Para todo mal há cura

Estava tão preocupada com a possibilidade de poder ou não fazer aquilo, que nem parou para pensar se era o que deveria fazer. Mas agora que Cordelia trouxera a trípode de bronze de dentro da casa e a colocara sobre uma fogueira ao ar livre, a sequência de procedimentos surgiu clara em sua mente: o único modo que conhecia para impedir que a peste levasse Emmelie, seria vinculando a criança à uma contraparte numa realidade alternativa. Uma em que a ciência médica estivesse suficientemente avançada para detectar e curar a moléstia antes que ela matasse a paciente. Era um método arriscado, mas diante da emergência, nada mais lhe ocorreu.

- Vou ter que usar a Ressonância - alertou à irmã.

Cordelia lançou-lhe um olhar apreensivo.

- Eu não sou versada em medicina, como bem sabe. Vou ter que usar os instrumentos que tenho a mão, e a Ressonância é o mais poderoso deles. Peça a Briallen que traga Emmelie, pois vou precisar vê-la durante o transe; não conheço a criança de perto, como conhecia Corey.

Enquanto Cordelia ia chamar mãe e filha, Annabel dispôs dois tamboretes em lados opostos à trípode. Quando Briallen tomou assento com Emmelie nos braços, Annabel despejou um pouco de água na trípode e nela jogou as ervas que colhera mais cedo junto à torre em ruínas. Esperou que o vapor se levantasse e então se inclinou sobre a trípode, aspirando profundamente; depois, aprumou o corpo à medida em que os efeitos da Ressonância tomavam conta do seu corpo. Finalmente, olhou para Emmelie com os olhos vidrados.

- Estou vendo a contraparte de Emmelie num mundo onde a peste também está fazendo muitas vítimas... mas eles possuem artes médicas muito mais avançadas do que as nossas - declarou em transe.

- Você pode curar minha filha? - Suplicou Briallen.

- Eu não, mas eles podem - replicou Annabel com voz rouca, erguendo os braços. A fumaça da trípode envolveu as duas mulheres por alguns instantes, e quando se dissipou, Annabel parecia dormir, cabeça encostada no peito. Briallen aguardou por longos minutos que a outra despertasse, mas como ela não dava sinal de vida, virou-se para Cordelia que assistia a cena de uma distância respeitosa:

- O que eu faço agora?

- Acabou - determinou a grã-mestra. - Minha irmã vinculou a sua filha com a contraparte do outro mundo. Tudo o que podemos fazer agora é esperar que eles tenham a cura para a peste; se a contraparte for curada, Emmelie também será.

- E como vamos saber se deu certo? - Questionou Briallen levantando-se com a menina adormecida nos braços.

- Vamos ter que esperar - respondeu Annabel abrindo os olhos como quem desperta de um sonho. - Mas o vínculo da Ressonância foi muito forte. Sinto que podemos ter esperança.

Apanhou um cântaro de barro cheio de água que deixara ao lado do tamborete e atirou o conteúdo na fogueira. Depois, ergueu-se e espreguiçou-se.

- Você é testemunha - disse então para Cordelia. - Esse não é um método que vamos poder usar para salvar muita gente. Se funcionar com Emmelie, ou mandamos as pessoas para serem tratadas lá, ou trazemos um dos seus médicos para cá. Não vai dar para vincular um por um e esperar que dê certo.

Cordelia a encarou em expectativa.

- Você pode abrir um portal para este outro universo? - Indagou.

- Como achou que eu fosse trazer a contraparte de Corey? - Redarguiu Annabel.

- [11-10-2020]