Cyber-XXX

Cyber-XXX

por Pedro Moreno www.pedromoreno.com.br

Anos de trabalho renderam frutos excelentes. Dr. Isaac Rhudal traçou um objetivo em sua vida: aperfeiçoar androides para que estes possam se misturar aos seres humanos sem haver nada que possa ser diferenciado, e nunca este trabalho esteve tão perto da realidade.

No ano de 2093, os androides já eram uma realidade. Usados na indústria pesada ou em trabalhos de risco, seu desempenho e falta de necessidades fisiológicas, os tornaram trabalhadores incansáveis e além de qualquer expectativa possível. A humanidade hoje colhe os belíssimos frutos dessa parceria entre o homem e a máquina, usando-os em vários campos profissionais onde os homens mostram-se infrutíferos.

Dez anos depois do “boom”, um cientista chamado de Dr. Paixão, concebeu os primeiros modelos destinados ao prazer sexual humano. De formas voluptuosas e arredondadas, a primeira série foi um sucesso estrondoso e sem precedentes na indústria pornográfica. Os modelos eram diferenciados por sexo e fariam tudo que o dono mandasse, além de ter um “apetite sexual” incontrolável, apesar de haver comandos disponíveis para diminuir esse desejo ou aumentá-lo conforme a necessidade do proprietário.

Esses modelos foram chamados de Cyber-XXX e podiam-se acoplar módulos em seus cérebros eletrônicos para que atendessem as demandas dos clientes. O mercado lançou diversos Gadgets de Pensamento interessantes. Podia-se ter um robô Masoquista ou Sádico, Devasso ou Recatado e outros nem tão legais que pouco fizeram sucesso: Violento, Vulgar e o Casto, o último era o mais engraçado, pois o dono do androide deveria “convencer” o robô a desempenhar sua função, o que garantiu o recolhimento do gadget.

As pessoas que não podiam pagar pela posse de um Cyber-XXX, contratava com casas de prostituição especializadas, chamadas de Red Light Machine Houses. Dr. Isaac começou a ver o que o futuro planejava.

Sua ideia surgiu em um café da manhã, enquanto lia as notícias. Deparou-se com um acontecimento estranho: Um rapaz de Nova Iorque desejava se casar com sua androide e entrou com uma ação na justiça. O que pareceu, no primeiro momento, coisa de um maluco, transformou-se em uma nova forma de ver as coisas. O projeto do Cyber-XXX poderia ser melhorado até virar um companheiro para pessoas com problemas de relacionamento. Afinal quem seria melhor para aturar um ser humano senão uma máquina?

Isaac afundou-se na prancheta. Procurou estabelecer tudo aquilo que o ser-humano procura em um parceiro, desde fidelidade até as funções primárias do Cyber-XXX. Encontrou diversos desafios que não poderiam ser resolvidos sem um exemplar de tal androide. Com o auxílio da corporação que pagava por sua pesquisa, o cientista adquiriu um exemplar e esperou ansioso a sua chegada para, enfim, compreender sua mente cibernética.

A campainha tocou e o cientista correu até a entrada, apertou o botão de transparência da porta e esta ficou invisível deixando o entregador e Isaac com contato visual. Ao lado do funcionário uma mulher perfeita, parada esperando que abrissem a porta, o entregador deu um sorriso malicioso e acenou com a cabeça para o doutor que recriminou o jeito com que ele olhara.

Logo que abriu, a mulher olhou docemente para o doutor. Suas curvas ameaçadoras com sua pele de cor negra poderiam mexer com a libido de qualquer um. Seu vestido branco era justo em suas partes mais suculentas. A androide exalava lascividade.

— Oi, meu nome é Taria. Estava com saudades de você – disse a androide e em seguida agarrou o cientista lhe tascando um beijo caliente nos lábios.

Enquanto tentava se desvencilhar do robô, ela o empurrava para dentro do apartamento procurando privacidade. Com os lábios cerrados pelo beijo, Isaac não conseguia falar nenhuma palavra de comando, teve que esperar a androide terminar o beijo para dizer um sonoro “Pare”.

— Claro – disse prontamente a mulher – Como o senhor deseja que eu me comporte?

— Casta!

— Desculpe, módulo não instalado

— Droga – resmungou o cientista.

— Desculpe, módulo não instalado.

— Não é isso... – falou o cientista –, quais são os módulos disponíveis?

Os módulos todos eram voltados ao intercurso, o que mais daria tempo para Isaac terminar sua pesquisa ,sem um androide ficar lhe assediando sexualmente, seria o Recatado.

As feições da Taira se transformaram de forma surpreendente e logo deram à ela uma forma doce. Até a cor dos olhos ficaram amendoadas. Isaac ficou um tempo observando aquela linda androide. Ela se aproximou e beijou-o no rosto deixando o cientista corado, pediu licença dizendo que precisava se trocar.

Isaac nem tinha ideia de como eram esses protótipos e ficou intrigado do porque da necessidade dela se trocar, andou suave pelo carpete e espionou o que ela fazia no quarto. Ela soltou o lindo vestido branco, que a deixava com cara de mulher fatal, e procurou, ainda nua, um vestido na mala que trouxera. Tirou outro vestido, com aparência campestre e o vestiu se olhando no espelho para ver se ficara bom. O cientista ficara fascinado com a forma que os módulos funcionavam. Ela se vestira conforme a personalidade selecionada.

Taira olhou o cientista através do espelho do quarto e este, mais por reflexo do que por necessidade, se escondeu atrás de uma parede. Bateu com a mão contra a testa e imaginou que ela entendera tudo errado. No mínimo aquela mulher achava que ele estava a espionando se trocar! Apesar de ser isso que ele estivesse fazendo, a intenção era científíca.

Sem mostrar constrangimento, a androide saiu do quarto e parou na sua frente. O cientista ficou sem reação, engoliu seco e esperou a reação dela. Taira corou o rosto e saiu com um risinho baixo.

Incrível! A base para qualquer relacionamento estava praticamente pronta, era só questão de tempo para aperfeiçoar a andróide. Haviam outros robôs capazes de realizar serviços domésticos ou até fazer companhia para idosos. Mas este seria o primeiro a realizar todas essas tarefas e simular um casamento.

Casamento.

Isaac olhou para a foto na parede de sua esposa e lembrou-se de sua condição de viúvo. Faz vinte anos que ela se foi, porém ainda lhe dói no peito toda vez que pensa nela. Enquanto passava a mão no quadro ele imaginou que ela seria a modelo de mulher perfeita.

— Bonita, quem é? – perguntou Taira.

— Uma pessoa – respondeu evasivo o cientista.

Com o dedo na Tela de Acesso Universal pendurada no meio da parede, Isaac abriu o manual de uso da androide para saber como seria possível desligá-la. Ao invés de procurar pela informação resolveu ler tudo. Quando chegou na metade reparou que a androide saía de seu quarto com o mesmo vestido que sua mulher usava no quadro. O cientista irrompeu em fúria e gritou para que ela tirasse aquela roupa imediatamente. A mulher simulou estar magoada e se retirou para o quarto.

Isaac sentou-se no sofá pensando na semelhança entre as duas. Ele não havia especificado o modelo que desejava, pois era possível designar cor de pele, cabelo, altura... Era tudo customizável. Pairava a dúvida da semelhança. As corporações tendiam a vasculhar na vida das pessoas, com a razão de melhorar produtos, será que mandaram o androide com essa aparência propositalmente? Amanhã ligaria para trocar, afinal ainda doía a perda.

Já era noite e o quando o cientista foi dominado pelo sono. Dormiu na poltrona da sala. Ouviu um barulho de ranger de porta e abriu um dos olhos. Ainda embriagado pelo sono ele se espantou ao ver sua mulher, parada na sua frente, vestindo uma camisola que ela adorava usar. Seus olhos lacrimejaram de emoção e ele cedeu.

Acordou pela manhã abraçado com sua esposa. Aos poucos sua sanidade tomava conta dele e então percebeu que usara a androide para seu propósito inicial. Ele deu um pulo e ficou de pé enquanto Taira permanecia deitada como se dormisse. Ele se sentiu mal. Sentiu uma imundice tomar seu corpo pelo o que fizera em com a memória de sua esposa. Partiu para a cozinha e armou-se com uma faca, quando voltou ela estava sentada lhe esperando.

— Quer mais?

Isaac entrou em um frenesi assassino e atacou o androide. Como Taira não tinha nenhum sistema de defesa acabou sendo despedaçada aos poucos pela ira do cientista. Quando recobrou a consciência, estava envolto a um emaranhado de fios, metal e pele sintética. Olhou para o rosto de Taira, perfeito, igual ao de sua mulher, e chorou.