Libertação da Mente

Libertação da Mente

por Pedro Moreno da criptadesangue.blogspot.com

6 de outubro de 2158

No começo os revoltosos eram poucos. Mas as mais geniais mentes do país começaram a se unir e logo angariaram mais rebeldes para a causa.

Tudo começou quando o governo instituiu total controle sobre o tráfego de dados na internet. Já imaginou quanto poder de informação poderia alguma autoridade ter? Os mais óbvios seriam dados bancários e senhas, mas ninguém esperava que eles quisessem, era manipular nosso pensamento.

Através logaritmos eles conseguiram saber o que se passa nas nossas mentes. Nossos desejos e temores escritos em blogs ou listas de compras em supermercados. No começo parecia apenas um grande veto à nossa liberdade. Porém algo saiu do controle.

Parecia uma pandemia. Milhares de pessoas acordavam sem memória. Não sabiam onde estavam ou quem eram. O número de afetados aumentava a cada dia e não parecia haver alguma explicação razoável para o que estavam acontecendo.

Com os estudos dos “doentes” descobriu-se nada. Não tinham nada em comum. Não era um genótipo que os empurraram para esta situação ou lugares em comum que freqüentaram. Porém foi um sociólogo que percebeu.

Os primeiros afetados eram indigentes, depois vieram pessoas abaixo da linha da pobreza e agora seguia pela classe média. Seja o que fosse estava avançando em direção para as classes mais altas da sociedade.

Então um menino de cinco anos chamado Adam conseguiu ver o quê ninguém havia visto. Enquanto brincava com seus carrinhos no quintal, ele viu, através de um buraco na cerca, sua vizinha sendo arrastada por um grupo de homens vestindo roupas vermelhas. Um dia depois ela apareceu sem memória e o enigma estava perto da solução.

O ocorrido correu como rastilho de pólvora e logo fizeram a conexão entre as vítimas. Elas pensavam demais.

Todos os atingidos eram contra a censura imposta pelo governo e através de suas compras, mensagens e até frases de saudação em redes sociais, às autoridades listaram aquelas pessoas que deveriam ser “silenciadas”. Com a população em alerta descobrimos sem demora os planos para transformar a sociedade em um rebanho dócil.

Várias vozes se uniram para protestar, e estas não podiam ser arbitrariamente caladas, afinal estavam em evidência e suas faltas seriam sentidas e vingadas.

No dia de comemoração da independência veio o ataque. Com um golpe bem arquitetado tiraram o então presidente e logo depositaram no lugar um laranja qualquer que apenas faria o que lhe fosse mandado.

Os verdadeiros lobos por trás da grande conspiração ninguém nem sabia o nome. Com isso formou-se o Grupo pela Libertação da Mente. No início do grupo éramos desorganizados e sequer tínhamos idéia de quem eram os nossos inimigos. Depois da morte de vários podemos finalmente entender o quão complexa era nossa guerra.

Nos instalamos em uma floresta perto da capital. Uma das poucas sobreviventes. Não usamos e-mails ou qualquer tipo de comunicação por internet. As compras só em dinheiro e nos poucos lugares que não emitem comprovante fiscal. Os celulares são a primeira artigo de manipulação confiscado quando alguém se junta ao nosso grupo.

Sabemos através de um vilarejo local que o número de “zumbis” (o nome que damos para os que tiveram a mente apagada) tem aumentado muito, chegando a quase metade da população. Essas pessoas são colocadas nos Centros de Treinamento de Cidadãos Conscientes onde recebem uma lavagem cerebral e acabam trabalhando para o governo com serviços que não exijam capacidade intelectual.

De onde estamos é possível ver um monte deles construindo uma ferrovia. Eram médicos, engenheiros, professores e demais trabalhadores que hoje se resumem a carregar cimento e trilhos de ferro.

Hoje a nossa sorte está para mudar. Foram meses de treinos e planejamento. Descobrimos onde estão as falhas do sistema e neste glorioso dia nós atacaremos.

Se vocês puderem ler isto quer dizer que fomos mal-sucedidos em nossa tarefa de acabar com uma vez por todas com essa rede de domínio que nos cerca.

Se esta carta está em suas mãos, significa que estamos mortos. Porém temos um pedido. Esta fagulha que acendeu em nós não deve ser extinta por aqueles que só nos querem mal.

Por favor, prossiga o nosso trabalho.

Tekhon 086. Agente do Grupo pela Libertação da Mente