra como terrível pestilência. E aos poucos sinto meu coração desfalecer. E minha visão escurece gradativamente. E em minha última visão vejo as faces daquilo que me destruíra...

Eduardo Fonseca e Lindomar Mota Silva
Enviado por Eduardo Fonseca em 20/12/2015
Código do texto: T5486476
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