Sofrimento e Ternura

Os Três...

Eu estou certo de que algumas pessoas lerão este ensaio, por isso, desde já, peço a colaboração para encontrar um título apropriado ao conteúdo.

Pensei, a princípio, que poderia ser os Três Loucos, mas lembrei-me que na década de 60, um conjunto musical, muito famoso, formado por Vital Farias, Golinha, Luiz Hugo Guimarães Filho e Floriano, tomou o nome de os "Quatro Loucos". Também, imaginei o título de "Os Três Patetas" ou "Os Brutos Também Amam", mas trata-se de denominações muito gastas, já que os filmes americanos, de mesmos nomes, foram vistos até a exaustão. E se fosse "Violência, Sofrimento e Ternura"? Mas pareceu-me muito intelectualizado.

Portanto, fica em aberto o título desta história, contando o autor com a boa vontade dos que se aventurarem a percorrer a travessia desta, a meu ver, comovente narrativa.

Os fatos teriam acontecido em Teixeira, uma terra que sempre anda comigo.

O que aqui se expõe jamais viria ao conhecimento de outras gerações, não fora o empenho de alguns intelectuais e pesquisadores, tais como o Juiz, o Promotor, um Advogado e o Secretário da Prefeitura, que estudaram em Freud, Carl Jung, Carl Rogers, Viktor Frankl e muitos outros psiquiatras/psicólogos, vasculharam bibliotecas, consultaram especialistas e acompanharam dia a dia a convivência de três pessoas com personalidades tão distintas.

Os personagens centrais seriam:

- Mimi - um adolescente, completamente sem juízo, seu único horizonte era o prefeito José Xavier que o acolhera, permitindo a entrada de Mimi em sua residência.

Fisicamente era deformado. A cabeça desproporcional para o corpo, ou como dizia Nenê de Tola: "era cabeça para três corpos". Não tinha mais que 1,20m de altura. Era acentuadamente estrábico, de modo que o interlocutor jamais saberia para onde ele estava olhando. Quando andava, seu tronco balançava como um pêndulo. No entanto era pacífico, terno e atencioso. Não se conseguiu identificar a sua origem.

Caboclo ou "Caboco" César - um moreno forte, atarracado, cerca de 50 anos, barba imensa, igualmente sem juízo, só que, quando contrariado, ficava extremamente violento. Possuidor de uma força de gigante, não adiantava prendê-lo, pois era capaz de desmontar a cadeia. Em termos de fealdade ele ganharia com muita vantagem para Quasimodo, Drácula, ou outros do gênero. Há muitas versões para sua loucura. Vou deixar para a historiadora/poetisa Julita Nunes a tarefa de estabelecer qual das variantes aproxima-se mais da verdade.

"Caboco" César poderia sempre ser encontrado ao lado do café de "Caboca", ou Dona "Caboca", como era mais conhecida, sentado em seu indefectível tamborete.

- O terceiro personagem era um pateta - Manu. Sua principal característica era ser atravessado, ou seja, metia-se em tudo que não lhe dizia respeito. Tinha perto dos trinta anos, e o seu Éden era o sítio Tanque Coberto, de João Campos. Não era violento, porém irritava muitas pessoas pelo seu intrometimento, em qualquer local ou situação.

De quem fora a ideia de acomodar os três personagens num mesmo vão? Uma sala de uma casa em ruínas, herança da Revolução de 1930 quando os liberais atearam fogo em diversas moradias da família Dantas. Os pesquisadores, apesar da extrema boa vontade não conseguiram descobrir. Talvez tenha sido iniciativa de um estudioso itinerante, curioso por experiências na área da psicanálise.

Os três não tinham nenhuma comunicação entre si, um olhar que fosse, um sorriso, um bom dia, nada, parecia que cada um morava sozinho. Não havia nenhum móvel na sala, nem rede, dormiam no chão, sem coberta, muitas vezes gemendo sob o frio impiedoso do inverno teixeirense.

Num determinado dia, Manu ganhou uma dúzia de ovos de capoeira. Foi uma alegria só, e de imediato saiu em desabalada carreira para cozinhá-los. Os outros dois moradores já estavam dormindo. Manu procurou uma vasilha para colocar os ovos no fogo e não encontrou. Ficou desesperado. Finalmente descobriu o penico onde "Caboco" César satisfazia as suas necessidades durante a noite, já que era portador de uma diarreia crônica, cujos sintomas eram bem visíveis no traseiro de suas calças. Manu colocou os ovos no urinol e não encontrando, pelo menos, gravetos para queimar utilizou-se da única peça inflamável - a calça de C. César, - que dormia despido. O pateta deu-se por satisfeito e preparou-se alegremente para jantar os doze ovos de capoeira.

Na medida em que o fogo aumentava, a fumaça se espalhava pela sala e os odores característicos daquela peça do vestuário de "Caboco" César tomaram conta do ambiente, e ao penetrar nas suas narinas, este reconheceu, e ao vê-la transformada em trapos fumegantes, levantou-se de um pulo e deu um violento chute no penico. Manu que segurava a asa do apetrecho foi junto, e o deslocamento do ar foi tão forte, que também arrastou Mimi, e os três, qual foguete espacial, atravessaram a noite teixeirense indo fazer uma aterrissagem forçada exatamente no Cafundó.

Passado o susto, adormeceram.

Dia seguinte "Caboco" César saiu para o seu ponto fixo, totalmente nu. Se já era um homem assustadoramente feio, que dirá nu! Foi um corre-corre, um Deus nos acuda e um esforço coletivo para cobrir os melindres do leso. Ele, não aceitou nenhuma das ofertas, e naturalmente despido sentou-se no seu tamborete a espera que alguma alma caridosa garantisse a sua refeição.

Foi um escândalo. Várias senhoras dirigiram-se ao Vigário pedindo para atendê-las em caráter excepcional, no confessionário. Sendo a confissão sigilosa, não se tem conhecimento do que elas revelaram ao piedoso cura, e este atendendo a pedidos mandou que o sino da igreja tocasse sinal fúnebre, enquanto César permanecesse naquele estado.

Foram colocadas nas vielas que levavam ao local, agora considerado impuro, placas de "passagem proibida", e foram gastas dezenas de garrafas de água benta para depurar a redondeza. Nas cercanias muitas portas se mantiveram fechadas, sendo colocadas tarjas pretas em sinal de luto por tão grande ofensa ao pudor.

A notícia se espalhou e começou a chegar turistas (ou adeptos do nudismo?) das cidades vizinhas. Não parava de pipocar os cliques das máquinas fotográficas, e incontinenti armaram-se barracas para vender filmes, lanches, porém, conforme pesquisa feita na Coletoria Fiscal pelos interessados, o utensílio mais vendido foi binóculos. As respeitáveis beatas ofereceram-se para badalar o sino e, fato inusitado, sempre se faziam acompanhar dos binóculos. Do alto da torre da Igreja tinham uma visão panorâmica de toda a cidade.

As beatas mais piedosas pensaram em mudar-se do Teixeira, mas prevaleceu a ideia de se promover um tríduo apelando a Santo Adão - o patrono dos naturalistas - para que aquela crise fosse a mais passageira desejável.

Aconteceram verdadeiras romarias em penitência, e, um dado curioso, eram formadas exclusivamente por mulheres, e sempre no horário em que "Caboco", indiferente à curiosidade feminina, desfilava desnudo com destino ao seu local de trabalho.

O Secretário da Prefeitura, pesquisador e estudioso da Teologia Moral, procurou tranquilizar a população, convencendo-a de que aquilo era uma coisa natural, feita por Deus, e Deus tinha visto que era bom. Em vão.

Sebastião Guedes, homem experiente, formado na escola da vida, teve a feliz intuição de mandar Bilotinho retirar uma calça da prateleira de sua loja e esfregar o chão do banheiro com ela. Terminada esta adequação, a calça foi oferecida ao "Caboco" que abriu um sorriso e a vestiu. Estava terminada, a contragosto do comércio, a maior crise moral/religiosa da cidade do Teixeira.

O pároco respirou aliviado, porém por pouco tempo. Num domingo do tempo comum, antes da missa das 9:00, ele se preparava bem para a homilia. Vendo por outra ótica, e talvez a mais significativa, a missa daquele horário representava o carro chefe da arrecadação. Através da generosa oferta dos fiéis estava garantida a sua sobrevivência, pelo menos por uma semana.

Das três leituras, optou peia primeira, onde poderia soltar a imaginação, já que se tratava do primeiro capítulo do Gênesis. Começou a pregação se referindo ao Jardim do Éden e suas belezas, lugar ideal para se viver.

Quando começou a falar sobre as árvores, os frutos, Deus caminhando á brisa da tarde, Manu que estava sentado no primeiro banco, levantou-se e gritou alto: "Melhor do que isso é o sítio de João Campos, lá tem um açude para tomar banho e muita manga pra gente chupar".

O padre ficou assustado, principalmente porque se lembrou de que aquele rapaz era conhecido como o mais atravessado do Teixeira. Foram muitos os incidentes onde ele se intrometera inconvenientemente: festas, casamentos, solenidades, conversas reservadas. Manu, certa vez quando o vigário, absolutamente concentrado, confessava uma devota, teve a petulância de interferir exigindo que a penitência daquela senhora fosse duplicada.

O vigário, temeroso não disse uma palavra, e continuou o seu discurso sobre os rios que circundavam o Éden, amenizando o calor de 40 graus.

Manu voltou à carga dizendo que no sítio de João Campos não fazia calor, ao contrário, pela manhã era necessário sair envolvido num lençol para se proteger do frio.

O pregador, com muito esforço, procurou ficar indiferente, falando, desta vez, sobre as gostosas maçãs do paraíso terrestre. Manu refutou agora já bem próximo do púlpito, dizendo que as mangas espada do Tanque Coberto eram muito melhores.

O piedoso cura sentiu que não podia continuar, e nem pensar em suspender a missa, sobretudo antes da coleta, e apelou a alguns senhores para retirar aquele "indivíduo intruso" da Igreja, ao mesmo tempo em que aspergia o rapaz com água benta. Foi o bastante, Manu provou o líquido, achou-o salgado, e, imaginando ser outra coisa, empurrou a tribuna com tanta força que levou ao chão o padre com roquete, barrete, casula, missal e mais outros apetrechos necessários ao ritual. Nenhuma reação masculina, mas uma beata, ao ver o venerando sacerdote estendido no chão, encheu-se de sagrada ira e arremessou o guarda-chuva na cabeça do meliante abrindo um rasgo na testa, encharcando sua roupa de sangue. Manu ao ver-se sangrando correu para o seu refúgio.

Depois de amparado, espanado pelas fiéis beatas, o sacerdote tentou retomar a pregação, mas, decididamente aquele não era o seu dia.

"Caboco" César sentado no seu ponto de mendicância estendeu a mão para um passante que lhe deu uma moeda com uma condição, ele gritar um dos mantras (ou doidice como chamavam) durante cinco minutos. O mendigo olhou em direção à Igreja e hesitou, mas o transeunte falou que o vigário estava lhe fazendo concorrência, palavra mágica que provocava a maior fúria no "Caboco", então ele começou imediatamente: "A mãe de Deus e a mãe do diabo, a mãe de Deus e a mãe do diabo, o padre Abel e o padre Torres (dois padres que foram pais, sem deixar o ministério); a luz do sol e a luz da lua" e por aí vai.

Acontece que para aquele pedinte, cinco minutos, também poderia ser a eternidade. O padre enfureceu-se e apelou para a valentia dos varões presentes. Todavia, quem teria a coragem de enfrentar "Caboco" César?

O vigário esperou, esperou, e decidiu mandar correr a bolsa, que foi fraquíssima, pois a maioria dos fiéis, amedrontados, já estava se retirando. Pelo peso da sacola o reverendo desanimou e decidiu suspender a celebração.

O Caboco continuou com a repetição dos refrões, incomodando a todos. Dona Caboca apelou para própria generosidade levando uma xícara de café quente, porém o gesto não deu resultado.

O delegado resolveu tomar uma providência. Além dos quatro sodados do destacamento convocou voluntários de reconhecida força: Mané Caminhão (que sozinho suspendera um caminhão), Vicente Tejo, que já ganhara concursos em Patos e até Campina Grande, disputando quem, mais rápido, descarregaria sozinho, um caminhão de algodão, além de outros forçudos menos famosos.

Chegaram de surpresa, agarraram "Caboco" César que esperneou, gritou, babou, mas, mesmo assim, foi levado e trancado na cela, e após, colocou-se um cadeado reforçado, na porta principal. Não tinha se passado 10 minutos e lá vem o "Caboco" carregando na cabeça as grades da cela e da porta da frente, levando-as como troféu para o seu esconderijo, lembrava Sansão carregando os portões da cidade de Gaza.

Um dia deu-se um encontro histórico na cidade do Teixeira. "Caboco" César e Serafim da Lata. Este era um verdadeiro "gentleman". Não se sabe onde morava, nem ninguém se atrevia a descobrir. Tratava-se de um cidadão alto, elegante, andar e voz macios, porém ai de quem tentasse aproximar-se de sua privacidade. Andava sempre com uma lata e inspirava medo nas crianças e senhoras, embora fosse inofensivo.

Alguns desocupados tentaram provocar um duelo entre os dois, sem êxito, porém alguém se lembrou e disse: "Serafim veio fazer concorrência a você". Foi o suficiente, C. César arrancou uma estaca de cimento que impedia o trânsito de veículos e tentou atingir Serafim com tanta violência que a tata virou uma lâmina. Serafim agachou-se e arriscou um golpe de capoeira, mas "Caboco" César tinha raízes fincadas no chão e nem se abalou. Serafim, mais técnico em matéria de briga, pulou com os dois pés (takles) no tórax do adversário, inútil. O homem era um tronco. Nesse momento, em que se esperava a destruição total de Serafim, Mimi se põe entre os dois e diz com sua voz de criança: "Meu ‘padim’ Zé Xawer mandou dizer que vocês acabassem com essa briga". Ninguém esperava por essa, mas "Caboco" César foi para o seu posto de mendicância e Serafim desceu para a Rua de Baixo.

Os pesquisadores polarizaram a controvérsia. Ficaram em dúvida, se a desistência dos dois folclóricos teria sido em respeito a Zé Xavier ou à ternura de Mimi.

Uma observação intrigante para os intelectuais é quanto à reação de "Caboco" César quando ouvia a palavra "concorrência". Houve várias divagações. Uma delas supunha que César teria estudado economia e por ser muito aplicado enlouquecera. Outra imaginava que, na juventude, ele teria sido um socialista radical, sempre manifestando ojeriza à prática da concorrência ou competição, próprias do sistema capitalista.

Talvez tenha sido nesta briga que C. César deu uma violenta topada, arrancando uma unha do pé direito. A cabeça do dedão inchou tanto que lembrava uma bola de tênis. O pobre homem sentia muita dor e andava agarrado nas paredes.

Numa noite a agonia tornou-se insuportável, o mendigo chorava, gritava e gemia.

Os gemidos que a princípio eram mais comedidos tornaram-se sem controle e foram ouvidos, de início no Caipira, na Rua de Baixo, na Vila, e depois São Bernardo, Santa Maria, Pedra do Galo, São Francisco, Poços, Riacho Verde, Fava de Cheiro, Pimenteira, Piedade, turistas que se achavam acampados no Pico do Jabre, até de Jerimum, atual São José do Bonfim, um caminhoneiro que queria subir a serra, telefonou procurando saber o que estava acontecendo em Teixeira.

A cidade recolheu-se, procurando abrigar-se da imprevista reação do louco. O comércio fechou mais cedo e nesta tardinha não foi encontrado pão nas padarias de Cícero Lacet, Né e Afonso Guedes. Não houve cadeiras na calçada. João Preto não foi buscar água no Cacimbão. O frágil transformador de energia não suportou o volume dos decibéis do gemido de "Caboco" César e implodiu, ficando Teixeira completamente às escuras.

O Padre, por precaução, preferiu não celebrar a benção do Santíssimo.

O delegado, cauteloso como sempre, preferiu aguardar os acontecimentos, trancado no seu alojamento.

Os intelectuais reuniram-se para avaliar a situação. O Promotor assegurou que naquela noite a lua passou agachada por trás da Serra de São Francisco, só retomando a órbita costumeira na altura da Cruz da Menina. O Juiz, muito calculista, declarou de próprio punho que só foram vistas no céu, as estrelas mais distantes.

Leonardo Boff, de quem foi exigido o silêncio obsequioso pela Cúria Romana, diz que a solução de grandes problemas do relacionamento humano pode estar no cuidado, na ternura. Os pesquisadores concordaram.

No íntimo daquela noite de terror, Manu, o alienado, levanta-se sonolento, tateando, e compadecido senta-se ao lado do homem em dores, toma delicadamente o seu pé doente, põe sobre os joelhos, encosta no seu peito e entoa uma canção de ninar. No mesmo instante Mimi sopra o dedo chagado. Sopra... sopra... sopra...os gritos de dor vão diminuindo, e "Caboco" César adormece em paz.

A lua linda, como acontece na serra teixeirense, desafiadora, provocante, insinuante, sensual, parou numa noite de paz bem na altura da janela de "Caboco" César. Os seus raios repousando brandamente sobre o corpo cansado acordaram-no. Este se sentou, recostou-se na parede sem reboco e contemplou o pálido sol noturno. As lembranças lhe vieram. De quem? Dos amores não vividos? Da felicidade que não teve? Que lembranças poderiam brotar naquele cérebro confuso? O que é certo, é que aquele homem indomável, bravo, temido, capitulou e enternecido chorou copiosamente. Quando controlou os soluços começou a cantar com uma voz muito terna.

Eu sou como a garça triste

Que canta a beira do rio

As orvalhadas da noite

Me fazem tremer de frio

Me fazem tremer de frio

Como os juncos da lagoa

Feliz da Araponga errante

Que é livre, que livre voa

Tem a relva, a trepadeira,

Todas têm os seus amores

Eu não tenho mãe nem filhos

Nem irmão, nem lar, nem flores

O choro embarga-lhe o canto, mas a voz como um soluço lacerante, continua a cantar:

Tem a palmeira, a baunilha,

Tem o brejo a lavadeira

Tem as campinas as flores

Tem a relva, a trepadeira

Tem a relva, a trepadeira

Todos têm os seus amores

Eu não tenho mãe nem filhos

Nem irmãos, nem lar, nem flores

A voz cada vez mais suave espalhou-se e contagiou a cidade. Até o relógio da torre da igreja interrompeu o seu tic-tac. Os namorados deram-se as mãos, os casais sentados nas calçadas trocaram olhares ternos.

A voz, quase sempre gritadora de bordões irreverentes, agora, cheia de candura era um convite ao intimismo romântico. Teixeira teve naquela noite, os instantes mais tranquilos e líricos de sua história.

Dia seguinte nenhum dos três personagens da casa em ruínas apareceu. O Secretário da Prefeitura, atento vigilante do itinerário dos três, resolveu examinar, e furtivamente olhou pela janela.

Mais tarde, na tertúlia noturna, o Secretário, com voz comovida e entremeada de soluços disse pausadamente: "Meninos eu vi".

Que teria visto o criterioso pesquisador que tanto o comoveu?

A curiosidade dominava a todos.

Então ele contou que ao chegar à casa em ruínas, sem portas, sem divisões, só a sala era protegida da chuva e dos raios do sol, o chão de barro batido era duro e desconfortável, seu coração ficou agitado. Ali moravam três homens ignorados e excluídos do convívio social e por isso, embrutecidos. Viviam das migalhas que eram sobejo dos outros. Nunca recebiam ou receberam palavra delicada, atenção, carinho.

O Secretário disse entre lágrimas que viu “Caboco” César dormindo tranquilamente e, suas mãos afagavam as cabeças de Mimi e Manu recostadas no seu peito.

João Fragoso

Setembro/2009

Joca Fragoso
Enviado por Joca Fragoso em 05/02/2021
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