Projeto Cidade Transversal - Das Nossas Escolhas.
- Eu crio as coisas. - Gritou ao leu Glor para uma rua completamente deserta a sua frente. - Eu sou o que sou e controlo a tudo e a todos. - Continuou ele, quando não havia nada nem ninguém para lhe dar a devida atenção.
- Mas do que adianta o controle absoluto se não tenho controle nenhum de fato? Sinto as minhas mãos calejadas por um trabalho árduo nunca apreciado. Sinto a minha mente se esvaindo com fórmulas e teses que nunca mais serão ouvidas. Sinto o coração palpitar por amores construídos e destruídos. E a minha alma completamente fragmentada nos pensamentos que parecem não existir mais.
A rua continuava deserta. Nenhuma vivalma estava presente para ouvir o lamento daquele ser, pois, quem gostaria de ouvir lamentos? A Cidade Transversal tinha outras preocupações naquele momento, outros seres que precisavam do seu toque acalentador, não aquele, não agora, não ali.
- Por que diabos a tristeza me abate se eu sou o ser mais poderoso do meu universo? Ou será que eu não sou? - A sua voz era fugidia, como se algo que lhe havia em sua alma o tivesse faltando-lhe agora. - Um megalomaníaco apático? Tolice. BOBAGEM. Eu sou o que sou e sou mais forte do que eu jamais sonhei, mas porque eu estou aqui?
Ele sentiu uma pequena gota tocar-lhe a pele. Vestia apenas uma calça e luvas negras. Os seus olhos de um cintilante verde pálido pareciam divagar por um horizonte que não lhe parecia nada convidativo. O último fiapo de luz perpassou pelas nuvens e depois desapareceu por completo.
A Cidade Transversal nunca dava respostas, porque ela assim não precisava. Quem ali chegava, eventualmente, poderia compreender o porque de estar ali e o seu objetivo, se é que tinha um de verdade.
As gotas de água começavam a se tornar cada vez mais constantes e, em pouco tempo, encharcava Glor e toda a rua. Luzes começaram a se acender nas diversas janelas das casas e prédios que o cercavam e ele pôde observar sombras caminhando cá e lá.
- A solidão é uma virtude, quando achamos que não estamos sozinhos. Mas, e quando estamos realmente sozinhos, o que somos, de verdade? Deuses, o que eu eu vim fazer aqui? O que diabos é todo este lugar? Eu zanzei pelas ruas desta cidade sem fim e não encontrei um ser vivo. Apenas jogos e sombras. Por que não existe ninguém? - E ele se jogou ao chão de joelhos e lamentava com um choro que esvaia-lhe por seu rosto e que se misturava a chuva que começava a ficar cada vez mais forte.
Sentira então alguém pegar-lhe no ombro. Uma mão, leve, mas com um sentimento adocicado.
- Foi a sua escolha ao chegar a Cidade. A realidade que você moldou para si fez com que aquilo que visse se tornasse algo tangível. - A voz não parecia ter uma distinção certa de sexo, uma hora soava feminina, outra, masculina. - Depende só de você a escolha da realidade. Depende de você se ainda quer viver nas sombras ou acordar para o mundo que esteve ao seu redor.
Glor fechou os olhos e ouviu tudo o que aquela entidade estava lhe dizendo. Suspirou profundamente e se levantou vagarosamente. Ao se virar para interpelar aquela voz abrindo os olhos, o que vira era uma Cidade cheia de vida...
E vozes.
Ele fez a escolha dele.