Projeto Viagem Astral - RETORNO
Anos se passaram. Tinha até me esquecido desses eventos e essas “viagens astrais” já estavam devidamente racionalizadas como meros sonhos ou pesadelos. Até que um dia, numa conversa com o pessoal da faculdade, galerinha meio alternativa e tal, esse assunto de desdobramento veio à tona. Como um click, aquilo reativou a minha curiosidade.
Acabei voltando a ler o material relacionado ao assunto, técnicas de como fazer, tentei por vários dias, mas nenhum resultado.
Já tinha desistido disso. Deixei de lado e fui cuidar das minhas coisas. Estava procurando algo de interessante para ler quando me deparei com o assunto “Ufologia espiritual”. Gargalhei, pois aquilo não poderia ser minimamente sério. Deveria ser uma piada, pegadinha ou algo do tipo. Desliguei o PC e fui dormir.
Aquela velha sensação voltou novamente: relaxamento, vibração, expansão, sintonizando o rádio e, finalmente, imagem.
Acho que foi a falta de prática. Com tanto tempo sem fazer aquilo, fiquei vagando por aí. Fui bater numa região com vários bares, muitos grupos de “fantasmas errantes” vagando por entre eles. Eram grupos de três a cinco. Eles vinham, se aproximavam e me chamavam para beber. Eles tinham um aspecto meio encardido, tinham um leve brilho marrom acinzentado ao redor deles. O problema era que, quando eles chegavam muito perto, eu começava a vomitar uma gosma laranja, sentia um forte dor de cabeça e ficava meio grogue, com um cheiro muito forte de cachaça. Comecei a fugir deles, porque aquilo me afetava muito! Até que vi as estrelas começarem a se movimentar, percebi que não eram estrelas, eram outra coisa...
É complicado escrever sobre isso. Principalmente porque só me lembro de fragmentos. Esse é um desses casos.
De repente, estava em cima de algo semelhante a uma cama, uma maca de hospital, eu acho. Estava muito frio. Minha visão ainda estava turva. Tentava me mover, mas sentia que meus braços e as minhas pernas estavam imobilizados. Tentava levantar a cabeça para ter uma melhor noção do entorno, mas ela também estava presa.
Meu coração acelerou. O que diabos seria aquilo!? Debati-me naquela estranha cama tentando desesperadamente sair. Vi vultos que talvez fossem médicos. Como eu fui parar ali?! Que tipo de hospital seria esse?
Um pensamento passou pela minha cabeça. Quase como se uma voz ecoasse dela:
“Calma. Está tudo bem. ”
Fiquei em dúvida se aquilo teria sido um pensamento meu ou se alguém teria me dito aquilo.
Comecei a gritar desesperadamente. Seria aquilo um pesadelo? Estou louco e fui internado em um hospício? Meus movimentos são emitiam som algum. Tentava gritar, mas parecia que tinha algo na minha garganta, no lado de fora. Sentia o ar sair, mas nada do som. Aquilo me deixava ainda mais angustiado.
Para piorar, senti um líquido escorrer por minhas costas, aquilo parecia subir por minhas pernas, braços, tronco e pescoço. Aquele líquido gélido, em vez de simplesmente escorrer, estava subindo por meu corpo, adentrando minhas cavidades. Sentia-me como um objeto sem vontade própria. Esse líquido subiu até o meu rosto, por mais que eu fechasse a boca e os olhos, eu senti aquilo escorrer para dentro. Meus olhos ardiam como se estivesse pingado aqueles colírios que são usados para dilatar a pupila. Quando aquilo entrou na minha boca e nariz, tentei tossir e espirrar, mas aquilo continuava seguindo impetuosamente.
Não conseguia mais respirar. Esse maldito líquido chegou nos meus pulmões. Senti um ardor insuportável, como se meus pulmões fossem um cigarro em brasa a ser aspirado. Achei que ia morrer.
“Calma. Está quase acabando. ”
Aquilo ecoou novamente na minha mente. Os vultos continuavam a me observar ali, eu podia sentir a presença deles. Continuava sem conseguir respirar.
“Merda, eu vou morrer! ”
Meu corpo foi tomado por uma série de espasmos musculares. Acho que estava tendo uma convulsão. Tentei respirar novamente, mais uma vez, e percebi que iria desmaiar. Tinha certeza que se desmaiasse eu não iria sobreviver. Acho que agora eu sei como deve ser morrer afogado.
Finalmente consegui respirar novamente. Abri meus olhos e vi com uma clareza extrema, melhor do que se eu estivesse com as minhas lentes de contato. Senti-me diferente, leve, ágil. Salto de um pulo da tal maca. Nada mais me prendia.
Eram duas “pessoas” que estavam ali comigo. Seus traços eram tipicamente humanos, talvez com os olhos mais afastados um do outro, uma testa mais alongada e um nariz mais fino, mas se passariam perfeitamente por pessoas normais. Eram esguios, altos. Um homem e uma mulher, ambos de cabelos longos. Ambos vestindo uma roupa justa ao corpo, uma peça única, verde bem claro, quase branco, que ia dos pés até o pescoço que envolvia completamente seus braços e mãos.
“Sou Adélia” Disse a mulher. Seus cabelos eram loiros, quase brancos. Olhos azuis-escuros, por um instante me perdi neles. A íris era dinâmica, a cor variava entre diferentes tons de azuis escuros nas bordas de um azul celeste no centro. Nunca tinha visto aquilo antes.
“Desculpe pelo incômodo. Faz tempo que você buscava por nós. Finalmente conseguimos te achar”.
Eu mal pensava nas perguntas e ela seguia me dando as respostas.
“Seja bem-vindo a bordo. Esse procedimento foi necessário como Controle de Risco Biopsíquico. ”
Quê?!
“Estamos te protegendo e nos protegendo. Somos de mundos diferentes e distantes, mas nosso material genético é muito semelhante. Creio que possa haver um risco biológico considerável se não nos protegermos mutualmente. ”
Por um instante passou por minha mente as epidemias que os indígenas tiveram quando entraram em contato com os europeus. Milhares de indígenas morreram de gripe e outras doenças que não eram tão mortíferas assim na Europa.
“Você estava com uma quantidade enorme dos mais diferentes parasitas bio-etéreos! Tivemos que fazer uma limpeza profunda. Desculpe pelo incômodo, mas lhe fizemos um grande favor. Havia inclusive dispositivos energéticos que estavam desviando e restringindo o fluxo dos seus chacras principais. Com o tempo, isso levaria à demência, alguma doença cardíaca ou, eventualmente, ao desencarne precoce.”
Não sabia o que dizer. De repente, senti uma leve lufada de ar frio passando por meu corpo e vi que eu estava com um macacão semelhante ao deles, só que com uma cor laranja fluorescente, com vários fios amarelos percorrendo o meu corpo, como se fossem veias e artérias.
“Não se preocupe. Isso servirá como vestimenta enquanto você estiver conosco nessa nave. Essa roupa está reorganizando o seu fluxo biopsíquico. ”
Desconfiado, olhei minhas mãos, braços e tronco. Depois, olhei ao redor. Estava numa sala completamente branca com um aro dourado flutuante próximo ao teto. Nenhum sinal da cama ou maca onde eu estava deitado.
Fiquei assustado. Afinal, aquilo seria real?
“Sou Graham” o homem tomou a frente, se aproximando de mim. Sua pele era um pouco mais morena, com sardas próximo à testa. Seu cabelo era castanho, longo, semelhante ao de Adélia.
Seus olhos eram de um castanho tão claro que eram quase amarelados. Uma cor âmbar, de íris também dinâmica. Involuntariamente me senti mais tranquilo, embora não pudesse explicar a razão.
“Como pode notar, os ambientes aqui são dinâmicos. Imagino que esteja perturbado, mas com o tempo você se acostuma. Aliás, isso tudo é bem real. Mas no final você poderá escolher entre se lembrar ou não de tudo o que aconteceu. ” Ao finalizar essa frase, percebi um leve sorriso no canto de seus finos lábios. O que aquilo significaria de fato?
Acordei. Eram cinco da manhã e eu estava cheio de energia. Estranhei aquele sonho, mas eu nunca tinha me sentido tão bem na minha vida!