Um Estranho Mundo - Capítulo III

Eu tentei permanecer tranquilo enquanto esperava na escuridão do calabouço em que fui jogado. Quanto tempo me manteriam aqui? Não iriam simplesmente me abandonar para morrer de fome. Shiri não permitiria, eu tinha certeza disso.

O local era completamente escuro, e fui tateando para descobrir um pouco mais a respeito da prisão em que me encontrava. Pela textura, parecia feita de pedra, um quadrado de três por quatro passos, sem janelas e com uma única porta provavelmente de madeira maciça.

Depois de horas aguardando sem que nada acontecesse, comecei a gritar, para ver se alguém respondia. Não sabia nem se o som passaria através da porta. O fato é que não houve nenhuma resposta. Sentei encostado em uma das paredes e continuei aguardando. Nada aconteceu.

Levou mais algumas horas até eu começar a imaginar se não haviam simplesmente decidido me deixar morrer de fome e sede. Gritei novamente, depois comecei a bater na porta até machucar as mãos ao ponto dos punhos sangrarem.

- Shiri disse que tudo ficaria bem - eu falei para mim mesmo, em voz alta, depois de me sentar novamente, tentando recuperar a calma - em breve vão vir me soltar.

Mais tempo passou, o silêncio era de enlouquecer. Comecei a investigar novamente as paredes com a palma das mãos, mas nada encontrei. Nenhuma passagem secreta, nenhuma alavanca misteriosa. Apenas quatro paredes de pedra e uma porta.

Sentei novamente e esperei, tentando ignorar a sede e a fome.

E o medo.

* * *

Uma multidão a meus pés, a sensação de poder fluindo através de mim, o leve toque carregado de eletricidade subindo através de minha mão. Tanto poder.

Acordei com um barulho, que me tirou de meu sonho, e abri meus olhos para a escuridão. Tanto poder. Tanto poder. A frase foi desaparecendo, perdendo seu significado. Uma memória, ou apenas uma fantasia que meu inconsciente criou de tanto ouvir Shiri e suas crenças sem sentido?

- Que barulho foi este? - falei em voz alta, mas sem esperar resposta. Me levantei com cuidado e comecei a caminhar, tateando, apenas para pisar em alguma coisa e molhar meu pé.

Me ajoelhando no chão e explorando com as mãos percebi que haviam me deixado um pote com água, outro com carne seca e um terceiro, um pouco maior, vazio. Todos os três eram potes baixos, e não levei muito tempo para entender o porquê. Eles estavam encostados na porta, e, examinando-a, percebi que parecia haver uma pequena portinhola na parte de baixo, que devia abrir para fora e agora estava trancada. De todo modo, era baixa demais para uma pessoa conseguir passar.

Comi e bebi e continuei aguardando, desta vez sentado ao lado da porta, esperando que fossem retirar os potes. Deixei-os um pouco afastados, de forma que quem tentasse pegá-los teria que enfiar a mão para dentro da cela.

Mais horas se passaram até ouvir o barulho da portinhola da porta sendo aberta, mas nenhuma mão entrou dentro da cela para puxar os potes, e a portinhola foi fechada novamente em poucos instantes. Tentei empurrá-la com minhas mãos, mas já a haviam trancado pelo outro lado.

Passei as próximas horas aguardando, no silêncio e na escuridão. Foi uma espera inútil, e nada mais aconteceu até eu dormir novamente.

* * *

No quarto dia resolvi fazer algo de útil. Fiquei parado, em pé, no centro de minha prisão, esvaziei minha mente e deixei meu corpo se mover. Memoria motora, foi o pensamento que cruzou minha mente, enquanto eu seguia movimentos pré-definidos de ataque e defesa. O pouco espaço limitava meus passos.

Parei apenas quando estava exausto e escorrendo suor. Sentei no chão de pedra e me detive a tentar lembrar meu aprendizado. Uma arte marcial, sem dúvida. Teria aprendido apenas por prazer, um esporte que praticava em meu tempo livre? Difícil acreditar que seria a explicação para ter vencido um duelo de espadas contra um guerreiro experiente. Embora estivesse em forma, não consegui me enxergar como um atleta de nível olímpico.

Comi minha única refeição do dia - descobri, após passar fome e sede por um dia inteiro, que devia deixar os potes ao lado da porta se esperava que fossem retirados e substituídos por novos com água e comida.

Fiz minhas necessidades no terceiro pote, outra de minhas descobertas.

Me levantei e continue a me exercitar. Não havia mais nada a fazer.

* * *

No quinto dia, adicionei mais uma atividade a minha rotina. Meditar.

Sentado em posição de lótus, minha mente vazia, pelo tempo que eu conseguisse ficar. Sempre após me exercitar. Qualquer coisa para fazer o tempo passar.

Foi naquela noite - noite e dia sendo apenas a forma como eu chamava dormir e ficar acordado - que os sonhos estranhos começaram a se intensificar.

Por estranho eu não me referia aos sonhos em si, embora eu estivesse certo que eram de fato bizarros pelas poucas cenas que lembrava ao despertar, mas pela sensação de eletricidade percorrendo meu corpo, em especial os braços, toda vez que eu acordava.

Um dos dias - sétimo, oitavo? - inclusive tive a impressão de uma pequena faísca elétrica passando entre meu polegar e indicador, quando aproximei os dois, logo depois de despertar. Ilusão? Eletricidade estática? A loucura finalmente tomando conta de mim?

No nono dia comecei a rir, e não consegui parar mais. Era simplesmente ridículo. Eu iria morrer em um calabouço, esquecido, nas profundezas de um castelo medieval habitado por felinos que acreditavam que eu era algum deus, após cair de uma nave espacial.

Eu ri até não conseguir mais. Então comecei a chorar.

* * *

No décimo dia acordei de pé, do lado de fora do calabouço. A porta estava destruída, e os pedaços da madeira estavam em chamas. Meus olhos estavam ofuscados pela luz e eu mal conseguia respirar devido a fumaça.

Corpos de Lepari jaziam a meus pés.

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Ashur
Enviado por Ashur em 27/12/2014
Código do texto: T5082349
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