Devaneios de um Pierrot

Sentado em um dos degraus da comprida escadaria, que findava nos portões da biblioteca, estava eu sentado e cansado, com quatro livros no colo e mais dois em mente, que preciso ler. Apoiada sobre um dos livros, o de capa mais dura, eu tentava manter esticada uma amassada folha de papel, e nela penejava um conto... Aliás, tentava. Essa tentativa me era inquietante, portanto, parecia-me interminável.

Olhei no relógio e percebi que eu já estava sentado ali a três quartos de hora, havia antes disso, escolhido três livros do Ernst Cassirer e um sobre psicanálise na biblioteca, quando fui arrebatado por uma incessante vontade de escrever. Preenchi o cadastro e desci, esbaforido, a escada até sentar-me num degrau, um degrau especifico digamos... Dele eu podia ver um pouco do mar, que se escondia, tímido, por detrás das altas e volumosas árvores, que eram também abrigo para várias espécies de animais, entre pequenos macacos, aves e insetos.

Sentado ali, onde eu podia observar parte do ciclo natural e apreciar o mar, que a noite com a rua menos movimentada, os pássaros dormindo e eu escrevendo, sob a amarelada luz de um velho poste, permitia-me ouvi-lo.

A complicada atividade de escrever o conto me corroía, surtiam em mim a todo momento, histórias, destinos, desfechos e personagens. Diálogos, pensamentos e locais choviam em minha cabeça, e não haviam guarda-chuvas pragmáticos que me mantivessem seco dessas ideias.

Molhado permanecia, atônito e confuso, sem conseguir concluir o escrito.

Se eu escolhesse determinada história, com tais personagens e um certo enredo, no qual o desfecho seria esse. Essa escolha automaticamente eliminaria a criação e o nascimento de outros contos, com enredo, história e personagens diferentes, e pensando assim, roendo as unhas e tragando um malboro, permanecia sentado.

Quando, enfim, decidia o que escrever, nem sempre feliz, desenhava um fim, traçava um caminho, desmanchava ilusões, inventava amores, brincava com o lúdico e falava do irreal. Concluía o conto, e até sorria, de lado e sem jeito, sobretudo aliviado. Quiça esquecendo que esse ataque é recorrente e, outras vezes me arrebatará.

João Caetano
Enviado por João Caetano em 02/10/2013
Reeditado em 16/11/2013
Código do texto: T4507295
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