Jupira- Parte I

Mal o dia amanhecia e o tempo já se passava depressa no preparativo do café no fogão de lenha. O café ralo, que fora moído no dia anterior, descia pelo coador de pano sob o olhar ainda sonolento de Jupira. De caneca de barro em sua mão esquerda, despejava nela o café do bule adoçado com rapadura . Sobre a mesa forrada com uma toalha xadrez preta e branca desgastada, havia um pedaço de pão sovado, uma pequena leiteira , manteiga e uma broa de milho pela metade. Na cozinha enfumaçada pelo fogão de lenha precário, os raios do sol que entravam pela janela eram refletidos e formavam uma cortina azul quase densa. Parecia ser difícil de se respirar alí, mas Jupira já estava acostumada com tudo aquilo que nem parecia notar o quanto inalava de fumaça. Sentando-se à mesa, pegava um pedaço de pão e o comia vagarosamente com o olhar distante, como se pensasse na vida ou algo mais do que a vida no seu dia-a-dia.

Jupira era uma mulher viúva. Tinha dois filhos adolescentes que estavam passando uma temporada no estado vizinho ao seu numa pequena fazenda de seu irmão, Onofre. Seus filhos estavam aprendendo a lidar com o pequeno rebanho de vacas leiteiras do tio, onde este prometera dar duas para Jupira para ajudar na sua fonte de renda e sustento.Os meninos estava aprendendo o jeito de como cuidar das vacas que ganhariam.

A vida de Jupira se tornara árdua após a morte de seu marido que perdera ainda jovem. Ela casou-se com dezesseis anos e ficara viúva aos vinte.Época em que teve seus dois filhos Petrúcio e José da Luz. Seu marido morreu em um acidente na fazenda onde trabalhava quando operava uma caldeira. Depois deste fato, Jupira teve que trabalhar mais do que já trabalhava para sustentar os meninos. Os parentes mais próximos dela ficavam a uns 150 quilômetros que como ela também tinham uma vida árdua e trabalhosa. Se viam muito pouco, mas nunca deixaram de se reunirem uma vez que fosse no mês mantendo a união da família. Ao saberem da morte do marido de Jupira, cada um colaborou da forma que pode para não deixá-lda desamparada e assim foi durante toda a gravidez até quando os meninos ficaram mais crescidos, podendo assim, desta forma, Jupira retomar seus afazeres com um pouco mais de tempo.

Ela morava num pequeno sítio que havia sido herdado pelo seu marido na partilha dos bens dos pais dele . O casamento com Daniel fez com que Jupira mudasse do lugar onde morava, afastando-se

então dos seus parentes que ainda moram no mesmo lugar. Apesar de morar distante, ela também tinha um terreno pequeno que seu irmão Onofre o usava tendo por lá estábulos para abrigar as vacas. Parte deste arrendamento rende a Jupira um pouco de dinheiro que seu irmão lhe envia mensalmente.No sítio, cultivava algumas hortaliças e ervas medicinais que eram compradas por um comerciante da região.

Todo dinheiro ganho por ela era usado de forma regrada para que nada faltasse ( o que muitas vezes acontecia de faltar) para a educação dos meninos ao qual ela fazia muita questão disto. Em relação a comida.o sítio lhe dava um sustento moderado, sem a usura ou o medo de faltar. Haviam muitas galinhas, quatro porcos, a horta farta de verduras e legumes e uma pequena, porém, generosa plantação de milho que já estava prestes a serem colhidos. Jupira tinha um grande pilão em madeira onde triturava o milho para fazer o fubá. Ela gostava deste dia, o de triturar o milho, porque este fazia com que ela lembrasse de seus tempos de criança onde junto com seus irmãos e irmãs num total de treze, se reuniam em volta do pilão da mãe somente para ouvir a música que ela cantava. Para eles,crianças, era divertido, pois cada um por pura brincadeira pedia para socar o milho e que nunca conseguiam por ser este um pouco pesado pra o porte de todos naquela época. Numa mistura de canto sorrisos e umas pequenas lágrimas no rosto, Jupira batia o pilão alternando as mãos no socador num sobe e desce sincronizado cantando assim:

" Tem pilão

Tem pilão pra trabaiá

Di manhãnzinha

Adispois di acordá.

Se no pilão,

No pilão eu não batê

Nem di noitinha

Eu vô tê o que cumê"

Este canto era ininterrupto até quando todo milho estava no ponto de virar o fubá. Esta cantoria levava umas duas horas, tempo suficiente para Jupira ter a quantidade necessária de fubá em casa guardando o restante do milho para plantio e alimento das galinhas e dos porcos por algum tempo.Após o pilão, Jupira ia cuidar dos outros afazeres do sítio, e lavar um pouco da roupa que também era uma fonte de renda para ela.

continua....

Geraldo Lys
Enviado por Geraldo Lys em 29/06/2011
Reeditado em 01/06/2019
Código do texto: T3063929
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