A meretriz
"Certeza, que gastará todos os seus créditos com isto?" Olhava para a vitrine, holográfica, acompanhado do companheiro, que se comunicava comigo por telepatia.
"Sim por que não?" Nossa vida é muito monótona, e esta experiência é a maior constatação que um colono como nós poderia sentir.
"Pense bem, com tantos créditos, você poderia fazer um upgrade em todo o seu funcionamento." O companheiro de trabalho olhava para a escolha do amigo e ficava sem ação com tanta loucura em uma só pessoa.
"Olhe x89Z um sistema nervoso sintetizado, custa este valor de crédito, te trará vitalidade para mais uns 200 anos de vida. Ou você pode trocar seu sistema ósseo com este montante."
Comentavam, repassando na vitrine, os maiores valores possíveis de se escolher em meio aquela loja virtual.
No entanto, x89Z estava disposto a deixar nem que fosse por uma infema hora a sua androgenia.
Existia nele uma obsessão em história antiga, quase arcaica, onde os colonos eram seres humanos, sendo estes homens e mulheres. Hoje neste novo planeta Terra, há somente colonos, seres melhorados para suportar o gás amoníaco, que se formou através da salinização.
No entanto, foram muitos dias de árduo trabalho na mina de extração de metal, tão importante para manter aquela colonia submersa entre aquele gás sufocante.
Todos os dias trabalhados, o que mantinha x89Z animado, era a suas pesquisas pela neuronet. Em todos os momentos de descanso, passava procurando, vestígios do passado, onde ainda existia o gênero feminino e o gênero masculino.
Quando ia dormir, olhava na sua redoma, tentando se imaginar com aquele corpo arcaico, onde a clorofila epidermal não existia, logo não seria verde. E tal constatação o fascinava. Teria uma genitária, coisa desnecessária para o seu corpo, com balanço de massa perfeito, ou seja, tudo reaproveitado, sem saída de nada.
No outro dia, ao termino do trabalho, voltou para ver quanto de crédito ganhara. O seu companheiro de trabalho, que dividia a redoma de vidro, onde hibernavam por 2 horas naquele ciclo diário de 36 horas, tentava em vão tirar a ideia bizarra do companheiro.
"Faltam somente 8% de crédito para eu finalmente adquirir uma Meretriz" Com aquele percentual, x89Z poderia reservar, e passar para o próximo passo: A entrevista.
"Pense bem é muita loucura, dispor de tanto crédito para uma horinha em um espaço tempo que você nem imagina o que é! Seja sensato, compre este coração sintético, te trará mais 120 anos de vida, e te deixará apto, para fazer, maiores esforços na mina, logo, você poderá dobrar os seus créditos! Use o bom senso!"
Olhava para aquele colono, igual a mim, olhava ao meu aderredor, todos ocupados fazendo afazeres naquela prisão, chamado sobrevivência.
Entendia perfeitamente, o que o meu colega de redoma dizia, realmente, era muito absurdo, disperdiçar tanto crédito com um disparate daquele.
Em certo momento de trabalho, na Mina, eu tive a curiosidade de lhe abordar por telepatia. Olhei para ele e comecei a perguntar.
"Você já tomou consciência do gênero homem e mulher?"
Meu companheiro de redoma, continuava retirar mais um pedaço daquele metal, e colocar na esteira, enquanto se comunicávamos.
" Sim, por curiosidade entrei em arquivos proibidos, e observei como eram os seres humanos pré históricos, isto foi a muito tempo atrás, hoje não precisamos mais de reproduzirmos, afinal podemos sintetizar partes do nosso corpo e com o tempo fazermos as trocas".
Dava uma pausa no trabalho, não deveria, poderia ser punido, todavia, precisava tirar aquela ideia absurda do seu companheiro de redoma.
"Isto beira ao bizarro, tentar querer buscar algo desnecessário, esqueça disto e faça a compra sensata, isto que você esta querendo somente ganhadores da loteria podem ter."
Ao retornar do subsolo, voltei a acessar a vitrine holográfica, observei que já estava marcada a entrevista. Poderia finalmente fazer o que tanto queria.
— Escolher um gênero e buscar uma Meretriz.
...
Leia aqui a: Segunda parte
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