DANDO PÉROLAS AOS PORCOS
Um jipe branco 4x4 estacionou na entrada do sítio e dele saiu um homem batendo palmas. O cachorro ficou latindo, enquanto Edvaldo levantou da rede e caminhou até a varanda para receber a visita. Ele vivia ali desde que tinha nascido com a esposa e seus três filhos. A vida no interior era simples e sem luxos; uma vida dura e de muito trabalho, mas da qual tinha muito orgulho e satisfação.
- Bom dia.
- Bom dia. Você é Edvaldo José da Conceição? - O homem perguntou, conferindo um papel preso em uma prancheta.
- Sim, sou eu mesmo.
- Eu sou o novo fiscal da Secretária da Agricultura da região e vim fazer uma inspeção na sua propriedade.
- O senhor pode ficar a vontade. Pode olhar tudo que quiser.
- Muito obrigado, não vai demorar. Você pode me acompanhar?
- Sim senhor.
O fiscal andou por todo o sítio para checar como estavam as coisas, anotando tudo em um caderno e fazendo diversas perguntas para Edvaldo.
- Como você alimenta seus porcos? - O fiscal perguntou, quando passavam pelo chiqueiro.
- Eu alimento eles com lavagem. - Edivaldo respondeu com tranqüilidade.
- Mas homem! Como é que você faz isso com os bichos? Você têm que alimentá-los com uma ração apropriada; eles são destinados para consumo humano...
- Eu sei, senhor. Mas por aqui quase ninguém faz isso; o frigorífico paga muito pouco para a gente... - Edvaldo tentou se justificar.
- Isso não é problema meu. Infelizmente eu vou ter que multá-lo em cem reais... - O fiscal anunciou com rispidez, entregando-lhe uma notificação.
Edvaldo pegou a multa e guardou-a com irritação no bolso da calça.
- Por coincidência, o meu irmão vende uma ração para suínos de ótima qualidade. Quando for até à cidade procure-o, aqui está o cartão dele...
- Obrigado...
- Daqui a três meses eu vou retornar para uma nova inspeção. Não esqueça de fazer os reparos que solicitei. Até mais. - O fiscal observou, despedindo-se.
No prazo combinado o fiscal voltou. Juntamente com Edvaldo, ele checou todo o sitio novamente.
- E então, homem, está alimentando seus porcos de maneira diferente? - O fiscal perguntou, quando passavam pelos suínos.
- Já, sim. Agora estou dando para eles milho, feijão, abóbora, essas coisas... - Edvaldo respondeu.
- Mas homem! Como é que você faz isso com tanta gente passando fome?
- Mas eu não sou culpado disso... – Edvaldo tentou se justificar.
- Você não tem a mínima consciência social mesmo! Você não vê que ao comprar ração, ajuda a movimentar o comércio, a indústria e a gerar empregos?
- Eu sei, mas essas coisas que eu dou para eles, eu tiro do próprio sítio...
- Todos esses alimentos poderiam estar sendo doados para alguma ONG ou alguma casa de caridade... Eu já falei para você ir procurar o meu irmão, mas você é teimoso! Infelizmente, dessa vez eu vou ter que multá-lo em duzentos reais! - O fiscal anunciou com rispidez, entregando-lhe uma nova notificação.
Edvaldo pegou a multa e, por um instante, ficou olhando para aquele pedaço de papel azul, sem dizer nada; em seguida dobrou-o e guardou-o no bolso, com ar contrariado.
- Voltarei daqui a quatro meses. Até mais. - O fiscal se despediu, montou no jipe e partiu, deixando atrás de si um rastro de poeira, naquele dia quente e seco.
No prazo combinado o fiscal voltou. Juntamente com Edvaldo, ele checou todo o sitio.
- E então, homem, está alimentando seus porcos de maneira correta? - O fiscal perguntou novamente, quando passavam pelos suínos.
- Sim, estou. - Edvaldo respondeu displicente, com um cigarro no canto da boca.
- Você comprou a ração do meu irmão?
- Não, não comprei.
- Então eu posso saber o que você está dando para seus porcos agora? - O fiscal perguntou, sem entender.
- Olha meu senhor, agora eu estou dando um ticket-refeição de dez reais para cada um deles, para eles comerem o que quiserem e assim a fiscalização não poder mais encher o meu saco!