N-19 (Parte 2)
Alguns meses após o ataque russo, mais da metade da população mundial havia morrido. Sistemas de infra-estrutura como fornecimento de energia, água e gás encanados, haviam entrado em colapso. Grupos de sobreviventes começaram a se formar unindo forças para combater os incansáveis ataques dos infectados, para saquear centros de distribuição e buscar abrigo. Qualquer barra de chocolate ou pacote de biscoito valia mais que um carro. No passado, havia acontecido algo semelhante, mas numa escala muito menor: O acidente de Chernobyl. Foi um fato isolado, controlado parcialmente pelas autoridades, mas infelizmente não serviu de aviso para a humanidade. As potências mundiais continuaram se armando, enriquecendo urânio, investindo em seus arsenais, obtendo nossa realidade atual como uma consequência pela busca desenfreada por poder. O que eles têm para governar agora é o caos, o desespero.
Numa vida convencional, muitas vezes nós não imaginamos o que vamos enfrentar. Nunca imaginei que mataria pessoas e que teria de lutar contra criaturas bestiais que outrora foram seres humanos como nós. Muitos animais domésticos e selvagens também sofreram mutações, evoluindo para criaturas extremamente agressivas e ágeis. O pandemônio nos punha em alerta constante. Não havia mais descanso ou lazer. À noite podíamos escutar gritos de pessoas que estavam sendo atacadas, grunhidos, uivos e todo tipo de som capaz de arrancar a sanidade de uma mente humana. Muitas das criaturas infectadas perdiam alguns sentidos. Algumas ficavam cegas ou surdas e tínhamos que nos valer dessa deficiência para nos movimentar pelos cenários que antes foram habitados por uma sociedade que vivia uma ilusão de civilização. O sentido que lhes sobravam eram mais aguçados que o normal, dificultando a mobilidade dos sobreviventes. Geralmente numa travessia pela cidade, alguém sempre morria por não conseguir ser discreto o suficiente e ironicamente, os locais onde se encontravam mais suprimentos eram justamente os prédios mais escuros e perigosos. Os infectados ficavam por horas em pé, vomitando e babando na escuridão, a espreita de uma presa fácil para saciar sua fome incontrolável.
Para as investidas, geralmente nos dividíamos em equipes de quatro a seis pessoas. Nos preparávamos como podíamos, usávamos desde fuzis a cabos de vassoura. Tudo o que pudesse causar algum dano era útil. Era preferível sempre usar roupas grossas e bem fechadas. O Uso de máscaras também ajudava, pois não tínhamos idéia de quanta radiação de nêutrons ainda estava presente na atmosfera e se nos contaminássemos, ela poderia ativar o vírus. Era sempre difícil fazer incursões nos municípios vizinhos, já que as estradas estavam cheias de carros abandonados. Isso foi provocado pelo pânico causado no dia do lançamento dos mísseis russos, quando a população tentava fugir inutilmente. As religiões caíram por terra. O arrebatamento não aconteceu. Jesus não voltou. Não existia mais fé nem esperança, só medo e desespero.