O Capitão Barbosa e o chimuti

O CAPITÃO BARBOSA E O CHIMUTI
Miguel Carqueija

Acompanhado por seu imediato Zé Peroba, o Capitão Barbosa caminhava célere por um dos corredores de Heliópolis, a estação interplanetária situada para além da nuvem de Oort e que era frequentada por diversas raças cósmicas.
Barbosa estava apressado, pois queria ir numa feira de mangás e animês que funcionava no nível 6. Em poucas horas teria de retornar à Terra.
De repente, pelo corredor em que ele seguia, vieram pela direção oposta dois sujeitos altos, escaniçados e ostentando antenas flexíveis. Era dois chimutis, do planeta Chimutino, e por seus uniformes e insígnias dava para perceber que um deles era capitão e o outro imediato — portanto as mesmas categorias de Barbosa e Zé Peroba.
Eles estacaram, todos os quatro, bem defronte uns dos outros.
Surgiu um impasse: os terrestres seguiam pela direita, como é hábito na Terra; os chibutis, porém, como é hábito em seu planeta, seguiam pela esquerda.
— Droga! Outra vez problemas entre a esquerda e a direita! — resmungou o Capitão Barbosa.
— Choputiski Ypikusti! — falou o capitão chimuti, em tom bem arrogante.
— Prezado senhor, a direita é minha — respondeu Barbosa com firmeza.
— Mahulinski oritopis! Chopiltiski ypikasti, alolei matinsky!
— Impossível! Pelas regras do meu planeta, nós temos direito à direita!
— Prahatús pajutios! Hinski! Hinski!
— Capitão — arriscou timidamente o Zé Peroba — o senhor está entendendo alguma coisa?
— Bulufas! Mas não é por isso que eu vou entregar os pontos!
O imediato chimuti segredou qualquer coisa ao seu capitão, que deu de ombros.
— Prezado senhor — insistiu Barbosa — o senhor tem que nos ceder a direita.
— Capitão — interveio o Zé Peroba, enquanto os outros dois confabulavam — todo mundo está contornando a gente, sem ligar...
— Cala a boca, Zé Peroba! Quando eu precisar da sua opinião eu peço! E o senhor, comandante chimuti, não vai querer criar um incidente interplanetário! Além do mais eu não vou querer perder a feira de mangás e animês!
— Abdul ormatininski paafraim! Yhikut! Ypahust!
— Ypahust para você também! Faça o favor de nos ceder a direita!
— Lebrankoviski bestakoviski! Lolabrapia nujolinski! Alalá! Alalá!
— Não tem nada lá, não! Vamos resolver é aqui!
— Capitão Barbosa — e o Zé Peroba ousou tocar-lhe o pulso — esse pessoal usa a esquerda, alguém vai ter que ceder!
— Pois que não seja eu! A honra da Terra está em jogo!
— Mas se nós demorarmos muito não teremos tempo para ir na feira dos mangás!
Diante de argumento tão convincente, o Capitão Barbosa parou e refletiu por bem uns dois segundos.
— Bem, bem... ora, para não dizerem que eu sou radical e intransigente, capaz até de causar um incidente interplanetário por causa de uma ninharia, abrirei mão do meu direito à direita e a pecha de intransigente ficará com esse nosso amigo. Peroba, como diz o leão da montanha, saída pela esquerda!
Zé Peroba deu um suspiro de alívio. O que eles não perceberam foi que os dois alienígenas também haviam confabulado rapidamente, pois o motel aonde ia o capitão chimuti tinha hora para fechar, e ele por sua vez patrioticamente e também apressadamente abriu mão da esquerda.
Os quatro se chocaram.


Rio de Janeiro, 19 de julho a 4 de agosto de 2019.



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