A Cidade Transversal - Parte VII - Pequenos Momentos
(Cidade Transversal, Cap. Summers, 2410.XXxx.0922)
Quando Summers havia acordado no outro dia, o mestre yanovan não pode recebê-lo. Na verdade havia se passado mais de semana desde que ele havia chegado ali que o mestre yanovan tinha saído em alguma viagem misteriosa e ninguém sabia quando ele voltaria e para ele aquilo não tinha lá muita relevância naquela hora. Pensou que ali era um bom lugar para passar o tempo e descansar.
A chuva de quando havia chegado se tornou bem maior de tudo que havia presenciado na questão de chuvas. Começou com pingos leves e traiçoeiros, onde não havia como desviar-se todos, depois vieram os pingos pesados e desordeiros, que quando eles gotejavam na cabeça, davam um certo incomodo incomum, depois vieram os pingos finos e rasteiros que, muitas vezes, pingavam nas costas das pessoas e faziam-lhe cócegas.
Sem contar que uma infinidade de tipos de ventos acompanhavam a chuva e eles eram, do mesmo tamanho, estranhos, diversos,
contraproducentes e interessantes. Se ele fosse um meteorologista ficaria abismado como um local que não deveria existir consegue criar as nuances entre as muitas chuvas que existem nos planetas.
Ele havia passado o dia inteiro em seu quarto, apenas ouvindo o cair da chuva no canto da janela do seu quarto. O som dela lhe acalmava de tal forma que parecia que estava numa espécie de paraíso. Estava pensando do porque não ter vindo antes. Aquele lugar era algo incomum não somente para ele, mas sim para muitos outros que ali estavam.
Um pouco mais cedo, àquela manhã, ele havia sido visitado por uma oficial da USS Atlantis.
Sarah: "Capitão Summers." – Disse ela enquanto andava pelo quarto dele. "Eu sabia que havia algo de especial em você, mas não
conseguia explicar o porquê e de como, de alguma forma, nós dois estamos interligados." – Ficou observando-o,tentando ler a sua maneira de agir.
Summers: "De certa forma eu sei bem como se sente... principalmente quando esta outra pessoa sabe como é o seu futur o, ou, pelo menos, o seu possível futuro." – Foi até a comoda do lado da cama, onde havia uma jarra com água e três copos. Encheu o primeiro copo e ofereceu a Sarah, que, educadamente recusou. Pediu dois goles e colocou-o em cima de uma mesa que havia ali no quarto. "Imagino como você deve estar pensando agora: `o que ele sabe sobre mim? O que acontecerá comigo?', o que eu posso lhe dizer é isto. Não pense, eu mesmo estou passando pelas mesmas dúvidas que você e isto está acabando comigo. Todo o meu ser anseia por saber o que virá a seguir, mas, o que eu vier a saber for o meu verdadeiro fim? E se eu não puder mudar nada disso?"
A chuva poderia ter acabado, mas, ainda assim, um vento frio e cortante perpassava pelas ruas da Cidade Transversal. As pessoas andavam por lá completamente agasalhadas e alguns casais colados uns aos outros. Mesmo assim era grande a movimentação de pessoas nela durante o dia. A cidade pulsava de vida e cor e, até onde Summers havia notado, tinha até um comércio local que prosperava continuamente.
Sarah: "Pode ser vã filosofia, Summers. O que se pensar sobre o futuro se ele não pode ser mudado? Será que ele está tão assim enraizado que o Universo não nos permite mudá-lo? Será que se eu souber de como irei morrer eu não poderei mudar este futuro a ponto de não precisar destruir todo o universo."
Summers sorriu. Sabia que o que afligia a Sarah não era aquilo, morte nunca havia passado pela mente daquela mulher, não, pelo menos, da forma que ela conhecia e, tão pouco, ele conhecia. Aqueles pensamentos eram risíveis para com a raça dela, os Kirrakytur, uma raça milenar criada pelos Alterrans e que poderiam viver muitas vidas a mais que a dos seres humanóides comuns. Não, sabia que aquilo nunca lhe passava a sua cabeça, mesmo que alguns kirrakytur não soubessem a sua origem, a priori.
Summers: "Tudo pode ser mudado." – Disse, consolando-a. "Pois eu não estaria aqui se isto não fosse possível." – concluiu.
Sarah: "E qual é a certeza que, realmente estando aqui, você poderá mudar o rumo da sua vida?"
Summers: "E quem disse que eu tenho certeza? O que eu quis dizer é que eu acredito que estando aqui eu já irei fazer diferença suficiente para mudar o que virá a minha frente."
Os dois passaram um tempo um olhando para o outro. Cada um fazendo a leitura que lhe cabia para entender o que se passava na mente de cada um. Não houve toque, não houve um sorriso, apenas dois olhares que se analisavam. Summers sentiu, então, um frio na espinha, pois aquilo lhe fez lembrar de Hope, a sua mulher morta pelos Pacificadores. Ela não tinha os mesmos trejeitos de Sarah, diga-se, fisicamente, mas pareciam pensar de forma igual, como duas irmãs separadas ao nascer. E aquilo o deixou agradavelmente ressabiado.
Sarah: "Os seus olhos querem enxergar além daquilo que envolve a carne das pessoas, já te falaram isso Summers? Já te disseram de como você tenta desvendar, mesmo que involuntariamente, as folhas dos livros que compõem as pessoas? Você nos olha e nos desnuda. E sinto-me completamente nua perante a você, pois sabe o que pode me acontecer, sabe o que eu sou e sinto que tivemos uma ligação mais que física por um longo tempo."
Summers: "Talvez, longo até demais." – Disse ele. "Talvez uma ligação quase tão irresistível como singrar pelo espaço infinito, descobrir novas civilizações e saber sobre o âmago da vida. Por muito tempo, o meu coração se dedicou a sua pessoa e, neste tempo, me achei completamente perdido, num limbo do qual eu não sabia onde eu me encaixava."
Sarah: "Ficar comigo foi um tempo de sofrimento?"
Summers: "Penúria... sofrimento... dor... e um amor infinito, que podia ser compartilhado por muitos outros. Talvez, por isso, me achava tão exposto. Meu amor por você era único e não gostava que fosse compartilhado, assim, resolvi me desprender de você completamente e ser o que eu era antigamente e mais do que sou agora."
Sarah: "Eu..."
Summers: "A culpa, de alguma forma, não foi sua... sou um solitário, um lobo que segue sozinho da matilha. Você nunca iria querer o meu amor para sempre, assim como eu não posso doar o meu amor por toda uma vida." – E deu um meio sorriso. "Tudo o que me aconteceu fez com que o meu coração se tornasse um rubro negro. Uma peça que muitos não mais a querem e prefiro não mais dá-la, pois todos merecem algo que eu não posso mais dar."
Sarah: "É como se você não quisesse amar, ou se não acreditasse mais nas pessoas."
Daniel Anderson Summers ficou calado por um momento. Aproximou-se de Sarah e pegou-lhe pela cintura. Face perante a face.
Naquele lugar somente o respirar dos dois era o que podia ser ouvido. Os olhos, se fosse possível, pareciam trocar descargas elétricas. Houve então um primeiro toque, um na mão do outro e uma espécie de calafrio subiu pela espinha de Summers, em contrapartida o coração de Sarah parecia ter disparado de tal forma que iria sair do seu peito.
Os lábios dos dois estavam sequiosos, pois ali não havia nenhuma reprimenda. Não havia posto e nem patente. Apenas dos seres, de um universo complexo, tentando compartilhar algo em comum. Ele, então, tocou-lhe o seu rosto suavemente e pode sentir aquela pele sedosa em suas mãos. A quanto tempo não sentia aquilo? Por quantos anos foi privado de apreciar a pele de uma mulher? Sarah fechou os olhos e só quis receber aquele carinho que, em outras circunstancias, talvez jamais tivesse aceitado.
Foi então que veio o primeiro beijo, pelo menos dela com ele, mas não o primeiro dele para com ela. Primeiro foram leves e sedosos, mas, em seguida, se tornaram violentos e apaixonados. Cada qual apertando o seu parceiro como pedia. A respiração
ficara entrecortada, forte e alucinante. Os corações pareciam que iriam explodir, um calor avançava tremendamente no corpo dos dois e, então, pararam.
Sarah: "E eu perdi você..." – Foi o que disse ela enquanto algumas poucas lágrimas vertiam-lhe dos olhos. "Talvez, no seu futuro, eu possa compreender o porque e tentar esta doce loucura novamente, mas eu sei que eu perdi você... como muitos outros saberão porque eles te perderam... você está indo embora, para nunca mais voltar." – Disse ainda agarrada a ele e os rostos se tocando, ela parecia apenas sussurrar. Summers podia sentir a sua respiração triste, com amor e miserável através dos seios cobertos pelo uniforme da Frota. "Você já chegou aqui perdido e pouca coisa poderá encontrar. Por que você
desiste?"
Daniel engoliu em seco e, em seguida, beijou-lhe a fronte. Sabia que tudo estava perdido, mas não aquele ponto. Havia algumas respostas as perguntas que queria ouvir, mas o seu futuro, naquele exato momento, estava imutável.
Summers: "Não que eu desista, mas, para todo começo, há um fim." – Foi o que disse por último.
Os dois se beijaram longamente e tiveram uma separação dolorosa e, por fim, Sarah saiu do seu quarto e não disse mais nada e nem olhou para trás.
Summers: "Ainda não desisti... Não agora."
(...)
E foi aquilo que lhe havia acontecido algum tempo atrás. Depois daquilo, nunca mais tinha visto Sarah Mckenna ou a sua Capitão, em contrapartida encontrara outro oficial daquela nave, Hans Duff, um dos maiores beberrões que a Frota Estelar já havia conhecido.
Com ele Summers conheceu alguns outros bares daquele lugar, até mesmo uma cópia do Gonzaga Recreational Club havia por lá.
Nestas idas e vindas em vários bares, acabou por cruzar, novamente, com Michael Snaker e sua mulher Dirana de Santívia que andavam juntos com Isadora Kristiner e Caryv, que foram devidamente apresentados.
Duff: "Sim, este Caryv se parece, e muito, com um Vulcano." – Respondeu ele enquanto Summers perguntava pela quarta vez. "Parece que os universos não são tão separados assim." – Continuou.
Snaker: "Este lugar é espetacular. Por mais que eu imagine que não tem nada para fazer ou descobrir, mais coisas aparecem ao redor para serem estudadas. Mas eu vi que este lugar não é exatamente para ser estudado e sim para ser apreciado, então, só estou passeando aqui com a minha mulher e nossos dois amigos." – Apontando para Caryv e Isadora.
Isadora: "Soube que o meu irmão teve uma breve conversa contigo, não foi Summers?" – Perguntou ela de uma forma bem inquisitiva.
Summers: "Se você está se referindo a Atron, Rodrigo Maulson, sim. Tive um tempo com ele." – e falou. "Uma pessoa bem interessante, diga-se de passagem, com tantas tramas em sua alma, quanto o universo por si só."
Isadora: "Assim somos todos nós." – E sorriu. "Nosso Império foi algo grandioso, pena que somos nós que sobramos daquele lugar e tudo o que temos são apenas memórias daquilo que somos."
Summers: "Às vezes, memórias valem mais que qualquer documento oficial." – e foram em direção a um restaurante ao ar livre, sentando numa mesa para seis e ficaram falando um pouco mais sobre as suas vidas antes de chegarem ali.
(...)
Isadora: "E o que você está esperando afinal?" – Perguntou ela para Caryv. "Passamos quase uma semana aqui. Não dá para ficar junto com você vinte e quatro horas por dia, ou seja lá quanto tempo for que seja um dia neste lugar."
Summers: "Mas devemos esperar pelos por menores... uma relação não pode durar para sempre..."
Snaker: "Eu discordo com veemência. Eu amo a minha Dinara. Eu estou com ela a muito tempo e nem por um segundo o meu amor por
ela diminuiu."
Hans: "Vocês são exceções as regras neste universo... o único e melhor amor que podemos ter é para com uma boa dose de uísque. Ela te dá muito prazer e você sempre pode trocar da amor na hora que quiser."
Summers: "E um bêbado falando sobre bebidas e garrafas não tem lá muita moral para falar de amor." – E os outros riram com Summers. "Cada um acredita de amor a sua maneira e, talvez, eu já tenha ido além desse ponto..."
Dínara: "Capitão, você é viado?"
Summers: "Como é que é?"
Dinara: "Eu estou pergunto, será que eu preciso ser mais claro, você é homossexual, ou algo do tipo? Eu ouvi dizer que a Comandante Sarah saiu do seu quarto... e nada parecia ter acontecido."
Summers: "Como é que é?" – Repetiu com um tom zangado em sua voz. – "Não é porque eu não respondi ao seu olhar lascivo, que
isso me faz um viado, um gay, ou algo do tipo."
Dinara: "Não faz? Então prove..."
Michael não sabia o que dizer. Vira que a sua mulher ficara um pouco fora de controle, mas não gostaria de repreendê-la, nunca gostava de fazer aquilo. E viu que Summers ficara invocado com aquela insinuação da sua mulher.
Isadora: "Capitão, ela está apenas te provocando..."
Summers: "E ela conseguiu..." – Disse, pulando sob a mesa, indo em direção da Dinara, que se levantou quando ele fez este movimento, ele pegou-a pelo pescoço e beijou-a com força. Michael, por alguns segundos, ficou sem reação, mas sendo bem mais alto que Summers, separou os dois e, em seguida, dera um soco nele.
Daniel cambaleou alguns centímetros para trás e sorriu. Sabia que o que fosse fazer, iria acabar naquilo. Lambeu o pouco de sangue que estava no canto de sua boca e não fez nada mais.
Dinara: "Eu retiro o que eu disse." – O seu olhar lascivo não diminuíra nenhum pouco e parecia que queria era mais.
Isabora: "Por que você fez isso Capitão?"
Summers: "Eu não gosto de ser desafiado... nenhum pouco... e ela estava fazendo por merecer... desculpe Michael, mas, as vezes, essa sua mulher é demais..."
Michael: "Eu sei..." – Sendo interrompido por Summers.
Summers: "Em ser chata e metida.. desculpe por isso Michael e espero que possamos nos encontrar em outras circunstâncias..."
Quando parecia que teriam uma outra discursão, Illix apareceu como se do nada.
Illix: "Daniel? Chegou a sua hora." – Disse ela com uma voz bem diferente daquilo que estava acostumado, era como se não fosse a Illix que conhecera, ou, pelo menos, supunha conhecer.
(...)