Cidade Morta

[Continuação de "Grupo Avançado"]

A bordo do imenso helicóptero militar que nos transportava de Phoimoiré, na costa, até a cidade insular de Eycaster, eu, Jana, Martim e Susana, trocamos nossas últimas impressões sobre a missão que nos aguardava.

- Não gostei do modo como nos trataram - admitiu Martim. - Os militares quase sempre são condescendentes com civis, mas estes pareciam estar rindo de nós pelas costas.

- Não foi impressão - redarguiu Jana friamente. - Ouvi alguns comentários de passagem, que me fazem pensar que estamos entrando numa fria.

- Que espécie de... comentários? - Indagou Susana apreensiva.

- Algo sobre iscas de pesca... do tipo que se debate e chama a atenção dos peixes - prosseguiu Jana, expressão fechada.

- As duas unidades ADA, pelo menos são novas? - Inquiriu Martim.

- Não sei... não foram apresentadas antes do embarque - repliquei. - Devem estar junto com a carga.

- Por onde vamos começar? - Susana parecia querer mudar o rumo da conversa.

- Vamos descer no heliponto do Complexo Hospitalar Berceaumès - declarei. - Sugiro que façamos a verificação do local seguro e comecemos imediatamente o trabalho. Pelo tempo local...

Consultei meu relógio de pulso.

- ... ainda teremos seis horas de luz do dia. As unidades ADA guardam o perímetro durante a noite, e ao amanhecer retomamos a avaliação.

- Certo - acedeu Susana.

- OK, por mim - concordou Martim.

- Quanto antes começarmos, melhor - Jana deu de ombros.

O piloto do helicóptero nos avisou que estávamos descendo para as coordenadas de pouso. Vista dali, a cidade era muito mais impressionante do que nas imagens aéreas dos drones militares. E, daquela altura, as carcaças enferrujadas de automóveis que enchiam as ruas, davam-lhes um simulacro de movimento.

- Que espécie de arma usaram aqui? - Indagou Susana. - As construções não parecem ter sido muito atingidas...

- Acho que pretendiam reutilizar a cidade... da mesma forma que nós - repliquei. - Mas os militares não nos informaram o que aconteceu aqui; apenas, que a população foi... desintegrada.

- Sem afetar os prédios? - Insistiu Susana, intrigada.

- É uma tecnologia de que não dispomos - avaliou Martim. - E, pensando bem, é melhor que não a tenhamos mesmo.

- Vejam a coisa pelo lado bom - atalhou Jana com um sorriso sardônico. - Pelo menos, não precisaremos nos preocupar com radiação... ou toxinas.

Sob o sol do fim da manhã, pousamos no heliponto localizado no alto do centro hospitalar. O outro militar que acompanhava o piloto, saiu da cabine e nos ajudou a retirar nosso equipamento. Depois, abriu o compartimento de carga e ativou remotamente as duas unidades ADA, para que desembarcassem. Os autômatos de seis patas e corpo hexagonal, lembrando caranguejos negros gigantes, saíram do helicóptero e imediatamente ergueram suas antenas e sensores para checar as redondezas.

- Perímetro seguro - declarou o ADA identificado com o número 687 pintado em vermelho sobre o casco.

- Nenhuma ameaça próxima detectada - informou o outro ADA, o 421.

- Agora é com vocês - disse o militar. - Estaremos de volta às 12 h neste local, daqui à cinco dias.

- E se, por algum motivo, precisarmos de uma evacuação rápida... no meio da noite, digamos? - Inquiriu Jana.

- Nós não voamos à noite sobre esta região - retrucou ele, entrando na cabine do helicóptero.

Tivemos que nos afastar, pois instantes depois os rotores foram acionados e a aeronave partiu de volta à Phoimoiré. Nós a acompanhamos com o olhar, até que ela desapareceu por trás de um grupo de arranha-céus. Jana, então, aproximou-se do ADA 421 e indagou:

- Até que distância seus sensores conseguem avaliar?

- Dois quilômetros na horizontal, dois quilômetros na vertical - replicou o autômato.

Ela consultou o mapa da cidade que tinha nas mãos, e declarou:

- Dois quilômetros é a distância até a prefeitura. Estou curiosa para saber que tipo de leituras vamos ter quando estivermos mais próximos...

- Vamos nos preocupar com isso quando formos até lá - redargui. - Por ora, temos trabalho a fazer aqui...

E começamos a desembalar os geradores de campo, que, teoricamente, nos garantiriam uma noite tranquila de sono dentro do seu perímetro.

[Continua em "População: 4"]

- [19-07-2019]