A Suicida

Todas as noites eram iguais. Antes de dormir Márcia olhava pela janela e conferia a bela vista que sua casa tinha. A beira de uma baía de areia branca estava a pequena choupana de onde era possível ver o mar, ora revoltoso ora calmo, e o enorme rochedo do outro lado da praia.

Em uma noite calma e fria, Márcia olhou pela sua janela e avistou alguém em cima do rochedo. Na beira do precipício, uma mulher de cabelos ruivos e soltos, trajando um vestido branco aparecia e ficava por alguns minutos olhando para o mar. O vento ondulava seu vestido que parecia ter vida própria.

Então a mulher abriu seus braços e pulou para dentro da água conhecida por ser rasa e cheia de pedras. A morte era certa naquelas águas geladas.

Em desespero, Márcia ligou para os policiais que vasculharam o local por toda a manhã e não encontraram o corpo. Com certeza ela não teria sobrevivido à queda, mas não foi encontrada. Na outra madrugada ela pegou-se observando a paisagem e refletindo sobre a suicida da noite anterior e para a sua surpresa o espetáculo terrível começou de novo.

A mesma mulher com seus cabelos vermelhos que contrastam com a noite, com seu mesmo ritual de salto ao mar revoltoso . Desta vez Márcia observou se ela sairia das águas, mas era impossível sobreviver àquilo.

Por quatro dias Márcia procurou não olhar pela janela quando anoitecia, mas agora ela se vê ansiosa observando mais uma vez o show macabro. Por cinco longos anos a rotina não mudara. Todos os dias ela vê a mulher chegando na encosta e saltando de encontro à inevitável morte.

Esta noite Márcia já esperava o anoitecer sentada na cadeira que colocara na frente da janela. Parecia um camarote para a terrível cena de suicídio que se repetia todos os dias. Quando a mulher chegou, Márcia sentiu a expectativa crescer dentro dela, por pouco não aplaudira sua entrada. Porém neste dia o ritual mudou. Antes de se jogar ela apontou para a casa em direção à espectadora que sentiu seu coração gelar.

Aos poucos a sanidade da mulher se desfez. A vontade era de gritar de medo, mas ela preferiu descer da cadeira e ficar a noite inteira chorando no chão frio.

No outro dia Márcia não aguentou. Quando faltava pouco para anoitecer ela foi até o penhasco. Sentou-se em uma pedra e esperou a escuridão chegar.

Com a vinda da noite também veio a mulher. Ela era linda. Seu vestido quase transparente mal escondia seu corpo perfeito. Márcia se levantou e esperou ela se aproximar. A misteriosa mulher se aproximou lentamente como se tivesse adorando aquele momento. Seus rostos quase se tocaram e então a ruiva colocou as mãos sobre os ombros da visitante e a beijou. Márcia sentiu uma onda de calor vindo dela. Não queria parar o beijo mas foi interrompida pela outra parte.

A mulher ruiva deu sorriso. Segurou as mãos de Márcia e a empurrou penhasco abaixo de encontro com a morte certa.