300.000 A.C

A noite avançava e a planície estava silenciosa. O clima era frio e as criaturas dormiam amontoadas ao pé de um conjunto de grandes rochas. Aquela formação de pedras fornecia uma proteção natural contra os grandes predadores que infestavam a região. Já tinha algum tempo que nenhum deles era morto e isso tornava o grupo mais confiante.

Peludo acordou subitamente. Sua barriga roncava de fome. Há muito tempo que ele não sabia o que era estar plenamente saciado. Muitos dias já haviam se passado desde a ultima vez que tinha se alimentado dignamente. Nunca havia alimento suficiente para todos e mais de uma vez teve que brigar com alguém por um pouco de comida.

Tentou dormir novamente, mas foi em vão. Ficou sentado olhando as outras criaturas do seu bando que dormiam pesadamente. Seus olhos pousaram sobre Dentes Brancos que dormia ao lado de Braço Longo. Peludo não tinha nenhuma fêmea, nunca conseguira isso. Ele era menor e mais fraco que os outros machos e isso o deixava em grande desvantagem... Será que algum dia ele conseguiria uma fêmea para si?

Estava pensando sobre isso quando divisou ao longe um clarão azulado e avermelhado. Levantou-se assustado e cautelosamente subiu em uma pequena pedra para observar melhor. O que seus olhos viram foi um espetáculo de relâmpagos que logo se encerrou.

Tentou voltar a dormir, mas a curiosidade sobre os relâmpagos coloridos não lhe saia do pensamento. Resolveu ir até onde imaginava que tinham caído as luzes, não era longe de onde ele estava. Era perigoso, mas resolveu arriscar.

Esgueirando-se cautelosamente não precisou andar muito até encontrar aquilo que pensava ser o lugar onde o raio tinha caído. A luz da lua ajudava-lhe a ver que uma árvore havia sido calcinada bem perto de um pequeno buraco. Peludo sentiu a terra ainda quente embaixo dos seus pés. Isso o assustou, mas não a ponto de deixá-lo com medo. Medo de verdade ele sentiu quando teve que se jogar desesperadamente nas águas geladas de um rio para escapar de um grande felino.

Alguma coisa brilhava no fundo do buraco. Peludo achou bonito o brilho que emanava. Pensou em ir acordar alguns companheiros para juntos investigarem melhor o ocorrido. Não, ele não faria isso. Decidiu que não chamaria ninguém. Ele passava a maior parte do tempo sozinho, porque agora teria que ter alguém com ele?

O buraco não era fundo e Peludo desceu rapidamente ele.

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O que ele trouxe lá de dentro era completamente diferente de tudo o que já tinha visto. O objeto era pequeno e cabia na palma de sua mão. Peludo ficou admirando a maciez e a textura daquilo. Ele tinha a cor azul escura semelhante a várias flores que ele comia quando estava com muita fome. Achou ele bonito e sentiu que era bom ficar tocando nele.

Decidiu voltar rapidamente para as pedras onde o seu bando estava. Era bom não abusar da sorte. Levou consigo o pequeno objeto.

Peludo não conseguiu dormir mais e mal o dia amanheceu tratou logo de esconder o objeto em uma pequena moita. Algo lhe dizia que não deveria mostrar para ninguém do bando, pois alguém poderia tomar-lhe.

Assim que conseguiu ficar sozinho dirigiu-se até onde tinha escondido o objeto misterioso. A curiosidade era imensa. Sentia-se estranhamente mais forte e corajoso. Dentre tantos ele é que tinha achado a coisa que brilhava e isso lhe propiciava uma sensação boa.

Novamente aquela coisa estava em suas mãos. Agora com o dia claro achou aquilo mais bonito ainda. Experimentou cheirar, mas não sentiu cheiro de nada. Mordeu fortemente a um ponto que seus dentes deixaram marcas na coisa, sentiu que não tinha gosto de nada que conhecesse.

Peludo revirava o objeto de varias maneiras. Terminou observando que ele possuía um lado cheio de pequenas coisas coloridas e do outro nada havia.

Seus dedos grossos e desajeitados esfregavam o estranho objeto quando subitamente sumiram as coisas coloridas e em seu lugar surgiram imagens. Ele se assustou e deixou cair o objeto. Agachou-se para olhar melhor e se surpreendeu quando apareceram imagens de árvores e montanhas. A estupefação maior veio quando, logo em seguida surgiu a imagem de seres muito parecidos com ele, só que sem os pelos e com coisas em cima do corpo que ele não sabia dizer o que era.

Um misto de curiosidade, prazer e poder lhe assomavam. Os dias passavam e Peludo cada vez descobria novas coisas no estranho objeto, nada do que via ele entendia, mas isso não tirava o seu encantamento.

Após algum tempo Peludo notou com profundo desgosto que a coisa não emitia mais luzes. Revirou de todo jeito o objeto e nada das luzes e imagens voltarem. Ele nunca mais veria as estranhas maravilhas que tantas sensações lhe despertaram.

Com tristeza concluiu que aquilo deveria estar morto.

Peludo voltou ao lugar onde havia encontrado a coisa e cuidadosamente a deixou no mesmo buraco.

Estranhamente ele se sentia mais forte e capaz. Olhou para trás apenas uma vez e foi embora.

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O homem de cabelos brancos e desgrenhados respirou aliviado quando viu que na capsula, batizada de “arca do Tempo”, o objeto por ele enviado estava de volta. Ele foi de uma terrível irresponsabilidade quando, sem autorização da equipe e quebrando os protocolos de segurança, decidiu enviar de volta no tempo o seu celular.

Com surpresa viu que este tinha uma marca de mordida.

Jota Alves
Enviado por Jota Alves em 26/04/2020
Código do texto: T6929313
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