Sem volta
Agora não tinha mais volta. Fui idiota, não devia ter bancado o herói...
Agora todos morreram, e eu estou aqui, com somente mais um cartucho de plasma, de frente pra uma parede, e as minhas costas somente um corredor. O mesmo corredor por onde eu vim. Um corredor cheio de insetos mutantes famintos que vão chegar até mim a qualquer momento.
Sozinho aqui, esperando pela morte, me lembro dos meus amigos, dos nossos sonhos de destruir essa colônia de insetos, de livrar nossa cidade da iminente desgraça que esses insetos são. Tudo por água abaixo. Todas as perdas em vão.
Será que a munição que pegamos do estoque fará falta quando a hora do ataque chegar? Ou os mantimentos que roubamos... Acho que uma família não terá o que comer por um dia. Não medimos as consequencias da nossa egoísta sede de aventura. Foi infantil. Nunca poderíamos ter destruído a colônia com somente 5 pessoas sem o menor treinamento, sem nem um plano decente.
"A gente entra e mata qualquer coisa que se mover" disse Joe antes de entrarmos nessa roubada. Agora Joe está morto, possívelmente no estômago de pelo menos 7 insetos diferentes. Assim como o resto da tropa.
Acho que tenho o sangue de todos os 4 espalhado pelo meu corpo. Além do meu, que jorra desses ferimentos.
Ah, claro... O veneno... Como eu poderia me esquecer do veneno?
As primeiras alucinações começam a me assombrar. Fantasmas do passado, em cores esquizofrénicas apontam meus erros e invalidam meus acertos. Não que eu tenha muitos, mas ao menos eu tinha.
Vejo minha mãe, mas agora ela tem pele verde fosforescente e cabelos rosa-choque, gritando comigo por não ter comido toda o almoço.
Ouço o som de insetos se aproximando, mas ouvi mesmo? Ou é só mais uma alucinação?
O som dos insetos se torna um dedilhado em um violão. Meu pai tocando o violão para meu pequeno irmão dormir. O irmão que eu não pude salvar de um inseto. O irmão que morreu por minha causa.
Sinceramente, acho que esse veneno vai me matar de depressão, e não de intoxicação...
Bato os dedos no bolso, procurando pelo meu cigarro. Não é como eram antigamente, daqueles que lembro meu avô fumando, que precisava de fogo, e soltava fumaça. Esse só tem mesmo um pouco de nicotina e marijuana. É só tragar, que as substancias entram direto no organismo, sem nenhum tipo de lesão posterior, só o vício.
Dou uma longa tragada. Será a última.
Acho que os insetos já sabem onde estou. Mas onde eu estou? O que antes era um dos túneis cavados pelos nojentos insetos, agora é a diretoria da escola onde eu estudei. As cores são tão cintilantes agora. Na realidade, acho que a parede não era azul piscina, nem que o uniforme era laranja, mas, relevei isso, pois a diretora agora tinha pelo menos 4 metros de altura. Como sempre, ela estava me dando algum tipo de sermão, mas não pude ouvir, pois tinha que carregar minha arma. Mas onde é mesmo que eu tinha colocado aquele cartucho?
Calma aí... Por que minha arma parece um peixe? Não, sério. Cadê minha arma?
Joguei aquele bacalhau fora e fui em busca da minha arma, enquanto ouvia alguma ex-namorada falando que eu era muito burro e insensível. Se eu tivesse com minha arma agora, eu daria um tiro especialmente na cabeça dela.
Acho que eu realmente perdi minha arma. Pelo menos ainda tem essa granada aqui.
Procuro a granada no colete, pego ela e espero avistar algum inseto, pra pelo menos morrer lutando.
Ouço um "click" atrás de mim. Meio já sem medo da morte, que agora era iminente, me virei, e vi meus amigos mortos novamente de pé. Mas ainda mortos.
Era meio nojento, mas eram mais amigos. Meus melhores amigos, e estavam ali, de volta.
Corri para abraça-los, e larguei a granada.
Ainda bem que eu não tirei o pino, só aquele pirulito que estava preso nela.